Como garantir a segurança na USP?

As novas medidas anunciadas pelo Superintendente de Segurança, Luiz de Castro Júnior, revelam que parte do plano criado pela Universidade deve restringir o acesso da comunidade externa à Cidade Universitária. Apesar da divulgação da proposta, ainda não há prazos para sua implantação.
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As catracas não vão resolver nosso problema de insegurança – entrevista com Carlos Augusto Mattei Faggin
O controle é necessário em momentos de crise de segurança – entrevista com Leandro Piquet Carneiro


As catracas não vão resolver nosso problema de insegurança

Carlos Augusto Mattei Faggin é livre-docente da Faculdade de Arquitetura e  Urbanismo da USP e membro da Comissão de Segurança da FAU.

Jornal do Campus: Como é a situação atual da USP em relação à segurança e quais são suas principais deficiências?
Carlos Faggin: A impressão que se tem é que existe um paradoxo ao se tratar do campus. Uma hora é parte da cidade, outra é área apartada de São Paulo. Fui aluno da FAU e comecei a graduação na Rua Maranhão e depois mudei para a Cidade Universitária. A gente chamava o campus de quartel, para se ter uma ideia de como pesava ficar isolado da vida urbana. Isso era muito negativo. Por outro lado, manteve a USP isolada das
mazelas da capital. Com o tempo isso foi mudando. Hoje temos uma favela do lado, e não sabemos como tratar a São Remo. A USP não tem condições de dar segurança para essa área imensa. Dou aula à noite, no curso de Design até 22h45. Vejo meus alunos morrendo de medo. Tem que ficar esperando ônibus numa rua mal iluminada, sem segurança. É uma loucura como estamos expostos. Mas você vai dizer que a cidade inteira é violenta. Só que dentro da USP não temos o mínimo de segurança que a cidade tem. São Paulo é mais bem iluminada do que a própria Cidade Universitária.

JC: As novas medidas apontadas pela Superintendência de Segurança incluem guaritas elevadas e cancelas duplas para pedestres à noite. Você classificaria essas iniciativas como as mais adequadas?
CF: Isso é uma consequência dessa separação em relação à cidade. Imagine guaritas elevadas pela Universidade. Você tem isso na sua casa ou espalhado por aí? Não tem isso. O que eu gostaria como cidadão, é cruzar com guardas civis com mais freqüência e eles que me darão a sensação de segurança. Cerca eletrificada não vai resolver o problema.

JC: Segundo o novo plano, pedestres terão de passar por duas barreiras. A segunda só seria liberada após o registro de um crachá eletrônico. Essas medidas não limitariam o acesso ao campus?
CF: As catracas não vão resolver o problema. Isso vai criar uma porção de constrangimentos. As pessoas não poderão entrar, por exemplo, na FEA, porque não terão o cartão. Aquilo é público, qualquer pessoa pode assistir a uma aula. Isso está na lei. Ou seja, se ele não tiver o cartão, não será mais público. Vamos criar uma nova casta social: os interessados que não podem frequentar porque não têm o cartão. Isso aprofunda a insegurança. É a convivência social que proporciona a segurança, como conversar com seus vizinhos. A FAU é um prédio singular, pois não tem portas. A característica do prédio é ser fluido, ser visitado por qualquer um. Quanto mais aberta ela for, tanto melhor.

JC: Qual solução você sugeriria para melhorar a segurança na USP?
CF: Dar às pessoas que usam a sensação de segurança. Uma das coisas que estamos fazendo é apresentar o pessoal de manutenção e da segurança para a comunidade da FAU. Para os alunos conhecerem os profissionais pelo nome, saber o que estão fazendo. Não se trata mais de crachá. É questão de o cara saber quem sou eu, me reconhecer. O problema é que os investimentos são feitos na direção material, com colocar essas geringonças visíveis. Você se sente, inclusive, ameaçado. Não adianta encher de carro de polícia. Essas medidas se tornam até um risco. Por exemplo, [o cartão] é uma credencial. Se você achar na rua ou roubar de alguém, você se tornará membro dessa comunidade. Pode fabricar cartões falsificados. Não existe o princípio de conhecer as pessoas. O princípio é eletrônico.

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O controle é necessário em momentos de crise de segurança

Leandro Piquet Carneiro é professor do Departamento de Ciência Política da USP e pesquisador do Núcleo de Pesquisas em Políticas Públicas (NUPPs) da Universidade.

Jornal do Campus: Como é a situação atual da USP em relação à segurança e quais são suas principais deficiências?
Leandro Piquet: Acho que o principal problema da USP era que faltava um plano integrado de segurança. Ela tinha problemas de tráfico de drogas, furtos, casos de arrombamento de carro. Quando vim trabalhar aqui, tinha tentativas de entrar no departamento pela janela, crimes violentos, à mão armada. Durante a última década, isso foi uma característica: o campus inseguro. Agora há a reação da reitoria a esse problema, depois do assassinato do aluno da FEA.

JC: As novas medidas apontadas pela Superintendência de Segurança incluem guaritas elevadas e cancelas duplas para pedestres à noite. Você classificaria essas iniciativas como as mais adequadas?
LP: Em um campus urbano, é natural e desejável que ele tenha essa característica restrita. Isso acontece em todos os lugares. Pode até existir um acesso aberto para pessoas comuns, mas o controle é necessário em momentos de crise de segurança como essa que estamos tentando sair. Acho bom que as medidas sinalizem para um controle maior do campus, de quem está entrando nele.

JC: Segundo o novo plano, pedestres terão de passar por duas barreiras. A segunda só seria liberada após o registro de um crachá eletrônico. Essas medidas não limitariam o acesso ao campus?
LP: Acho que existem dois lados complicados: é verdade que seria bom mais pessoas andando na USP para circular por ali e usufruir do que ela oferece. A Universidade deveria achar uma solução para o uso recreativo do campus. Poderia ser um cadastro no site pra as pessoas poderem entrar e usar. É uma questão de ajustar meios e critérios para garantir o uso e o acesso ao campus com objetivos como o esporte e o lazer.

JC: Qual solução você sugeriria para melhorar a segurança na USP?
LP: O plano apresentado pela reitoria está no caminho certo: é preciso uma presença da PM, uma integração entre ela e a Guarda Universitária, um maior patrulhamento feito nas áreas comuns da USP. Qualquer campus em cidades grandes como São Paulo tem problemas de segurança e toma medidas parecidas. Nada disso tem relação com a autonomia universitária. Isso é exercido dentro do espaço acadêmico. Não tem a ver com
o estacionamento. Quanto antes for resolvido o problema, melhor será para a atividade acadêmica.

JC: Você participou do treinamento dos policiais que vieram atuar no campus. Como foi?
LP: O curso foi compacto, conduzido pelo Núcleo de Estudos da Violência (NEV) e o NUPPS. A dinâmica era explicar qual o contexto da Universidade. Um dos problemas apontados foi o uso inadequado do espaço da USP, como pelas festas. Elas geram uma quantidade enorme de pessoas de fora, alto consumo de álcool e relatos de drogas. O problema é que não há regras para isso na USP. Precisamos oferecer aos policiais e
guardas parâmetros para patrulhar. A pior coisa é enviar um contingente  para patrulhr sem uma missão definida. Pode ou não pode festas? O que fazer na frente do consumo aberto de drogas? Não podemos deixar na mão do policial a decisão. É preciso definir os procedimentos. Falta um plano de convivência, de quais são as regras aceitáveis.

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