Debate: bônus do Inclusp no vestibular democratiza ensino superior?

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SIM – Inclusão social passa pela escola pública – por Maria Isabel de Almeida
NÃO – Mudanças não alteram panorama do ensino – por Eunice R. Durham


SIM – Inclusão social passa pela escola pública

por Maria Isabel de Almeida

A partir do reconhecimento de que a universidade brasileira deve não só contribuir para melhorar a capacidade tecnológica e econômica de nosso país, mas também, e acima de tudo, para melhorar a qualidade de vida de todos os cidadãos, a USP aprovou em 2006 o Programa de Inclusão Social (Inclusp), destinado a democratizar o ingresso dos menos favorecidos da sociedade na universidade, sem comprometer o critério de mérito como legitimador desse acesso. Considerando que a maioria dos jovens pertencentes a esses segmentos realiza a formação básica na escola pública, o Inclusp tem como objetivo central ampliar as possibilidades de ingresso e promover o apoio à permanência, na USP, desses estudantes.

Essa opção parte do reconhecimento de que na escola pública estão presentes hoje todos os agrupamentos sociais menos favorecidos da sociedade brasileira. O Inclusp se sustenta, centralmente, na ideia da pontuação acrescida, que assegura a todos os candidatos inscritos, que cursaram integralmente o ensino médio em escola pública no país, um bônus de 3% na nota da Fuvest. Para o vestibular de 2009, foram incluídos outros dois bônus: um, de até 6%, decorrente do desempenho no Enem, e outro de até 3%, obtido pelo desempenho na prova Pasusp. Com isso, o bônus pode chegar a 12%.

Dessa maneira, o Inclusp tem assegurado a ampliação do número de estudantes ingressantes oriundos de setores sociais menos favorecidos. Em 2009, 30% dos ingressantes foram alunos de escolas públicas, fato inédito nas últimas décadas. Esse crescimento tem também aumentado o número de estudantes oriundos de famílias com renda de até três salários mínimos e de estudantes negros, características que alimentam bandeiras de segmentos organizados da população, que reivindicam políticas eficientes de apoio.

Outro aspecto significativo é que o rendimento acadêmico dos estudantes beneficiados pelo Inclusp é semelhante ao obtido pelos demais estudantes, chegando a ser superior em vários cursos, inclusive em alguns dos mais competitivos da USP.

Evidentemente, essas mudanças não se efetivam sem resistências e cobram alteração na cultura institucional da universidade, bem como o reconhecimento de que a capacidade de aprender não se vincula à origem social dos sujeitos. O que importa é que o Inclusp possibilita uma mudança no perfil dos profissionais formados pela USP, o que pode contribuir, de forma positiva, para a construção de uma sociedade mais igualitária.

Maria Isabel de Almeida é professora da Faculdade de Educação (FE) da USP e assessora da Pró-Reitoria de Graduação.

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NÃO – Mudanças não alteram panorama do ensino

por Eunice R. Durham

Endosso o conjunto das críticas que vem sendo feitas às modificações no vestibular com o intuito de democratizar o acesso à USP.

As críticas são diversas e procedentes. Mas a principal delas é a de que as mudanças são paliativas e não resolvem os verdadeiros problemas de exclusão que são o elevado índice de pobreza da população e a má qualidade do ensino básico público. Quando se verifica o impacto que estas medidas podem ter em termos de democratização do acesso ao ensino superior, verifica-se que se trata de medidas puramente simbólicas destinadas a aplacar a má consciência da universalidade face às acusações de elitismo.

Vejamos os números da exclusão:

Em São Paulo, a taxa bruta de matriculados (nº de matriculados no ensino superior em relação ao número de jovens na faixa etária de 18 a 24 anos) no ensino superior público e privado está perto de 25%. Isto significa que 75% dos jovens estão excluídos.

Dos matriculados, apenas cerca de 18% cursam instituições públicas. Desta forma, quase 82% dos alunos que frequentam o ensino superior estão excluídos do ensino público. Dos matriculados, a USP abriga perto de 4,5%.

Se calcularmos o que isto representa em relação ao total de jovens que concluiu o ensino médio (público e privado) no ano anterior, chegamos a 2,22%. Destes, o percentual de alunos provenientes da escola pública variou, entre 2005 e 2008, na seguinte proporção: 25,53% (2005), 23,62% (2006), 26% (2007) e 25,25% (2008).

Se fizermos agora um outro cálculo e verificarmos o que isto representou, em 2008, em relação ao total de egressos do ensino médio público no ano anterior, chegamos a irrisórios 0,66%.

Dado o reduzido percentual de matrículas na USP em relação ao total de egressos do ensino médio, por maior que seja o esforço de inclusão, não se vai conseguir modificar o panorama geral de exclusão do ensino superior.

Acredito que a política afirmativa mais adequada seria a oferta de cursos pré-vestibulares presenciais, com tecnologia do ensino à distância, monitorados pelos nossos alunos dos cursos da Licenciatura, como parte dos estágios obrigatórios. A USP poderia criar um material inovador, que permitisse aos alunos de menor desempenho superarem as deficiências de sua formação anterior, material este, o qual, inclusive, poderia ser utilizado na rede de ensino médio público, contribuindo para sua melhoria.

Para uma análise mais detalhada, consultar: www.usp.br/nupps/unidebate

Eunice R. Durham é professora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e membro do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas da Universidade (Nupps).

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