Novas variantes, problemas nem tão novos

Em meio a incertezas sobre o futuro da covid-19, USP retoma aulas com indicadores positivos e intensificação de problemas em serviços para estudantes

por Arthur Macedo

Arte: Luisa Costa/JC

Há pouco mais de um ano, em 8 de abril de 2021, o Brasil registrou recorde nacional de 4.249 mortes por covid-19 em um dia. Desde então, a vacinação contribuiu para a queda na curva de óbitos pela doença e medidas de restrição sanitária foram relaxadas. Mas o coronavírus não deixou de ser uma preocupação. O SARS-CoV-2 continua a circular e se reproduzir, gerando novas variantes. A última mutação detectada em nível mundial é conhecida como Ômicron XE. Esse vírus é um híbrido das cepas da ômicron BA.1 e BA.2. O Brasil confirmou o primeiro caso da variante no último dia 7 de abril. Estima-se que a Ômicron XE seja aproximadamente 10% mais contagiosa em relação à cepa BA.2.

É justamente a subvariante Ômicron BA.2 que cresce no Brasil atualmente. De acordo com dados divulgados pelo Instituto Todos pela Saúde em 14 de abril, 69,3% dos casos confirmados na última semana epidemiológica analisada correspondem a essa cepa. A BA.2 se diferencia por não possuir o mesmo marcador genético da Ômicron original. Ela possui alterações na proteína spike, estrutura de aminoácidos utilizada pelo vírus para entrar nas células humanas, o que dificulta sua detecção em testes PCR e a fez ser conhecida como “variante silenciosa”. 

O surgimento de mutações faz parte da natureza do desenvolvimento de um vírus. Especialmente quando ele circula amplamente e tem mais oportunidades de reprodução. O ápice de contaminações por covid-19 no mundo ocorreu neste ano, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS). Portanto, é esperado que novas cepas surjam.

A vacinação em massa foi chave para conter maiores danos decorrentes da pandemia e para a retomada de diversas atividades. Dentre elas, está o retorno às aulas presenciais na USP. Mas como o atual cenário da covid-19 no Brasil e suas projeções afetam a Universidade?

A volta ao campus

No início de 2022, a Reitoria da USP confirmou o retorno às aulas presenciais a partir de 14 de março. A administração alega que as diretrizes definidas buscam retomar as atividades com a maior segurança possível. Dentre essas medidas, estão a divulgação de boletins informativos periódicos e a presença do status vacinal no e-Card. O uso de máscaras segue obrigatório nos espaços internos do campus, mesmo após decreto estadual de 17 março encerrar a obrigatoriedade de máscaras nesse tipo de ambiente.

As decisões são tomadas pela Reitoria em conjunto com uma Comissão Assessora. O grupo é composto por 20 docentes, escolhidos pelo conhecimento em assuntos ligados à pandemia. O comitê de professores se reúne semanalmente e tem a missão de manter a comunidade universitária informada sobre os aspectos sanitários e de saúde ligados ao coronavírus na Universidade.

Um dos integrantes da Comissão Assessora é Paulo Andrade Lotufo, professor da Faculdade de Medicina (FM-USP) com experiência em epidemiologia. Ele vê com bons olhos o primeiro mês desde o retorno às aulas presenciais. “Somente um instituto relatou diversos casos de contaminação, mas, pela nossa investigação, provavelmente [o contágio] não ocorreu no espaço da Universidade”, afirma o professor.

O controle no número de contaminações até o momento não significa que a volta às aulas presenciais ocorreu sem transtornos. Os restaurantes universitários passaram a operar com metade da capacidade, além de encerrarem o oferecimento de bebidas. A medida aumentou as filas nos bandejões.

O Diretório Central dos Estudantes da USP se posicionou contra essas condições através de abaixo-assinado. Diretora da gestão Nossa Voz, Ana Luísa Calvo Tibério fala em um problema recorrente que se amplificou nesse ano. “Houve falhas na preparação institucional para o retorno presencial. Diminuíram a lotação dos restaurantes para garantir o distanciamento, mas não pensaram nas consequências das filas. Sabemos que essa preocupação é parcial: negligenciaram a questão do distanciamento nas salas de aula, nos circulares lotados, nas filas dos próprios bandejões”, afirma a estudante da FEA.

A carta por melhorias nas condições de alimentação teve mais de cinco mil assinaturas, de acordo com o Diretório. A Reitoria respondeu nesta segunda-feira (18) a parte das demandas estudantis. Os restaurantes agora operam com 75% de capacidade. “Acreditamos que essa medida já foi extremamente importante. Mas ainda precisamos assegurar que as demais demandas sejam atendidas e que haja uma ampliação definitiva do bandejão”, diz Ana Luísa Calvo Tibério.

Foto: Arthur Macedo/JC

Atenção ao desenvolvimento da pandemia

Os números apresentados pela USP trazem otimismo quanto ao número de contaminações por covid-19. De acordo com o último Boletim Epidemiológico divulgado, o número de casos diagnosticados entre servidores não apresentou crescimento significativo desde o retorno às atividades no Campus.

Apesar dos índices, Lotufo ressalta que os cuidados com a doença não devem relaxar. “Agora é o momento mais importante da vigilância epidemiológica”, diz o professor. “Precisamos utilizar todas as fontes de informação possíveis para avaliar e projetar o futuro. O que importa para nós é o que vem pela frente”, completa.

As novas variantes do Sars-CoV-2 mantêm altos números de contaminações ao redor do mundo. A Coreia do Sul, por exemplo, passou em março pelos maiores índices de casos e mortes pela doença desde o início da pandemia. 

Caso o Brasil sofra com um novo aumento, Lotufo vê a Universidade preparada. “Estamos atentos a tudo isso. Mas também aprendemos que o fundamental são aspectos como o uso de máscaras e ambientes com ventilação. Com quase 93% da população elegível vacinada em São Paulo, a chance de uma explosão de casos é pouco provável”, analisa o professor.