Conteúdo sensível: então é Natal

Daqui a um ano, a pergunta insistente que surge na voz de Simone voltará a ser apenas mais um lembrete de que as festas estão chegando

 

por Isabel Teles

Arte: Pedro Lobo/ Fotos: Freepik e Unsplash

 

“Então é Natal, e o que você fez?”

Se em anos comuns a letra interpretada por Simone – que começa a ecoar em toda parte quase tão cedo quanto a decoração temática nas vitrines – já desperta certa ansiedade, em 2020 é certeza de gatilho. 

Mas não deveria. Ou pelo menos, não pelos motivos tradicionais, relacionados à ideia de que ao final de dezembro é necessário ter riscado a maior parte dos itens de uma lista de metas que insistimos em impor a nós mesmos ano a ano sem real necessidade. 

Bem resolvido é aquele que pode deitar a cabeça no travesseiro tranquilo por não ter feito nada. Aquele que sabe que ficou quietinho em casa seguindo o protocolo sanitário sem promover ou participar de nenhuma aglomeração. Em 2020, isso é o máximo.

 

“Então é Natal, e o que você fez?”

Sempre tem um conhecido que aproveitou a quarentena para fazer um milhão de cursos online, redecorar a casa sozinho e ainda conseguiu um emprego novo e engatou um relacionamento. Tudo devidamente registrado nos perfis do Twitter, Instagram, Linkedin, Facebook e TikTok.

Obviamente, estes são pontos fora da curva e não precisam ser parâmetro para comparação – aliás, qualquer coisa exibida nas redes sociais deveria ser automaticamente desconsiderada para esta finalidade.   

A realidade é que a maioria das pessoas não fez nada demais mesmo. Aliás, fez muito ao segurar a barra que é passar mais nove meses com saúde física e mental mais ou menos em dia em meio às turbulências políticas do Brasil e à pandemia que assolou o mundo todo. Isso sim é ótimo e digno de nota. 

 

“Então é Natal, e o que você fez?”

Ao invés de viagens e idas a restaurantes badalados, as timelines exibem fotos de estantes com livros e receitas preparadas em casa. Ao invés de sessões de cinema e shows lotados, lives e maratonas no streaming. Ficar em casa também tem prazeres, mas nem tudo são flores. 

Ao invés de expedientes tardios em escritórios, horas-extras no home office improvisado. Ao invés da rotina, uma bagunça dividida entre tempo de lazer, trabalho, descanso e tarefas domésticas em dias com apenas (!) 24 horas. 

Pode parecer papo de coach, mas o maior feito do ano que passou foi ensinar resiliência, ou no português mais direto: adaptação. São tempos extremos que exigem medidas extremas, isso enquanto os nervos afloram à pele. 

 

“Então é Natal, e o que você fez?”

Apesar de tudo, há algo místico nessa época do ano, que faz com que as esperanças sejam renovadas. Em 2020, mais do que nunca, a notícia da vacinação é o que dá motivação para enfrentar também o período de festas e celebrações que certamente serão atípicas. 

Então, se não deu para tirar aquele plano do papel antes da virada do ano, não é razão alguma para frustração. Até porque também dá para esperar o Carnaval, já que no Brasil, o ano só começa mesmo depois da festa da carne. 

Ótima notícia para os procrastinadores: em 2021 os desfiles serão só em julho. Quase seis meses a mais para riscar todas as metas de 2020 da lista. Isso para quem se arriscar em fazer planos, mesmo com a experiência demonstrada de que tudo pode mudar por causa de  coisas que estão absolutamente fora de nosso controle. 

 

“Então é Natal, e o que você fez?”

Se as previsões se concretizarem, até o próximo Natal, boa parte da população estará imunizada e a vida poderá começar a voltar como era antes. As confraternizações poderão voltar a reunir dezenas de pessoas, que se cumprimentarão com abraços e beijos e brindarão ao que passou e o que está por vir.

Além da resiliência, 2020 também foi uma aula de paciência. A expectativa é de que a espera seja compensada com saúde e a volta dos sonhos para um futuro distante do caos pandêmico. 

Nesse caso, daqui a um ano, a pergunta insistente que surge na voz de Simone voltará a ser apenas mais um lembrete de que as festas estão chegando e que é hora de rever as metas com a tranquilidade de que nada atrapalhou os planos.