Pertencer à Atlética

Quatro alunas mostram que as atléticas representam muito mais que o esporte

 

por Letícia Cangane

A experiência na atlética vai para além das quadras. O sentimento de grupo e as várias emoções compartilhadas criam memórias afetivas para os atletas. Foto: Arquivo pessoal de Letícia Grill

 

As Associações Atléticas da USP são, por definição, as entidades que organizamos times e atividades esportivas realizadas pelos alunos. Porém, se engana quem pensa que elas se resumem aos minutos de competição. Para muitos estudantes, a atlética é sinônimo de grupo, acolhimento, emoção, união, pertencimento e muitas histórias. Aqui, vamos contar quatro delas. 

É para todo mundo

A minha história com a atlética envolve a história da minha modalidade. O rugby tem uma certa independência histórica, foi criado e se sustentou de maneira independente da atlética. A modalidade fazia uma festa só dela, ao invés de se juntar com as outras para conseguir dinheiro. Recentemente, a partir de 2019, o rugby começou a procurar a atlética, a ter essa parceria mais próxima com a entidade. 

O nosso foco não é a mensalidade. Queremos conseguir o máximo de atletas e fazer com que eles participem, e nem todos têm condições de pagar para fazer a prática esportiva. A nossa tradição é pensar mais na prática do que no dinheiro. A nossa mensalidade é mais barata e a gente utiliza o dinheiro que conseguimos com a festa para pagar os treinadores.

A atlética está na minha vivência universitária principalmente em relação aos inters, por exemplo o Caipirusp. A entidade que organiza, faz todo o plano para a gente ir viajar. Às vezes, atuamos como uma colaboração, principalmente porque eu sou a diretora de modalidade do meu esporte, então quando eu preciso de alguma ajuda eles estão disponíveis para me ajudar. Vejo a atlética muito como um suporte.

— Nathalie Kaori, estudante do sexto semestre de Educação Física e Saúde na Each. A Kaori joga rugby e é diretora da modalidade. 

Vivência única

Essa história com a atlética começou antes de eu entrar na faculdade. Eu já conhecia um pessoal que estudava na Fisioterapia, sabia que eles corriam também, então eu já acompanhava mais ou menos as competições, algumas premiações dos meus amigos. Eu tinha noção que era uma atlética pequena, com poucas pessoas fazendo parte do atletismo, então eu já queria entrar na faculdade e fazer o pessoal correr, queria formar um time. 

De cara, foi meio difícil. No Bichusp, fomos só eu e um menino para correr como Fofito (Faculdade de Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da USP). Mas não deixou de ser uma experiência muito boa, porque meus veteranos deram um superapoio, foram lá torcer, tanto no atletismo quanto no vôlei também, teve uma torcida bem legal. Isso me ajudou a não desanimar. 

Desde o primeiro semestre eu já estava na atlética, no atletismo. Participei da Copa USP de atletismo sozinha também. No próximo eu já consegui chamar mais gente, tinha atletas da terapia ocupacional, da fonoaudiologia, foi mais divertido de se torcer, de curtir com o pessoal. Aí, eu já consegui medalha pela atlética, a gente ficou muito feliz. Esse ano, já como Diretora de Modalidade oficial do atletismo, consegui até mobilizar bastante os calouros para participarem do Bichusp. Infelizmente a pandemia não colaborou, mas eu achei legal ver os bixos participando dos treinos. 

A experiência de treinar com outras atléticas é a coisa mais rica que tem. Você conhece gente de todos os cursos, conversa sobre todas as coisas. Esse convívio que a Universidade proporciona é muito bom, de verdade. Eu acho que, sem a atlética ali te dando um suporte, possibilitando que o pessoal tenha essa vivência, é muito difícil encontrar algo parecido na faculdade. 

Mesmo se tratando de uma atlética pequena, a Fofito se abraça e tenta não deixar as coisas morrerem. A gente passou por um tempo difícil, e agora estamos passando pela pandemia, mas estávamos bem engajados em fazer as coisas, mobilizar os bixos e trazer a galera para os treinos. A gente estava conseguindo e vai continuar depois da quarentena. 

Eu achava muito engraçado no Bichusp porque ninguém dava nada olhando para mim. Eu tenho um metro e meio de altura, era a japonesinha ali. Aí, quando chegava na hora das provas, o pessoal ficava meio assustado quando eu corria, saltava. A única questão é que eu já treinava atletismo antes da faculdade, então era muito engraçado ver a reação das pessoas. 

Eu acho que essa convivência me fez conhecer muita gente e ter uma visão diferente do esporte. O esporte universitário é diferenciado, não é a mesma coisa, a sensação é diferente.

— Alice Hirata, estudante do quarto semestre de Fisioterapia na Fofito. A Alice é diretora de modalidade do atletismo e também joga vôlei. 

Alice compete no atletismo desde o bichusp, no seu ano de caloura da FOFITO. Foto: Henrique Gomes

 

Novos horizontes 

Minha história com a atlética é que eu nunca fui muito fã de esportes. Na real, eu sempre fui para o lado das artes, sempre fui uma pessoa muito artística. Quando entrei na USP, eu entrei na Letras, mas acabei não me identificando com o curso. Eu mudei para a Pedagogia, e logo comecei a fazer muay thai, que era uma modalidade nova. 

Logo que eu comecei a fazer muay thai eu me apaixonei. Eu me ofereci para ser diretora da modalidade, porque como ela era nova, ainda não tinha responsável. Então eu acabei pegando essa responsabilidade, e foi muito legal. A partir daí que eu comecei a ter maior contato com a atlética. 

Eu participava de algumas reuniões, conversava com o pessoal da atlética e percebi que, na minha cabeça, era uma coisa muito fechada, muito “clubinho”, que não iam aceitar ninguém. Mas, a partir do momento que eu comecei a me aproximar deles, eu percebi que é totalmente diferente: superaberto, principalmente da pedagogia, que é uma atlética pequena. É muito legal, todo mundo está disposto a te ouvir, te ajudar e te acolher, principalmente. 

Eu acho que a atlética influencia muito a minha vida universitária porque, se não fosse a atlética, eu não teria conhecido a maioria dos meus amigos, nao teria feito rolês muito legais, não teria me interessado mais pelo esporte. Atualmente, na gestão, eu sou da diretoria geral de esportes, então aprendi muitas coisas sobre vários esportes e campeonatos. 

Eu acredito que a atlética consegue abrir muito a nossa bolha da Universidade. Às vezes, a gente fica ali, só no nosso curso, com os nossos amigos da sala, e a atlética quebra isso. Ela é, primeiro, sobre integração, sobre permanência na faculdade. É muito mais que só o esporte, é um mecanismo de representatividade, de permanência, da gente poder se firmar ali na faculdade. 

Acho que a entidade me possibilitou muitas coisas incríveis, conhecer pessoas incríveis, participar de projetos incríveis, então sou muito feliz e estou sempre aprendendo. A atlética é um mundo de aprendizado, com os diferentes cargos, e eu recomendo para todo mundo. Nem precisa fazer parte, mas se aproximar da atlética da sua faculdade já é uma experiência incrível, você não vai se arrepender.

— Sarah Guio, estudante do quarto semestre de Pedagogia na Faculdade de Educação. A Sarah é diretora de modalidade do muay thai e faz parte da gestão da atlética. 

Família

A minha história com a atlética começou em 2018, quando eu era bixete. Quando você é bixete na atlética não tem tantas funções, principalmente no primeiro semestre, era mais ficar na salinha e ajudar no que dava, fazer umas tarefinhas que a gestão pedia, ir em algumas reuniões. No segundo semestre é quando a gente entra de fato, podemos escolher nossas áreas. A gente também começou a fazer mais projetos, estávamos mais inseridos dentro de tudo. 

No segundo ano, a gente pega mais responsabilidade: passa a ser gerente das áreas, tem mais funções. Eu entrei na Comunicação e virei diretora de modalidade do handebol. Foi um ano importante para mim no pessoal e no profissional, ser diretora de modalidade agregou muito. 

No segundo semestre do ano passado montamos a gestão 2020, que se chama por um sentimento. É por um sentimento de união, de raça, de família, amizade. Queríamos provocar um sentimento nas pessoas e garantir que a gente estava trabalhando por ele também. Esse ano sou gestão, gosto muito dos meus dois cargos, a gente trabalha muito bem junto, somos um grupo de dez pessoas na alta gestão e temos 67 membros ativos na atlética. Trabalhamos muito duro para não perder esse sentimento de união. 

Desde 2018, quando eu entrei, muitas das minhas atividades e tudo o que eu fazia era influenciado por conta da atlética. Tudo o que eu vivia, desde participar de um time universitário, ou de um time administrativo da atlética e de toda a organização, é uma experiência que foi e está sendo surreal, algo que eu vou levar para a minha vida inteira. 

A gente fala muito sobre pertencimento dentro da atlética. Eu acho que ela gerou muito isso para mim e para todos à minha volta, porque a gente acabou encontrando uma família ali dentro. Todos os anos essa família é renovada, mas ela nunca perde sua essência, aquela vontade, aquela paixão que todos os atleticanos compartilham. E você vê isso ao passar dos anos — tem muitos ex-atleticanos que eu converso, tem um vice presidente de 1996 que é muito meu amigo, nós compartilhamos experiências atleticanas até hoje. 

Time de Handebol da FEA. Foto: Arquivo pessoal de Letícia Grill

 

Você acaba percebendo que é algo muito maior ali do que achou que fosse viver na vida universitária, é muito essa questão de pertencer mesmo a algo. É saber que com suas ações, você impacta a vida de outras pessoas. Noventa por cento de tudo o que eu fiz e vivenciei desde 2018 foi a atlética que me proporcionou, tanto com os eventos quanto com o administrativo. 

Minha gestão eu considero como família. Nós ficamos muito próximos, muito amigos, a gente compartilha as mesmas experiências no dia a dia. São as pessoas que eu estou trabalhando em reuniões, que eu vou ver no final de semana, é com quem eu quero viajar junto, é com quem eu compartilho os meus momentos bons e ruins. O que a atlética proporciona faz a vida das pessoas durante a graduação ter valido a pena. Então, quando a gente organiza os inters, os eventos, a recepção, a semana dos bixos, é muito gratificante. 

Em relação aos times também, eu percebo muito isso. As meninas do handebol são minha outra família, é com elas que eu passo os perrengues durante a semana, com os treinos. É com quem eu fazia muitos jogos no final de semana, às vezes três no mesmo dia; depois a gente saia para comer, passava a tarde juntas, porque tinha mais jogo à noite; às vezes dormia junto, porque tinha um outro jogo no dia seguinte. Nós viajamos juntas também, assim como o handebol masculino, os técnicos, todo mundo ficou bem próximo.

Essas duas experiências que a atlética me proporcionou eu posso dizer que mudaram a minha vida, não consigo me imaginar sem isso, ou em outra posição, ou fazendo outra coisa no momento que não fosse pertencer à atlética. A gente sempre fala que a atlética é o que cada um doa de si, então é muito bonito ver um time assim, se doando para uma causa que você não é pago para estar lá, trabalhando, é tudo porque a gente quer ver aquilo acontecer. Queremos inspirar as pessoas, representar os feanos. É muito bonito fazer parte de uma equipe que busca isso em tudo o que faz.

Eu me sinto muito pertencente ao ambiente em que estou agora. É até uma loucura, porque não consigo me imaginar em outro lugar ano que vem, e eu sei que esse ano nossa gestão acaba. Vai ser muito diferente estar na FEA (Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária) no ano que vem e não estar todos os dias na salinha, com as mesmas pessoas, dando risada. Eu acabei me encontrando demais dentro da atlética, com aquelas pessoas ali que têm perfis ao mesmo tempo muito parecidos e muito diferentes do meu, é uma troca muito rica de tudo, de vida mesmo, é uma experiência que vou levar para a minha vida inteira. Realmente, pertencimento é uma das palavras principais quando eu penso em atlética e tudo que eu passei durante esses anos.

— Letícia Grill, aluna do quarto semestre de Administração e no seu terceiro ano de FEA. A Letícia é vice presidente da atlética e diretora de comunicação, além de DM do handebol.