Ocupação ou invasão?

“Sem diálogo, Coseas continua ocupada” foi a manchete da edição passada. Ocupada? Ou invadida?

É uma escolha difícil: as duas opções têm carga de valor, e o JC é um veículo que pretende ser imparcial. O fato é que alunos entraram no prédio da Coseas (Coordenadoria de Assistência Social) e ali se instalaram sem autorização. Concretamente, é invasão: espera-se que as pessoas obedeçam às regras instituídas – a não ser em momentos críticos, quando se justifica a desobediência civil.

Escrever ocupação é tomar partido dos alunos, mesmo que não seja a intenção dos editores – que, consultados por mim, esclareceram: “O termo ocupação foi adotado porque o grupo assim se intitulou e a própria reitoria adotou o termo em notas oficiais”. Ser fiel à fala do entrevistado é perfeito quando reproduzimos uma declaração literal. Mas a manchete é o que o jornal diz: cabe ao editor escolher que palavra usar.

A encrenca é que usar a palavra exata – invasão – dará a idéia de que o jornal é contrário aos alunos. Como equilibrar? Com reportagem. Investigando e mostrando claramente quais os problemas de moradia da USP, de quem é a responsabilidade, e dando a dimensão exata do movimento de protesto. Quantos alunos moram no Crusp? Os 29 que participaram da assembléia representam quantos % do total? Quantos estudantes estão na fila por vagas? O que havia sido prometido? Por que não foi cumprido? De quem é a culpa? Que autonomia tem a Coseas para atender às reivindicações dos alunos? O que há no orçamento deste ano para resolver problemas de moradia?

São apenas algumas das perguntas que o JC ainda pode responder nas próximas edições. Com a vantagem de escapar do jornalismo declaratório e abraçar de vez o informativo: aquele em que o repórter vai, vê, comprova e relata fatos concretos e não apenas versões.

Ana Estela de Sousa Pinto, 45, é formada em agronomia e jornalismo pela USP. Trabalha na Folha de S.Paulo, onde é responsável por seleção e treinamento.