Professor do IME discute bloqueio do Whatsapp no STF

Audiência pública realizada no início do mês ouviu especialistas na área

O professor Nelson Posse Lago, do Centro de Competência em Software Livre do Instituto de Matemática e Estatística (IME-USP), foi um dos participantes da audiência pública que discutiu, na primeira semana de junho, a comunicação digital e outras questões envolvendo aplicativos de trocas de mensagens. Realizada pelo Supremo Tribunal Federal, o encontro “Bloqueio Judicial do Whatsapp” foi convocada após o aplicativo ter sido bloqueado quatro vezes no país, duas em 2015 e duas em 2016. Dois bloqueios caíram com liminar e aguardam até hoje uma resposta definitiva, nas mãos dos ministros Edson Fachin e Rosa Weber. O encontro discutiu também se há inconstitucionalidade nos artigos 11 e 12 do Marco Civil da Internet, regulado em 2014, que traz a suspensão de atividades referentes à coleta e armazenamento de dados, sob vigência obrigatória da legislação brasileira.

A Justiça pede que o Whatsapp forneça os dados das conversas dos usuários. Por outro lado, a empresa defende que isso é impossível. O próprio co-fundador do Whatsapp, Brian Acton, esteve na audiência em Brasília e reafirmou a posição que nem o aplicativo tem acesso a estas informações.  O professor do IME explica que o posicionamento do aplicativo pode ser verdadeiro, já que diversos programadores experientes tentaram descriptografar mensagem sem obter êxito, mas que ninguém sabe ao certo.

Parceiro do Núcleo Direito, Incerteza e Tecnologia, da Faculdade de Direito, Lago explanou a respeito de questões tecnológicas, metadados e mostrou aos ministros do STF que comunicação é diferente de criptografia. Há a plataforma que permite o envio e o recebimento de dados, e o conteúdo da mensagem em si, que pode ser aberto ou criptografado. “O que o Whatsapp faz é juntar os dois, mas nada impede que um usuário criptografe os dados em um sistema e envie através de outro”, explica. Ele lembra que aplicativos como o Telegram, sequer são regidos pelas leis brasileiras, por estarem sediados fora do país.

A discussão no STF envolve outros aspectos da comunicação digital. Nos e-mails, por exemplo, Lopes afirma que é muito comum o usuário ter uma conta no Gmail ou da USP e utilizar um programa gerenciador de correio diferente, como o Outlook ou Thunderbird.

A questão dos metadados, que são dados dentro de outros dados,  também é relevante e em uma investigação, muitas vezes, essa informação pode já ser suficiente.”A empresa pode até não passar o conteúdo da mensagem, mas precisa passar todo o restante, que fica armazenado. Ela sabe quem enviou a mensagem, para quem, em qual horário, muitas vezes sabe até o lugar. E um movimento diferente, fora do padrão, como muitas trocas de mensagens entre dois indivíduos monitorados, ou silêncio repentino, próximos a um atentado terrorista, por exemplo, pode trazer muitas respostas.”

Constituição

A Constituição traz no Artigo 5º, inciso XII, a obrigatoriedade do sigilo de correspondência, comunicações telegráficas, dados e comunicações telefônicas. O professor do IME explica que uma conversa por telefone, pode ser interceptada por ordem judicial, já que não possui um registro físico. “Ao desligar o telefone, acabou. A voz não fica gravada. Diferente de uma carta ou correspondência, que não pode ser aberta, jamais, mas em uma ação de busca e apreensão pode, supostamente, ser encontrada. O Whatsapp está mais para esse tipo de comunicação, porque teoricamente, o celular também poderia ser encontrado com todas as mensagens”.