Luiza Caires, um olhar da ciência dentro e fora da USP

A jornalista e editora de ciências do Jornal da USP, Luiza Caires foi destaque em 2020 na divulgação de informações acerca da pandemia e foi apontada como o segundo perfil mais influente no Twitter sobre o assunto

Por Beatriz Carneiro (beatri@usp.br) e Mayara Prado (mayaraprado@usp.br)

 (Foto: Cecilia Bastos)

 

Luiza Helena Gonçalves Caires, editora de Ciências do Jornal da USP e divulgadora científica nas redes sociais, se provou mais simples e simpática do que a sua posição no jornalismo possa revelar. Em meio a suas férias, ela aceitou o convite para a entrevista matutina com empolgação, e ao longo da conversa se mostrou uma pessoa acessível, alegre, ponderada e curiosa.

A leveza de sua presença e suas constantes risadas, contrastam com a seriedade de sua produção jornalística. Divulgadora científica há 15 anos, ela lida diretamente com a comunicação da pandemia em suas redes sociais. Caires acumula um público de 12,6 mil pessoas no Instagram e 66,8 mil seguidores no Twitter. Ela é considerada o segundo perfil mais influente sobre o assunto na rede dos tweets, o que a faz ganhar cada vez mais relevância dentro do cenário de divulgação de ciência e vários convites para participar em eventos online. 

“Nessa pandemia eu conheci tantas pessoas à distância. Antes eu viajava para algumas universidades para fazer palestras, mas não tem nem comparação com tantos convites que recebi durante essa pandemia. Participei de muitas lives e discussões com pessoas de muitos lugares. Em termos de números, não conhecia tanta gente como agora. É bem diferente”, conta ela. 

Cautela com a divulgação

O momento atual não é definido apenas pelo coronavírus. A polaridade política, a disseminação de fake news, a criação errônea de kit de tratamento precoce disseminado pelo próprio Governo Federal e a descrença na ciência também definem o presente. Com o aumento de sua visibilidade, Luiza seleciona de forma criteriosa tudo o que compartilha: “Como divulgadora científica, e no meio da pandemia principalmente, eu penso muito antes de colocar alguma coisa. Sem contar que, se eu colocar alguma coisa errada, além de prejudicar as pessoas, tem a questão da minha própria imagem, da minha credibilidade”. 

Luiza durante o Roda Viva da TV Cultura com o entrevistado David Quammen. (Foto: Acervo Pessoal)

 

A cada post feito, Luiza tenta mostrar aos seus seguidores que uma novidade acerca do vírus é uma “pecinha” a mais. É também por isso, que ela escolhe minuciosamente cada artigo científico que vai para suas redes: “É um artigo a mais, será que vale a pena eu divulgar? Essa divulgação individual de artigos é um pouco complicada, do ponto de vista do público, se você não der a noção de que aquilo é um trabalho, uma pecinha. Não só porque depois ela pode ser contestada, como também ela não responde totalmente às perguntas”, compartilha.

Sobre o processo de divulgação, ela revela: “Primeiro, eu escolho quais assuntos vou abordar, às vezes quando uma coisa é muito inicial eu prefiro não colocá-la. Procuro sempre falar assuntos que já tem o mínimo de consenso ou que não vão gerar nenhum tipo de dúvida, por exemplo, em relação à vacina. Isso, na verdade, é uma coisa que distancia um pouco o trabalho de divulgação científica de outras áreas do jornalismo, porque o jornalista é orientado a tornar pública toda informação que chega até ele, independentemente das consequências”.

Com sua popularidade no Twitter, Caires comenta que muitas vezes as pessoas a veem como uma especialista no assunto, mesmo a jornalista falando que não. “Eu acho até engraçado: me perguntam sobre a saúde delas, sobre decisões, e eu já falo assim: ‘eu não sou profissional de saúde, não posso falar’. Mas enfim nem adianta falar, ah mas eu falo que não sou, porque tem pessoas que me veem como [especialista] entende?”.

Escolha para se preservar e a saudade

Tudo que se posta nas redes gera uma réplica, nada fica sem resposta. “A gente vai aprendendo isso com o tempo, eu tenho até alguns conhecidos que falam ‘como você não fica brigando?’. Falam cada coisa, mas é uma escolha mesmo entrar lá e ficar respondendo quando uma pessoa faz um comentário desagradável”, conta Luiza sobre a relação com o público.

É claro que os comentários agressivos a incomodam, ainda mais no período de isolamento social e com a doença afetando pessoas próximas. “Você tem que realmente trabalhar muito para se preservar também. São assuntos que nos deixam muito afetados. Porque às vezes a pessoa está falando alguma coisa sobre a pandemia que não é só uma coisa que te irritou, mas você já está chateada, porque acabou de saber que um amigo perdeu o pai, daí aquilo já pesa muito mais. Todo mundo está mais sensível, é bem mais complicado”.

Da mesma forma que muitos brasileiros, Luiza também é uma pessoa que sofre com a saudade. Ela está sem ver os pais, que moram no interior da Bahia, há quase um ano e meio. Sem contar as saudades dos amigos e do ambiente de trabalho. “Eu gosto de fazer muita brincadeira, então estou com saudade de tirar um sarro e de fazer umas piadas ruins”, fala ela brincando sobre a relação com os amigos.

Ao refletir sobre as consequências do coronavírus, Caires acredita que a sociedade mudará a dinâmica de relacionamento interpessoal, e finaliza a chamada de vídeo, com a reflexão: “A falta de interação afetou todo mundo. Eu estava lendo um livro sobre epidemias contando como, à certa altura da idade média, entre os feudos, não existiam muitas epidemias porque as pessoas viviam em arranjos menores e não conheciam muitas pessoas fora desse arranjo. Hoje em dia conhecemos muita gente, e fico pensando se vamos voltar a ter o contato como antes, com o tanto de gente que conhecemos, ou se vamos ficar apenas com alguns amigos no contato pessoal e o resto online. Acredito que alguma coisa vai mudar”.