Faltam recursos à Comissão da Verdade

Janice Theodor, coordenadora da Comissão da Verdade da USP, afirma que não há verba nem profissionais suficientes

Criada em 7 de maio de 2013, pelo então reitor João Grandino Rodas, a Comissão da Verdade da USP tem encontrado dificuldades em relação ao desenvolvimento das pesquisas. A comissão surgiu com o objetivo de investigar, por meio de documentos, informações referentes às violações de Direitos Humanos na universidade durante a ditadura, que vigorou no país entre 31 de março de 1964 e 15 de março de 1985.

Sem recursos, desde a antiga gestão, a Comissão optou por estudar documentos da Assessoria Especial de Segurança e Informação (AESI), organismo instaurado na instituição que recolhia informações sobre a comunidade universitária e as enviava ao Serviço Nacional de Informações (SNI), responsável por fiscalizá-las e coordená-las. “A USP foi um bastião na luta contra a ditadura, ela teve uma importância muito grande nesse período, ela não esmoreceu”, avalia a coordenadora da Comissão, professora Janice Theodor da Silva.

Presente também em universidades federais, a AESI era formada na USP por cerca de dez pessoas que não eram funcionárias da universidade e tinha como função vigiar, informar, delatar e impedir, por exemplo, que professores considerados de esquerda fossem contratados pela universidade. Os dados apresentam grandes quantidades de detalhes, muitos carregam características da vida pessoal dos vigiados. Os documentos estão sendo manejados com cuidado pela Comissão, que tenta revelar da maneira mais documentada possível as atividades do período militar.

Até o momento, as pesquisas receberam apenas o apoio do convênio com o Núcleo de Estudos da Violência, com a ajuda de uma pesquisadora paga pelo núcleo. “Precisamos de mais pesquisadores, precisamos da verba necessária para realizar essas pesquisas. Estamos trabalhando solitariamente, embora eu tenha tentado apoio da FAPESP, eu não consegui”, revela Janice.

A Comissão da Verdade da USP deve entregar os relatórios para a Comissão Central de Anistia até o fim desse semestre. De acordo com Janice, o prazo curto também irá prejudicar na investigação do período. Segundo pesquisa da Associação dos Docentes da USP (ADUSP), a universidade possui 47 mortos e desaparecidos entre professores e docentes, o que representa mais de 10 % dos 358 brasileiros registrados no Dossiê Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil, revisto e ampliado em 1995. Há uma quantidade de documentação enorme para ser revista e o tempo hábil para sua revisão é ínfimo.

Passados 50 anos do golpe, ainda há resquícios do regime militar na universidade, segundo o professor da ADUSP, Francisco Miráglia Neto. “O Estatuto que nós temos hoje é essencialmente o que foi imposto pelo regime militar. Sobra na USP uma quantidade de entulho e hábitos autoritários, regimentos antidemocráticos que são continuidade dessa ditadura”.

Na Praça do Relógio, memorial em homenagem às vítimas. Foto: Sofia Calabria