Momento atual renova temática de peça

Apresentação no TUSP sobre greve dos metalúrgicos de 1979 fica em cartaz até começo de julho

Espetáculo apresentado no Teatro da Universidade de São Paulo (Tusp) pode ajudar nas reflexões sobre o atual momento da instituição. Em cartaz até 3 de julho, o espetáculo “O Pão e a Pedra”, produzido pela Companhia do Latão, conta a história de diferentes personagens durante a greve dos metalúrgicos de 1979 no ABC Paulista. No papel central, a peça apresenta a personagem de uma mulher que se disfarça de homem para melhorar suas possibilidades de trabalho no ambiente fabril.

Dirigida por Sérgio de Carvalho, professor no Departamento de Artes Cênicas (CAC) da ECA, o espetáculo discute duas questões que estão em pauta na sociedade atualmente – a reinvindicação de direitos sociais através da greve e a luta das mulheres por igualdade de direitos e reconhecimento de seu trabalho.

“Procuramos fazer uma peça que respeitasse a verdade dos acontecimentos históricos de 1979. A única liberdade poética que nos permitimos foi quanto ao grau de participação das mulheres, pois ao contrário do que diz a peça, elas não trabalhavam em linha de montagem ainda numa fábrica como a Volkswagen. Mas essa ‘licença ficcional’, que surgiu como metáfora, aumenta a atualidade do debate.  É uma peça em que a luta de classes se aproxima de outras questões políticas, o feminismo é uma delas”, comenta o professor.

A peça combina elementos documentais da greve histórica, que contava com o apoio e reinvindicações de mais de 70 mil trabalhadores no Estádio da Vila Euclides, atualmente estádio do São Bernardo Futebol Clube, em São Bernardo do Campo, com as ideologias diferenciadas de três grupos distintos: os sindicalistas, a Igreja progressista e o movimento estudantil de esquerda. Girando em torno da personagem principal, os grupos desenvolvem suas histórias e mostram seus conflitos a partir da vida e as más condições de seu mercado e ambiente de trabalho. Os personagens são representados por Beatriz Bittencourt, Beto Matos, Érika Rocha, Helena Albergaria, João Filho, Ney Piacentini, Rogério Bandeira, Sol Faganello e Thiago França.

Atores encenam o espetáculo “O Pão e a Pedra” no Teatro da Universidade de São Paulo, produzido pela Companhia do Latão. Apresentação coincide com greve na USP (Foto: Lenise Pinheiro)

A pesquisa realizada para formular o roteiro da peça foi iniciada com dois anos de antecedência, feita por uma equipe de seis pesquisadores, entre eles Julian Boal, filho do dramaturgo, ator, diretor e pedagogo brasileiro Augusto Boal. O ponto de partida da pesquisa foi estruturado a partir das relações contraditórias entre as ideologias dos diferentes  grupos que participaram da greve e da experiência de vida que estavam enfrentando no país. Além disso, a luta dos trabalhadores na ocasião representou um grande papel na democratização do país, no período da ditadura militar.

Mas a ideia inicial era montar uma peça sobre a questão atual da religião, vinculada com a política e seu crescimento no Brasil como força econômica e midiática, suas formas de mercantilização. Sérgio conta que foi no decorrer da pesquisa sobre a ideia original que surgiu a ideia de contar a história da greve dos metalúrgicos: “Estudando um pouco a história da religião no país, me deparei com um movimento anterior diferente, quando setores da Igreja Católica lutaram contra a ditadura, defenderam os trabalhadores, especialmente pela atuação dos padres ligados à Teologia da Libertação no início dos anos 70. Acabei lendo textos sobre a proximidade dessa Igreja crítica do capitalismo com o movimento sindical do ABC”.

Sérgio de Carvalho também apoia a greve em curso na USP, porque luta contra o chamado “desmonte” da universidade pública. “O que surge agora é uma negação do próprio sentido do projeto de universidade, na medida em que a pauta tecnicista se impõe à força: a máquina de pesquisa e educação deve ser instrumentalizada pelo capital porque ele está aí como suposto único real existente, e esse processo de redução da função pública aos interesses dos agentes do mercado agora tem respaldo não apenas estadual mas também no governo federal” comenta, lembrando da declaração do governador Geraldo Alckmin sobre a Fapesp,  que criticou as pesquisas de base.

A Companhia do Latão, com sede na Vila Madalena, existe desde 1996, com a montagem do espetáculo Ensaio para Danton. É dirigida desde o início por Sérgio de Carvalho, e se constitui como grupo teatral interessado na reflexão crítica sobre a sociedade atual, que não somente produz peças, mas também atividades pedagógicas, edições e experimentos artísticos.

Por Carolina Monteiro

“O Pão e a Pedra”

Teatro da Universidade de São Paulo – Rua Maria Antônia, 294

Data: Em cartaz até 03 de julho

Horário: Quintas-feiras a sábados, 19h30 | domingos, 18h

Preços: Inteira: R$ 20 | Meia-entrada: R$ 10 | 98 lugares | Classificação 18 ano