De que um estudante precisa para permanecer?

Movimento estudantil defende aumento no auxílio-permanência de R$ 800 para R$ 1550; gastos básicos com contas, alimentação e transporte podem chegar a R$ 1200

Por Mariana Krunfli

Foto: Laisa Dias e Gabriele Mello

A permanência estudantil foi uma das principais demandas da greve que tomou conta da Universidade de São Paulo entre setembro e outubro de 2023. Neste ano, cerca de 14 mil alunos da Universidade foram classificados por critérios socioeconômicos e contemplados pelo Programa de Apoio à Permanência e Formação Estudantil (PAPFE), com um valor de R$ 800 ao mês. No ano passado, o auxílio era de R$ 500 e, em 2020, de R$ 400, como explica Tulio Gonzaga, diretor do Centro Acadêmico Lupe Cotrim (CALC).

“Estudantes que precisam nem sempre são contemplados. A comunidade tem mais de 90 mil graduandos e pós-graduandos somados. O auxílio de R$ 800 ao mês não necessariamente é suficiente. Sabemos que a moradia, a alimentação, o acesso à saúde e ao transporte na cidade de São Paulo e nos arredores da região metropolitana são sempre dificultados e caros”, conta. Em 2023, o aumento no valor da bolsa foi integrado a outros tipos de auxílio antes cumulativos.

A permanência foi uma das principais demandas da paralisação estudantil, apesar de ter sido pouco comentada pela Reitoria durante os diálogos com os estudantes, argumenta Tulio, que recebeu as informações via comando de greve. “Não teve nem discussão sobre a mudança do valor da bolsa PAFPE. Isso é um símbolo da falta de entendimento dessa urgência que os estudantes têm quanto à questão da própria sobrevivência na USP”.

Entre os compromissos firmados pela Reitoria durante a greve, a Universidade se compromete a disponibilizar para a comunidade o número de alunos que acumulam a bolsa PAPFE e a bolsa PUB – auxílio de R$ 700 reais voltado para pesquisa e extensão visto como uma forma de complementar a renda estudantil; realizar uma nova rodada de distribuição das bolsas PUB não contempladas ainda este ano; e compartilhar dados da distribuição orçamentária da bolsa PUB entre as Pró-Reitorias.

As demandas da USP são altas, é preciso estudar muito e, sem essa ajuda financeira, é impossível conciliar estudo e preocupações com o futuro”

Isabelle Aguiar, estudante de Letras que recebe o auxílio PAPFE

O JC entrou em contato com três estudantes que recebem auxílio da USP para se manterem na Universidade: Amanda Bortoni, aluna de Lazer e Turismo, Sara Leticia Santos Silva, de Sistemas de Informação, e uma aluna de Jornalismo, que preferiu não ser identificada. 

Para a moradia, Amanda afirma que mora junto com a mãe em um imóvel financiado, com quem divide as parcelas, o que resulta em R$ 300 em gastos mensais. Sara também vive na casa da mãe e ajuda a família com seu auxílio: “Minha mãe contribui com o bolsa família de uns 800 reais. A renda é o que serve para a família toda: eu, minha mãe e meus dois irmãos”. Já a aluna de Jornalismo explica que mora com sua madrinha, que paga o aluguel e o condomínio do apartamento. Contas como água e internet, porém,  ficam em torno de R$ 300 e são de sua responsabilidade.

“As mensalidades de locais próximos à faculdade são caras e eu não conhecia ninguém que fosse entrar na mesma universidade que eu, ou que fosse fazer um exame para entrar. Os meus gastos são divididos entre ajudar minha família e me manter na USP”, conta Sara. 

As estudantes, que demoram de uma a duas horas para chegar aos campus, declaram que os gastos com transporte variam de R$ 100 a R$ 200. Já com alimentação, elas explicam que comem nos restaurantes universitários pelo menos cinco vezes por semana. A estudante de Jornalismo afirma que seus gastos mensais com comida variam de R$ 400 a R$ 600.

Enquanto Sara relata que ainda não estagia por medo de não ter tempo para estudar, Amanda e a aluna de Jornalismo afirmam que fazem estágio para complementar o auxílio recebido pela USP com, respectivamente, R$ 700 e R$ 1500 de salário, e que não recebem ajuda financeira da família. 

A estudante de Jornalismo ressalta que, com o PAPFE e seu salário do estágio, não falta dinheiro, mas que o auxílio faz uma grande diferença na sua vida como aluna. “Consigo ter uma vida ok, sair no final de semana, comprar um salgado. Se não tivesse PAPFE, acho que ainda conseguiria me manter, mas não pagar pela terapia ou ter o mínimo de lazer”.

Segundo Tulio, o valor exigido pelos alunos para a bolsa PAPFE é o de um salário mínimo paulista – R$ 1550. Já Isabelle Aguiar, estudante de Letras que recebe o auxílio PAPFE, esclarece que o valor de R$ 800 contempla bem os estudantes, mas que um acréscimo seria positivo. “Um aumento poderia ajudar pessoas com mais vulnerabilidade”.