Revistas estudantis recriam cotidiano da USP

Exposição na Casa da Dona Yayá reúne 88 títulos que contam a história de 152 anos de produção editorial feita por alunos

Exposição que resgata a história das revistas feitas por estudante da USP está aberta para visitação desde 7 de março, no Centro de Preservação Cultural da USP (CPC), conhecido como Casa da Dona Yayá.

Com 88 títulos, a mostra dá conta de 152 anos de produção impressa e periódica estudantil. A pioneira foi a Revista Dramática, que surgiu em 1860, na Faculdade de Direito (FD). Com 22 números publicados, a revista falava sobre dramaturgia, criação literária e os desafios do exercício jornalístico. Até 1903, todas as 7 publicações estudantis eram da FD. Só em 1904 a Escola Politécnica (Poli) lança a Revista Politécnica, de caráter científico.Vale lembrar que a FD, criada em 1827, e a Poli, de 1893, são anteriores ao surgimento da USP, que só ocorreria em 1934.

O mapeamento das publicações estudantis foi um processo que durou cerca de dois anos e envolveu bibliotecas, grêmios estudantis e coleções particulares. “O CPC, como órgão de patrimônio cultural da USP, tem um trabalho sistemático de mapeamento de acervos, sejam eles de valor histórico, estético, cultural ou científico. E mais recentemente alguns desses acervos passaram a ser enxergados do ponto de vista de sua vinculação à vida e à experiência cultural da Universidade”, conta José Tavares Correia de Lira, coordenador da exposição e diretor do CPC.

Tal aspecto das revistas estudantis é o ressaltado na exposição. “Esses periódicos falavam muito não só de suas áreas disciplinares, mas tratavam de um cotidiano estudantil, que é próprio das vivências da Universidade”, afirma Lira.

Falta de diálogo

Em diversos editoriais das revistas é mencionada a necessidade de diálogo. “As publicações mostram a necessidade dos estudantes se comunicarem entre si e com a sociedade”, diz Lira. Para ele, a produção de periódicos tem relação direta com o contexto atual de movimentação política dentro da USP. “As revistas são uma forma de mobilização política, reivindicação de espaço público”.

A necessidade de espaços para debate vai de encontro com o principal obstáculo enfrentado pelas revistas estudantis, a perpetuação. Das 88 revistas presentes da exposição, apenas 29 tiveram mais de 10 edições publicadas.

Por outro lado, a efemeridade pode ser vista como característica própria das revistas. “É um problema estrutural, porém não me parece um prejuízo”, explica Lira. “É parte das circunstâncias, mas enquanto existe, a publicação deixa registros de toda uma geração daquele período”. Ele ressalta que existem exceções, como revistas com mais de 100 anos. “Algumas sobrevivem quando encontram estratégias de sucessão”, completa.

Estímulo à produção editorial

A mostra foi concebida para ser itinerante. Ela fica no CPC até o dia 27 de abril e a ideia é que depois passe a circular pelas unidades da USP, tanto da capital quanto do interior. Além de divulgar o material, a intenção dos organizadores é estimular a produção editorial entre os estudantes.

“A exposição alerta as gerações atuais sobre o poder desse tipo de mobilização. Talvez ela estimule a articulação dos estudantes em forma de novas publicações, porque a sensação que eu tenho é que hoje em dia há poucas revistas circulando”, conclui Lira.

Quase centenária

Entre as publicações que conseguiram criar um método de sucessão e recursos para garantir sua perpetuação, está a Revista de Medicina. Publicada desde 1916, seus 96 anos de existência fizeram dela a revista científica acadêmica ainda em circulação mais antiga do mundo.

A Revista surgiu da necessidade de publicação dos artigos de alunos da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), mas adquiriu ao longo dos anos caráter didático. Ou seja, junto com os artigos originais de estudantes da área da saúde (geralmente provenientes de Iniciação Científica), a Revista publica artigos de revisão escritos por docentes, que tem como objetivo ensinar sobre um determinado tema.

Atualmente o periódico é trimestral, mas este é um ano de transição. Elaine de Moura, editora-chefe da Revista e estudante do terceiro ano da FMUSP, conta que dentro de 1 ou 2 anos a publicação deve passar a ser somente digital. O principal fator que impulsionou essa medida é a questão financeira. “Houve anos em que a gente chegou a não imprimir por falta de patrocinador”, conta ela. Mas a medida tem suas vantagens. “Além da redução dos gastos, a revista vai ficar mais fácil de ser distribuída”, completa.

Os 14 alunos que produzem a Revista este ano são integrantes do Departamento Científico (DC) da FMUSP, entidade que foi criada em 1931 para ser responsável pela publicação do periódico. Hoje em dia, além de produzir o periódico, o DC organiza cursos de extensão e eventos. O processo de sucessão da equipe responsável pela Revista é anual e ocorre juntamente com o processo de todo o DC. “A gente avalia no final do ano quem tem interesse e faz uma votação interna do DC”, explica Elaine.

Mesmo sendo uma publicação científica, as páginas da Revista de Medicina não deixaram de refletir ao longo dos anos a movimentação política e expressão cultural destacada na Exposição do CPC. “Para a edição do centenário da FMUSP a gente vai fazer uma linha do tempo, desde a primeira revista até a ultima, contendo acontecimentos históricos e como isso se reflete na revista. Há edições falam sobre o governo de Getúlio Vargas, comentam algumas mudanças, por exemplo”, conta a editora-chefe. “Nos números recentes isso não acontece tanto, mas no começo a Revista era mais política”, completa.

Produção de revistas estudantis por unidade da USP (infográfico: Paula Zogbi Possari)

Serviço

Exposição Revistas Estudantis na USP
De segunda a sexta-feira, das 9h às 17h
Até 27/4. Grátis
Local: CPC-USP / Casa de Dona Yayá
Rua Major Diogo, 353, Bela Vista, São Paulo, SP
Telefone: (11) 3106-3562