“O que ela falar, é regra”

Cresce participação feminina nos e-sports na USP e ao menos uma técnica já treina time masculino

Por Giovanna Jarandilha

Foto: Giovanna JarandilhaAs segundas-feiras de Deyse decorrem de forma um pouco diferente das nossas: com o olho nos prêmios que sonha conquistar, ela inicia a semana com um ritual de pesquisa em campeonatos externos e análise de desempenho para instruir seus alunos.

Deyse Marques é técnica do time de LoL, sigla para League of Legends, da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas). Lol é um jogo eletrônico que está há quase uma década no mercado, com reconhecimento no recente no meio universitário.

Mesmo dentro das próprias atléticas, os esportes eletrônicos não são reconhecidos como uma modalidade esportiva. “Como você vai explicar pra alguém que tem a vivência totalmente diferente da sua que um jogo eletrônico pode virar um esporte a partir do momento que ele vira uma competição?”, desabafa.

Os dez “meninos” que coordena – como a técnica os chama maternalmente – recebem de Deyse o beabá de estratégias e jogadas inovadoras que podem vir a potencializar as qualidades que possuem, e desenvolver outras.

Aos domingos, o grupo se divide em times de cinco para treinar como em uma competição de verdade. Depois de dois jogos, revisam o que foi passado e definem metas para tirar da lista logo na próxima semana.

“É gratificante”, ela comenta sobre acompanhar o progresso de seus alunos, enquanto me mostra no celular as mensagens que recebeu à tarde de três meninos que ajudou a subir de nível.

Técnica na FFLCH

Jogando desde os 13 anos sob influência dos primos, Deyse costumava jogar Sonic em um computador branco típico dos anos 90. Depois, fez curso de técnica em informática e o jogo Counter Strike a acompanhava. Só veio a jogar LoL quando terminou o ensino médio, em 2013.

Passou um ano sabático em que relata ter se tornado “muito boa” em LoL, para logo depois parar de jogar completamente e então direcionar seu foco para o vestibular. Passou em Geografia na FFLCH, e agora, no quarto ano, decidiu entrar em contato com o jogo novamente.

O ano passado marcou a estreia do e-sport como modalidade esportiva no BIFE – campeonato anual entre faculdades da USP. Depois da derrota da FFLCH na competição, Pedro, diretor de e-sports, resolveu montar uma equipe bem treinada visando a vitória neste ano.

“Colocaram um anúncio e eu queria muito participar da equipe de LoL, mas não queria jogar porque estou no quarto ano e não tenho muito tempo pra ficar jogando”, explicou Deyse. “Eu queria virar técnica da equipe”.

Perguntei se dividia a função com mais alguém, ao que me respondeu: “Da equipe de LoL, sou só eu”.

Única mulher

Aos 22, Deyse não só treina um time de dez sozinha, mas também é a única mulher da sua equipe.

Apesar disso, a experiência está sendo melhor do que esperava. “Eu pensei que eu teria muito problema por ser a única menina”, conta. “Quando montamos a equipe, o Pedro disse pros meninos ‘essa é a nossa técnica, Deyse, e o que ela falar, é regra’. E eu pensei ‘beleza, vamos ver se vai ser isso mesmo’. E foi”.

O meio de esportes eletrônicos, alegadamente machista, é “desanimador”. Deyse chegou a pensar em parar de jogar por ter sido constrangida dentro da comunidade, não só durante jogos, mas também no Instagram e no Twitter. “Você ouve coisa desde ‘mostra os peitos’ a ‘você é um lixo’, só porque você é menina”.

Há apenas um mês juntos, seu time terminou em terceiro lugar no Tarenas Cup, primeiro campeonato externo à USP que participaram.

O plano da técnica é vencer o BIFE neste ano, para participar do UniLoL em 2020, um campeonato interuniversitário.