Paolo Rossi, o carrasco da Copa de 1982, já jogou na USP

(Reprodução)

Estádio Universitário, o 5º maior da capital, também foi palco da final da popular Copa SP de Futebol Júnior

Por João Victor Escovar

Apesar de boa parte da comunidade USP passar diariamente pela Avenida Professor Mello Moraes – a rua da raia olímpica -, poucos conhecem a história de uma enorme construção que pode ser vista da via. Localizado no Centro de Práticas Esportivas da USP (Cepeusp), o Estádio Universitário – que quase foi olímpico – ajuda a contar um pouco mais da história do esporte na USP e na cidade de São Paulo. Hoje subutilizado, o palco já recebeu craques internacionais e tradicionais competições nacionais.

Inaugurado em 1976, o estádio deixou à Universidade um legado desproporcional às suas ambições no esporte. Com capacidade de receber cerca de 35 mil pessoas, o chamado Olímpico da USP foi, à época de sua inauguração, o terceiro maior estádio de futebol da cidade de São Paulo, atrás apenas do Morumbi e do Pacaembu. Mesmo depois de mais de 40 anos, ainda ocupa a quinta posição, tendo sido ultrapassado pelas modernas arenas de Corinthians e Palmeiras. Em épocas de crise, se tornou um elefante branco.

“Há uma ideia muito difundida de que tanto o estádio como tudo que existe no Cepeusp foi construído para os Jogos Pan-Americanos de 1975 (que teria São Paulo como sede), e que depois tudo ficou na mão da Universidade”, explica o atual diretor do Cepeusp, Emílio Miranda. “A única obra que foi construída, de fato, para os jogos, foi o velódromo. O restante já estava no projeto original de um centro esportivo universitário.

O Cepeusp original, entretanto, foi engrandecido pela ideia do Pan, patrocinado pelo regime militar, que via no evento esportivo um meio de angariar o apoio popular. Existe o senso comum, inclusive, de que a colocação da USP como uma das praças dos jogos foi uma tentativa de melhorar a imagem do generais no meio universitário.

O estádio foi projetado por Ícaro de Castro Mello, um famoso arquiteto da época, que dá nome às arquibancadas do Ibirapuera, as quais também desenhou. “É uma obra arquitetônica”, declara Miranda. “Ele foi construído de maneira que os anéis não se fechassem em círculo, como é o tradicional, mas sim em forma de ferradura, para que, visto do alto, fosse enxergado um ‘U’ de universidade”.

Os Jogos Pan-Americanos, contudo, não aconteceram, em virtude de um surto de meningite que acometeu São Paulo no ano anterior. Assim, o Pan foi transferido para a Cidade do México. O estádio, que deveria ser olímpico – incluindo estruturas como as raias de uma pista de atletismo – ficou inacabado se comparado ao projeto original. Coube ao estádio dividir o nome com o Campus, Armando Salles de Oliveira, homenageando um dos fundadores da USP.

(Arte: Mariana Rudzinski)

Momentos Marcantes

A partir da sua inauguração, o estádio foi muito usado internamente, pela comunidade USP, para treinos universitários e competições de pequeno porte. Entretanto, seu tamanho e sua localização em um marco do estado de São Paulo tornou o Armando Salles de Oliveira palco de eventos importantes, dos quais boa parte da comunidade atual desconhece.

Um deles foi a final da Copa São Paulo de Futebol Júnior de 1988. Desde aquela época, o torneio já era considerado a mais importante competição de base do futebol brasileiro, embora contasse com menos times e sedes do que atualmente. No ano em que a USP recebeu a decisão, foram apenas 24 equipes em quatro sedes, sendo que a maioria dos jogos ficou concentrada na capital.

No jogo decisivo, o Nacional, de São Paulo, venceu o América, de São José do Rio Preto, por 3 a 0, sagrando-se campeão. O destaque do jogo foi o meio-campista Mil, que marcou dois gols e foi cogitado pela imprensa da época como uma grande promessa do futebol nacional. Infelizmente, acabou não vingando.

Outra competição importante que aconteceu no estádio da USP foi a chamada Copa Pelé, um torneio cuja proposta era reunir os grandes craques de todos os tempos, através de um campeonato entre seleções de veteranos. Idealizada pelo jornalista Luciano do Valle – que fazia as vezes de técnico do Brasil -, a Copa Pelé começou em 1987, com o título da Argentina, e se repetiu de dois em dois anos até 1995.

A edição que reuniu os eventos mais curiosos foi a segunda, de 1989, vencida pelo Brasil. O líbero alemão Franz Beckenbauer, por exemplo, que havia sido campeão da Copa de Mundo de 1974, exibiu todo o seu talento no estádio do Canindé.

A USP, por sua vez, através do Armando Salles de Oliveira, foi palco daquele que proporcionou uma das mais dolorosas derrotas da história da seleção brasileira – antes, é claro, da semifinal de 2014. A partida pela Copa Pelé, entre Itália e Uruguai, trouxe para o campus Butantã ninguém menos que o atacante italiano Paolo Rossi, que marcou os três gols da Itália na vitória por 3 a 2 contra o Brasil, pela segunda fase da Copa do Mundo de 1982.

A expectativa por aquela seleção era muito grande, principalmente pelo futebol ofensivo e de qualidade que demonstrava. Sete anos depois de frustrar Zico, Sócrates, Falcão e companhia, a Itália de Rossi empatou em 3 a 3 com o Uruguai, curiosamente no dia 24 de janeiro, exatamente 1 ano após a final da Copa São Paulo. O Uruguai seguiria até a final, contra o Brasil.

Além disso, o estádio da USP recebeu outros jogos menores, como partidas da seleção paulista de futebol contra as de outros estados brasileiros.

O antigo “favelão”

Nos dias de hoje, o estádio ainda é utilizado pela Universidade, seja para treinos no campo ou eventos de pequeno porte. Embaixo do anel inferior das arquibancadas, existem vestiários, salas de aula para ensino esportivo, um anfiteatro e alojamentos para visitantes. O anel superior, contudo, segundo o último laudo da Escola Politécnica, está inviabilizado. Os seguranças do Cepeusp não recomendam ficar embaixo da construção.

Em reportagem de 2007, o jornal Folha de S.Paulo denunciou os alojamentos do estádio universitário como moradia de estudantes de baixa renda que não conseguiam vaga no Conjunto Residencial da USP (Crusp). Segundo o jornal, eles viviam em condições precárias de higiene e segurança – tanto que apelidou o local de “Favelão da USP”.

Dez anos, depois, o Jornal do Campus visitou os alojamentos, para verificar se as condições se mantinham e verificou que o local passou por uma readaptação, de maneira que já não vive mais ninguém nos alojamentos, que são utilizados por competidores que vem de fora da cidade ou pesquisadores que frequentam eventos científicos da USP. Além do mais, as salas apresentavam boas condições de limpeza e manutenção, servindo bem como um local de pernoite. O único problema relatado foram os pernilongos durante o verão.

“Essa questão da moradia foi durante um mês, há muito tempo. Atualmente, o alojamento abre durante a pré-seleção dos alunos para o Crusp, mas ninguém mora mais lá. Nossos frequentadores são participantes de eventos científicos ou alunos do interior. E temos beliches e colchões em bom estado”, afirma o diretor do centro.

Nos últimos anos, o Cepeusp tentou levar adiante a ideia de uma parceria público-privada para a revitalização do estádio, investindo no campo, na iluminação e no anel inferior, possibilitando o recebimento de eventos que angariassem fundos para a USP. O projeto foi engavetado.

“O estádio, como toda estrutura esportiva, acaba se deteriorando se não for usado nem mantido. Infelizmente, é um legado acima da capacidade de manutenção do Cepeusp e a própria Universidade”, analisa Miranda.