Eleições municipais: os efeitos nos campi

Professor da FFLCH comenta resultado das urnas e o futuro impacto na comunidade uspiana
Foto: Victória Ferreira Del Pintor
Foto: Victória Ferreira Del Pintor

No último domingo, cerca de 144 milhões de eleitores em 5.568 cidades foram às urnas para votar nos candidatos a prefeito e a vereador que irão governar pelos próximos quatro anos. Em alguns municípios, como São Paulo, a decisão foi tomada logo no primeiro turno. Já em outras localidades, como Ribeirão Preto, a disputa avançou para o segundo turno, que será realizado no dia 30 de outubro.

Para debater os impactos das eleições municipais na Universidade e analisar a situação da capital paulista, onde fica o maior colégio eleitoral do país, com 8,8 milhões de eleitores, e o maior dos campi da USP, o Jornal do Campus conversou com Eduardo Leão Marques, professor livre-docente do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e vice-diretor e coordenador do Centro de Estudos da Metrópole (CEM).

JC: Como as eleições municipais afetam a Universidade?

O resultado das eleições altera o funcionamento da cidade inteira, inclusive das pessoas que estudam e trabalham na Universidade, portanto tem impacto direto nela. As questões da acessibilidade, da qualidade de vida, da quantidade de tempo livre das pessoas e também das condições de trabalho e de estudo sofrem impactos diretos. Então há uma relação forte, mas de forma indireta com a Prefeitura. Já a Câmara Municipal produz as leis relativas ao funcionamento da cidade, então também tem efeito na cidade como um todo e, portanto, na Universidade. Ao influenciar a cidade como um todo, a eleição do prefeito e dos vereadores influencia toda a cidade e sua organização.

O que cabe à Prefeitura da cidade e à Prefeitura do campus?

Em um campus universitário, todo os serviços urbanos são providos pela universidade e não pela cidade. Nesse sentido, a Prefeitura do Campus toma conta e provê os serviços urbanos dentro do campus, o que inclui a iluminação pública e os ônibus, e várias dessas coisas são feitas em interface com os sistemas municipais. Por exemplo, os ônibus são os mesmos do restante da cidade e eles entram aqui, mas há um acordo que regula o tipo de transporte que acontece dentro da Universidade. A mesma coisa acontece com o policiamento: há um acordo, no caso com o governo do estado, para especificar o tipo de policiamento a ser feito dentro do campus.

A gestão de Fernando Haddad focou a questão da mobilidade urbana. Como foi o impacto de sua gestão em São Paulo?

A gestão de Haddad teve uma importância estruturante para a cidade de São Paulo por três prioridades feitas ao longo da gestão. Primeiro, a questão da mobilidade urbana e dos transportes públicos, um tema que há muito tempo era citado genericamente e, pela primeira vez, houve uma introdução na agenda pública de uma série de iniciativas para transformar a maneira como o transporte público acontece na cidade. Foi o principal legado dessa gestão.

Um segundo elemento importante, que tem efeito a longo prazo, é o planejamento. A cidade sofreu uma revisão geral de seus instrumentos de planejamento. Evidentemente, cada coisa depende de como a nova gestão vai tratá-las, se vai dar continuidade a elas ou não. Já houve o caso do Plano Diretor de 2003, que não foi implementado pela gestão que sucedeu a gestão que o tinha feito e, portanto, ele virou uma letra morta.

O plano atual foi aprovado e há a Lei de Zoneamento. Então existe uma nova regulamentação sobre o usos da cidade e a estrutura dela, que deve ser organizada em torno do transporte público e da mudança das densidades relativas de parte da cidade para torná-la mais compacta, na linha do que as discussões urbanísticas mais avançadas sugerem.

O terceiro elemento foi trazer para o debate, com certa centralidade, a questão do espaço público, de ganhar de volta o espaço da cidade. São três legados importantes, mas que dependem do que o novo prefeito irá fazer.

Como fica essa questão do espaço público dentro da Universidade?

Essa é uma questão muito importante. É uma resposta dúbia, porque ao mesmo tempo que o espaço da Universidade é público, já que ela é pública, o espaço é prioritariamente da própria instituição, envolvendo sua própria comunidade, ou seja, estudantes, funcionários e professores. Esses dois usos têm que ser mediados. Já existe uma série de usos tradicionais, como o uso da estrutura da Universidade para andar de bicicleta ou treinar e também para passear.

Qual é o efeito destas eleições para o futuro de São Paulo?

Os eleitores paulistanos fizeram uma escolha clara, tanto que houve uma vitória de primeiro turno, mas é difícil entender qual é o conteúdo dessa escolha. Não se sabe direito as propostas do candidato vencedor, que são muito genéricas, como priorizar a educação e a saúde, mas não está claro como isso será feito.

O candidato vencedor não tem atuações prévias no Executivo que nos permitam imaginar qual é o conhecimento dele sobre a máquina pública e a produção de políticas públicas. A candidatura se apresentou como uma apolítica, que atende a uma utopia contemporânea da despolitização da política, que é totalmente impossível, mas que é produto de um desencanto das pessoas em geral. Essa utopia está associada a um certo elogio ao gerencialismo, como se gerenciar a política de uma cidade pudesse prescindir da negociação e discussão com grupos e fosse uma atividade empresarial de alocação de recursos de forma eficiente. O efeito disso para a cidade de São Paulo pode ser muito danoso, porque o gerencialismo não existe como uma forma melhor ou pior de gerenciar as coisas, e nem como algo apolítico e neutro.

Infográfico: Natalie Majolo
Infográfico: Aline Naomi