Proposta responde à realidade

A proposta e a discussão em torno da “Lei da Palmada” estão ligadas a um novo contexto no que diz respeito às relações entre pais e filhos. Ainda que muitos pais não concordem com a punição juridicamente institucionalizada para o uso da força física, a maioria procura evitar o uso deste recurso. Como relata Eloisa Correa Souza, pediatra do Hospital Universitário da USP, já há uma cultura, especialmente dos pais mais jovens, de não bater nos filhos. Para ela, a mudança de postura é anterior à criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), sendo um movimento da sociedade desde a década de 80.

Para a psicóloga Adriana Marcondes, professora do Instituto de Psicologia da USP, a principal contribuição do ECA foi fazer com que a criança deixasse de pertencer apenas ao mundo privado e passasse a ser vista como um sujeito de direito, chamando atenção para causas que lhe dizem respeito. No contexto social, essa mudança foi acompanhada de um enfraquecimento da autoridade do mundo adulto, resultado tanto da quantidade de informações que as crianças e jovens têm sobre seus problemas quanto das crescentes críticas a medidas punitivas tomadas por pais e educadores.

Já a “Lei da Palmada”, segundo Marcia Oliveira, da rede “Não Bata, Eduque”, tem como principal inovação o fato de que, nela, “os castigos corporais e o tratamento cruel e degradante estão tipificados”. O projeto prevê que pais e educadores com dificuldade em utilizar práticas educativas não violentas sejam, conforme o caso, encaminhados a tratamento especializado. O objetivo é garantir a integridade física da criança, além da convivência familiar e comunitária.

Tanto a pediatra quanto a psicóloga se colocam contra os castigos físicos, mas concordam podem ser necessários em situações de risco iminente para a criança, nas quais não há tempo suficiente para diálogo.

Eloisa conta que é comum os pais ficarem em dúvida sobre o uso da força na educação dos filhos e conversarem sobre o assunto durante as consultas médicas. Nestes casos, ela os orienta a não fazer uso do castigo físico nas crianças e a se afastar por alguns minutos em momentos de raiva, para evitar atitudes impulsivas.

Este tempo para acalmar os nervos pode fazer uma grande diferença. Adriana relata que os casos que acompanhou de pais que bateram em seus filhos geralmente eram associados a incertezas, arrependimentos e perda de controle emocional.