Profissionais, mas também amadores

Por amor ao esporte, estudantes atletas se dividem entre seus clubes e times universitários

Aulas de manhã, treinos de madrugada. Quem participa do esporte universitário sabe que não é nada fácil conciliar a rotina de treinos com os estudos. Mas, para alguns, o esforço vai além, assim como a paixão pelo esporte. Conheça um pouco da rotina daqueles que treinam não só pela faculdade, mas também por clubes profissionais, e ainda levam “uma vida comum” de estudantes universitários.

Foto: Gabriel Carvalho
Foto: Gabriel Carvalho
Da seleção para a ECA

Se alguém ainda tem dúvidas de que o esporte profissional pode andar ao lado da graduação, Giulia Guarieiro é a pessoa certa para provar o contrário. Treinando handebol há nove anos, hoje ela joga pelo Esporte Clube Pinheiros e pela seleção júnior (sub-20), e já acumula os títulos dos campeonatos brasileiro e paulista júnior de 2014, e do panamericano do mesmo ano. Apesar de não conseguir treinar com a faculdade, porque os treinos coincidem com os do clube, Giulia gostaria de disputar campeonatos no esporte universitário. “Acho muito legal, porque [o esporte universitário] integra pessoas que sabem jogar muito bem e pessoas que estão entrando ainda no esporte. Todos têm chances, e acho que a maior contribuição que uma atleta profissional pode dar é ajudar as pessoas que ainda estão começando, incentivar e mostrar que o esporte pode ser muito legal.”

Treinando em média três horas e meia por dia, quatro dias por semana, a aluna de Relações Públicas confessa que não é fácil conciliar a rotina. “Eu preciso de muita organização, e geralmente não deixo que as coisas acumulem, já que se for deixar pra ler os textos [das aulas] de última hora, ou estudar somente um dia antes da prova, não consigo.” Nesse sentido, ela conta que o esporte acaba ajudando na motivação. “Acho que ele [o esporte] me ‘ativa’, de algum modo. Como é algo que gosto muito de fazer, funciona como um escape: sempre que as coisas estão muito pesadas, ou estou de saco cheio de ler e estudar, entrar na quadra me dá um alívio, um novo ânimo.”

Uma graduação para garantir o futuro

Arthur Peão, estudante de Administração da FEA, começou a treinar handebol por volta dos 8 anos na escolinha do Esporte Clube Pinheiros. Hoje, só dos títulos mais recentes já acumula o vice-campenato do Panamericano de Clubes 2015 e da Liga Nacional 2014 e a medalha de ouro do Campeonato Paulista 2014 e da Liga Nacional 2011.

Como a rotina de treinos no clube é mais puxada, Arthur conta que, nos treinos pela FEA, aparece apenas nas vésperas de campeonatos ou jogos importantes. Sobre conciliar os treinos com os estudos, Arthur relata que é complicado, tanto do lado da faculdade, quanto por parte do clube. “Quando converso com os professores, alguns acham que estou inventando desculpa para faltar, mesmo apresentando cartas do clube. O clube também não gosta quando falto aos treinos, e os companheiros cobram bastante, mas entendem quando falo que tenho alguma aula importante ou prova.”

A rotina pesada também influencia na parte financeira e profissional. Apesar de receber um auxílio do clube, Arthur explica que é impossível trabalhar ou estagiar. Mesmo assim, quando perguntado se tivesse de escolher entre a profissão e os treinos, Arthur é objetivo: “Eu daria algum jeito de conseguir conciliar! Tenho planos de continuar treinando profissionalmente, mas o salário vai influenciar muito nessa decisão.”

Além de atleta, treinador

Quando o assunto é esporte profissional, a faculdade que vem à cabeça de qualquer um é a EEFE. É claro que lá não poderiam faltar exemplos de atletas que decidiram também se dedicar aos estudos para garantir o futuro. Vitor Baricelli hoje faz o curso de bacharelado em Esporte, mas o handebol já faz parte de sua vida há um bom tempo. Jogando desde os sete anos, Vitor participou do primeiro campeonato paulista aos 13 anos, e há três treina o esporte na Associação Brasileira “A Hebraica” de São Paulo.

Mesmo depois de ter entrado na universidade, Vitor consegue conciliar os treinos da faculdade e do clube, além dos jogos e os estudos. Fácil, não é. “Tenho que programar antes que horas vou estudar, saber quais jogos tenho no final de semana, pra ver se dá pra estudar entre um e outro ou se tenho que estudar tudo no meio da semana.” Nessa questão, os treinos acabam sendo um aprendizado para a vida. “O esporte me ajuda nessa questão pelo fato de querer sempre melhorar, me superar, e o fato de ter que cumprir horários me força a estudar.”

Além de treinar com o clube e com o time da faculdade, ir aos jogos no fim de semana e, entre tudo isso, estudar, Vitor também consegue tempo para trabalhar como treinador no esporte universitário. Atualmente, ele é auxiliar técnico da FEA, da FAU e também da seleção USP feminina de handebol. Como treinador ele acredita que a experiência de treinar em um clube profissional tem muito a acrescentar ao esporte universitário. “Sempre vou cobrar o melhor dos atletas, trazer os conhecimentos de seleções e do clube para os meus times e buscar uma melhora, além de trazer para os atletas uma outra perspectiva do jogo e novos desafios.”

Os resultados de sua dedicação ao esporte vêm através das conquistas, tanto com o time da EEFE quanto com a Hebraica. Vitor já foi campeão do NDU, dos Jogos da Liga, da Taça USP, além de também jogar pela seleção USP. Pelo clube ficou seis vezes entre os quatro melhores do campeonato paulista (três vice-campeonatos), já foi convocado para a seleção paulista e chegou a disputar dois campeonatos internacionais, na Suécia e na Dinamarca.

Do profissional às quadras universitárias

Outro exemplo de atleta e treinador que levou sua experiência de clubes profissionais para as quadras do universitário é Vitor Hugo Sarvas, aluno do 4º ano de Esporte na EEFE. Vitor já jogou basquete pelo Continental Parque Clube, mas hoje seu interesse é apenas ser treinador.

Aplicando sua experiência aos treinos do clube Pinheiros e no comando do time da EACH ele já conseguiu um vice-campeonato da série laranja da Copa USP e dois títulos nas categorias sub-15 e sub-16, bem como um vice no sub-17 com o time pinheirense. Vitor acredita que a experiência em clubes profissionais pode levar uma boa influência para o esporte universitário. “Acredito que principalmente a organização e o trabalho sistematizado e planejado que o esporte profissional demanda podem, sim, ser incorporados de uma maneira mais eficiente no esporte universitário.” Porém, poucas pessoas conseguem conciliar os dois universos. “Enquanto no esporte de alto rendimento, mesmo que nas categorias de base, existe uma grande demanda de tempo gasto para o aperfeiçoamento técnico do atleta, os treinos táticos conjuntos são apenas uma pequena parte do dia do atleta. Já no esporte universitário isso não é possível, já que os jogadores não possuem tanto tempo disponível e existem outras prioridades”, explica Vitor.

Seja por hobby ou profissão, não há dúvidas de que o esporte pode ajudar em muitos aspectos na vida pessoal e profissional dos atletas. Mesmo exigindo tempo, esforço e dedicação, o retorno em disciplina, responsabilidade e organização compensa. No meio de tudo isso, fica difícil se decidir entre os treinos ou a graduação. Mas mesmo que as dificuldades sejam muitas, uma razão é o que motiva esses atletas a dormirem pouco e treinarem muito: o amor ao esporte.

Por Amanda Manara