Depredações e roubos prejudicam bibliotecas

Usuários desrespeitam patrimônio público e desorganização impede controle eficiente

Livros raros roubados, folhas rasgadas, obras que somem do acervo e páginas rasuradas. As bibliotecas da USP, referências nacionais em suas áreas, sofrem constante ação predatória que, combinada com uma manutenção deficiente, causa prejuízos ao patrimônio público.

O problema é que as direções das bibliotecas desconhecem o que acontece em seus prédios. Nem todas fazem regularmente inventários, um balanço detalhado que busca conferir a condição das obras. Na biblioteca da FFLCH, uma das maiores da USP, esse procedimento nunca foi realizado. A diretora, Sônia Luchetti, alega que não há como fazê-lo sem comprometer o atendimento ao público.

Nos lugares onde não há inventário, as constatações de perdas surgem apenas quando pesquisadores e estudantes requisitam as obras para estudo. Foi o que aconteceu na ECA. As revistas A Cigarra, O Pirralho e Graphis sumiram do acervo raro. O ladrão deixou apenas as capas, levando o interior dos periódicos. Segundo a diretora da biblioteca, Olga Mendonça, todo ano é realizada a leitura das lombadas dos livros, procedimento que não detecta esse tipo de perda. Embora percebido neste ano, o furto pode ter ocorrido antes, pois não existe um inventário atual dos periódicos.

A situação não muda em outras unidades. No IME, que tinha o acesso restrito até 2005, cerca de 8% da biblioteca é extraviado todo ano. A bibliotecária Elizabeth dos Santos considera, porém, o número pequeno. Há uma constatação de que a abertura não aumentou as perdas. Algumas obras, no entanto, como os periódicos, ainda têm o acesso restrito.

Os serviços de empréstimos e devolução também não dão conta do grande movimento. Enquanto na UnB, o aluno não se forma se tiver pendências nas bibliotecas, na USP isso não acontece.

Além disso, as unidades não conseguem cobrar dos usuários a conservação dos livros emprestados. Segundo Ângelo Correa, diretor da biblioteca do IQ, “quando o usuário devolve o livro, o funcionário não folheia. Mesmo quando vemos algo danificado na devolução não dá para afirmar que foi ele que fez”. Há, também livros que são escondidos. Os alunos recorrem a essa prática para garantir o acesso às obras com poucos exemplares.

Sem projeto de conservação, acervo da Química é ameaçado por fungos
Sem projeto de conservação, acervo da Química é ameaçado por fungos (foto: Marcos Guerra)
Vigiar e Punir

A instalação de câmeras tampouco inibe o crime. No dia em que a reportagem do JC visitou a biblioteca da FEA, ocorreu o furto do laptop de um estudante. As câmeras mostravam as feições do ladrão, que praticou o seu segundo furto na unidade em menos de um mês. Nem por isso ele foi pego ou o roubo impedido.

A diretora da biblioteca da FAU, Dina Uliana, acredita que a ocorrência de furtos independe do aparato de segurança instalado. Ela diz ainda que os livros de ciências humanas são mais atrativos para vendas. Dulcinéia Jacomini, da FEA, acha que os roubos de livros são feitos por encomenda, por quem conhece o seu valor.

Público x Privado

Para a especialista em relações públicas da ECA, Mariângela Haswani, o brasileiro não tem noção do que é público. Ela explica que, para muitos, o patrimônio público não tem dono, por isso cada um usa da maneira que lhe convém.

Os diretores das bibliotecas visitadas dizem que só a conscientização pode reverter o mau uso do acervo pelos usuários. Mariângela concorda que a mudança dessa percepção se dá através da educação, mas não desconsidera a punição como uma forma de ensino.