O longo caminho de um curta

Espaço de experimentação. É assim que a produção de um curta-metragem é vista, sobretudo na universidade. Nesse formato cabem vários tipos de roteiros e linguagens, não há preferência por ficção ou não-ficção. Segundo Esther Hamburger, chefe do CTR (Departamento de Cinema, Rádio e Televisão), da ECA-USP, a liberdade para criação é o que atrai muitos cineastas, já consagrados em longas-metragens, de volta à produção de curtas. “O curta não serve só para iniciar a carreira”, afirmou Esther.

Desde os anos 70, esse formato tem uma produção constante no Brasil e a universidade é um dos espaços de desenvolvimento mais férteis. Somente no CTR, são filmados cerca de 60 curtas por ano – isso sem contar o trabalho dos professores. Os baixos custos e as possibilidades de experimentação que um curta permite são os principais motivos para essa extensa produção universitária.

Na graduação de Audiovisual da USP, os curtas são desenvolvidos nas disciplinas laboratório. A dinâmica do curso compreende um rodízio entre os alunos: cada um exerce todas as funções na produção (direção, fotografia, etc.) para, somente no 4º semestre, decidirem qual delas lhe agrada mais. Segundo o professor do CTR, Almir Almas, como o número de vagas por especialidade é restrito, há uma seleção interna que tende a melhorar a qualidade desses filmes.

As produções mais sofisticadas são os TCCs (Trabalho de Conclusão de Curso), porque contam com uma estrutura melhor. “Há uma diferença abissal quando comparamos os curtas de exercícios curriculares com os TCCs. Parece que tudo fica um pouco mais profissional”, afirma Fernando Garrido, aluno da turma de 2005 do curso de Audiovisual.

Não é à toa que esses trabalhos participam dos festivais mais importantes do Brasil e do mundo, como o de Cannes, na França, e o de Berlim, na Alemanha. A visibilidade obtida por meio dessas premiações e concursos é importante para viabilizar, financeiramente, projetos futuros. De acordo com o professor do CTR, Eduardo Mendes, a captação de recursos entre as empresas privadas nem sempre é fácil, porque estas querem associar suas marcas ao marketing cultural, e o curta, por ter uma distribuição restrita, não atrai tantos investimentos.

Produzindo um curta

O processo de produção dos curtas-metragens é longo e agrega especialistas de diversas áreas. O primeiro passo é ter a idéia e definir em que formato ela será desenvolvida. Depois de concebido o roteiro, é preciso reunir os profissionais que o transformarão nos vários elementos cinematográficos: imagem, luz, som, cenário. A equipe inteira trabalha em torno do conceito do diretor, que atua, nesse momento, como um coordenador de todas as funções.

Uma vez finalizado o filme, é preciso superar uma dificuldade que atinge a produção de curtas de uma maneira geral: a distribuição. Não há muitos espaços para exibição desse formato no Brasil, além dos festivais. Até o final da década de 90, vigorava a Lei dos Curtas, uma legislação de 1975, segundo a qual era obrigatória a exibição de um curta-metragem nacional antes de qualquer sessão de um filme estrangeiro. Sem a obrigação, o espaço para esse formato diminuiu. “Onde dá pra ver curta? Sem divulgação e sem público, o seu filme vai, no máximo, para um DVD para você mostrar aos amigos”, afirmou o aluno Fernando.

Os filmes produzidos no CTR estarão pela primeira vez nos cinemas durante a abertura da IX Semana de Audiovisual, que ocorrerá em outubro. Essa é uma iniciativa que busca dar mais visibilidade à produção de curtas-metragens. Outra solução para contornar o problema seria a transmissão de curtas pelas emissoras de televisão, como já acontece na Europa. “Estamos procurando trabalhar no sentido de achar formas de exibição mais sistemáticas, porque esta é uma parte importante da realização de um filme”, afirmou Esther Hamburger.