“Eles” quem?

Não entendi a finalidade da reportagem principal. A ideia, a princípio, era mostrar, para estudantes da USP, a forma como a USP é observada fora da USP. O gancho, imaginamos de saída, seria algum levantamento ou pesquisa de opinião para compreender questões como gargalo universitário ou, como até chegou a ser lembrado no texto, o distanciamento da maior universidade da América Latina em relação a boa parte dos estudantes secundaristas.

Mas não. O que temos ali é uma série de opiniões, escolhidas sem um critério muito claro, para cravar o que “eles” pensam – e na saída, sabemos então que existe um “nós”. A abordagem chega a parecer release logo no início, quando o acesso à universidade é classificado como “sonho”, mas logo muda de tom quando a declaração de uma estudante é classificada como resultado de uma “confusão”.

As melhores informações ficaram soltas ao longo do texto. É quando visualizamos, em números, dados sobre sistemas de bônus, Sisu e cotas, mas sem o aprofundamento ou comparações necessários. O que temos em seguida são impressões, e não uma tentativa de compreender o discurso comum em relação ao caráter “elitista” e “inalcançável” citados já no título. Saímos do texto como entramos: sem compreender nem imaginar saídas para reduzir esse distanciamento, embora o coordenador do cursinho universitário ouvido pela reportagem tenha dado a dica a certa altura: falta de trabalho para levar informação sobre as universidades para as escolas. A notícia estava ali, e era essa resposta que poderia ser cobrada das instituições responsáveis, dentro e fora da universidade.

O mesmo problema é observado pouco à frente: por que reservar um abre de página com uma não-agenda sobre um encontro (não realizado) de natação? A notícia (no caso, a falta de recursos para os eventos esportivos), de novo, estava no pé, mas ficou ofuscada já no título.

Do mais, achei positivo o esforço das páginas seguintes para compreender a onda conservadora que já anunciava a vitória de Donald Trump nos EUA, e como ela é observada dentro da universidade, bem como a entrevista com um cientista político que acaba de apresentar sua dissertação para analisar o resultado das eleições municipais, algo que sentíamos falta nas últimas edições.

Matheus Pichonelli mantém uma coluna de cultura e comportamento na CartaCapital e escreve sobre política no Yahoo Brasil.