PNE avança no Congresso com metas alteradas

Projeto de Lei caminha para votação no Senado com mudanças no texto original; principal debate é o percentual do PIB a ser investido no setor

O novo Plano Nacional de Educação (PNE) foi aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado nesta terça feira (28/05) e segue agora para as comissões de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJ) e de Educação, Cultura e Esporte (CE), de onde seguirá para votação no Plenário. Apoiado no texto do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) de 2007, o PNE traz em suas diretrizes e metas as determinações que irão orientar a educação no Brasil até 2020.

 

Mesmo que o texto final do PNE ainda seja aprovado neste semestre, ele entrará em vigor com dois anos de atraso. Em 2008 – dois anos antes do fim da vigência do antigo Plano – a Conferência Nacional de Educação Básica (Coneb) encaminhou um pedido para o Congresso elaborar uma nova lei ainda naquele ano, o que não aconteceu. O Ministério da Educação (MEC) enviou a proposta do novo PNE em 15 de dezembro 2010, faltando apenas 15 dias para o fim da vigência do Plano antigo. O atraso de sua aprovação se explica pelos debates sobre as diretrizes e metas, além das emendas ao projeto – quase três mil, de acordo com o Senado.

 

Projeto de Lei

No Projeto de Lei enviado ao Congresso pelo MEC estão as diretrizes e metas do novo PNE (ver infográfico acima), além das estratégias para alcançar essas metas. O PL determina que, assim que aprovado, os Estados e Municípios deverão elaborar, ou adaptar, seus próprios planos de metas de acordo com o PNE, no prazo máximo de 1 ano. A princípio, todas as metas deverão ser cumpridas até 2020, mas algumas poderão ser estendidas até 2024 por conta da demora na aprovação da lei.

 

Para o professor Ocimar Alavarse, da Faculdade de Educação (FE-USP), um dos pontos fortes do PNE é a estruturação de um sistema nacional de educação. De acordo com ele, equalizar a oferta de ensino do país é um dos principais objetivos. “Hoje, dependendo de onde uma criança nasce, ela tem mais ou menos chances de ter acesso a um ensino melhor”, aponta o professor, evidenciando a disparidade social que se reflete também na educação. “Equalizar significa dizer que nenhum fator irá diferenciar o atendimento. Não importa onde uma criança esteja estudando, ela deve ter a mesma educação”, conclui. Além disso, o professor acredita que a criação desse sistema reduz desigualdades de orçamentos municipais, já que muitas cidades não tem condições financeiras de atender à sua demanda educacional. Existem ainda casos onde há um problema operacional: a falta de capacitação técnica para direcionar todos  os gastos.

 

Já Eunice Ribeiro Durham, professora emérita da FFLCH e pesquisadora do Núcleo de Pesquisa em Políticas Públicas da USP (NUPPS), acredita que o PNE “substitui a necessidade de um diagnóstico dos problemas reais do nosso sistema educacional e da formulação de políticas públicas que solucionem os problemas, por um aglomerado de nobres ideais e boas intenções”. A professora ainda afirma que o Plano estabelece algumas metas indispenssáveis, mas também outras irrealizáveis, baseadas em uma “ambição execessiva”.

Meta 20

Derivadas das diretrizes, as metas do Plano Nacional de Educação têm como objetivos gerais a universalização da educação, a melhoria na qualidade de ensino, da carreira dos professores e da infra-estrutura, e a determinação de um percentual fixo do Produto Interno Bruto (PIB) nacional para investimento na educação – a meta número 20.

 

Para Alavarse, o estabelecimento de um percentual fixo não é o melhor caminho para o desenvolvimento da educação. “Definir uma taxa fixa de 10% parece uma conduta simpática, mas pode se tornar uma armadilha. Isso só é favorável quando o PIB apresenta crescimento ou estabilidade. E se cair?”, ressalta o professor. Segundo ele, o direcionamento de verbas deve ser com base no orçamento da União. “Temos que elaborar quais são as necessidades e levantar os custos para atender as reivindicações dos vários segmentos da educação, desde a básica até a superior”. Ele não enxerga as alterações no PNE como manobras do governo para atingir essa meta. “Não é uma manobra, eu vejo como dificuldade em gastar quando se tem um orçamento finito. Mesmo que se aumente a verba essa dificuldade continuará”, aponta.

Diversas pesquisas indicam a necessidade de elevar esse percentual para 10%, tornando possível atender às metas de expansão e melhora da qualidade educacional de todos os níveis e modalidades da educação brasileira. Nelson Cardoso Amaral, professor da Universidade Federal de Goiás,  acredita que o volume de recursos financeiros equivalente a 10% do PIB é “um valor elevado para o contexto nacional de muitas carências sociais e enormes desigualdades regionais”. Entretanto, o Brasil encontra-se “em uma encruzilhada histórica que precisa ser considerada nessa decisão”.

 

O professor ainda chama a atenção para a alteração feita no Senado Federal na proposta aprovada na Câmara dos Deputados, permitindo que sejam computados nos 10% os recursos públicos que se dirigem às escolas ou instituições privadas – “um absurdo”, disse.

Alavarse tem opinião semelhante a de Amaral. “O que mais me preocupa é que o investimento seja feito baseado na gratuidade do ensino, e não na educação pública, diz. “Quando se fala da gratuidade, abre-se a possibilidade da iniciativa privada receber o dinheiro público, ainda que usuário não pague por isso”, completa o professor, referindo-se principalmente ao Programa Universidade para Todos (Prouni), criado pelo governo federal para conceder bolsas parciais e integrais para estudantes de ensino superior. Além do Prouni, outros programas vinculados a instituições privadas podem ser beneficiados com a alteração da redação do PNE, como o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), o Financiamento Estudantil (FIES) e o programa federal Ciências sem Fronteiras.

 

Entretanto Durham é cética em relação a aplicação de uma porcentagem do PIB na educação. “Se efetivamente implantado o Plano Nacional de Educação, teremos em dez anos o melhor e mais caro sistema educacional do mundo. É preciso ser muito inocente para acreditar que isto seja possível”, disse.

 

Outras alterações importantes aconteceram nas metas 4, 5, 11 e 12, que tratam, respectivamente, da inclusão de alunos com deficiência, da alfabetização infantil e da expansão do ensino técnico e superior. De acordo com o novo texto da meta 4, não é mais garantido aos estudantes com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e superdotados a existência de salas com recursos adaptados às suas necessidades, além de agora precisarem de um atestado médico que afirme suas condições.

 

O novo texto da meta 5 estipula índices de alfabetização infantil baseado na idade das crianças, e não mais em suas séries escolares. Em confluência com a mudança de fixação do PIB, as alterações das metas 11 e 12 retiram a responsabilidade do Estado em garantir a expansão do ensino universitário e técnico, permitindo que  a meta de seja alcançada através de parcerias entre Estado e a iniciativa privada, como o Prouni.

 

Para Durham, estipular uma idade para a alfabetização é prejudicial para o aprendizado. “Toda a psicologia do desenvolvimento indica que há uma grande variação entre as crianças não só quanto a idade em que começam a andar, falar, a controlar a evacuação, mas, também à idade na qual estão preparadas para a escrita e o tempo que levam para dominá-la. Há que respeitar o ritmo das crianças”, disse.