Pais e filhos – e netos – da Universidade

Prestes a completar 90 anos, USP registra histórias de famílias com três gerações de alunos; conheça três delas 

Por Julia Magalhães

Ilustração: Bruna Krunfli

 “A gente se apega de uma tal forma às coisas da USP que carregamos isso a vida inteira e conseguimos repassar isso para os nossos filhos e netos. E tem que ser assim mesmo, porque a USP faz parte da história do nosso país”

– Gilberto Lobo, antigo estudante da Faculdade de Direito da USP

No dia 25 de janeiro de 2024,  a cidade de São Paulo completará 470 anos e, curiosamente ou não, a Universidade de São Paulo (USP) também fará aniversário e chegará aos seus 90 anos. Com essa idade, é possível dizer que a USP já tem bisnetos, ou seja, descendentes dos seus primeiros alunos da turma de 1934. A descendência “uspiana” não diz respeito apenas aos alunos seguintes que estudaram nos cursos fundadores da instituição, mas também aos parentes que dividem a experiência de fazer USP.

Pai, filhas e netos. Para a família Lobo, a trajetória pessoal se confunde com a história da Universidade de São Paulo. Gilberto Lobo, o patriarca, é formado pela Faculdade de Direito da USP. Já suas duas filhas, Tânia e Sandra, são formadas, respectivamente, em Psicologia e Pedagogia também pela Universidade de São Paulo. Tânia ainda tem dois filhos, João Paulo e Diego, que, assim como a mãe, a tia e o avô, passaram a estudar na instituição. Diego, inclusive, cursa seu segundo bacharelado na USP. Emocionado, Gilberto conta como a universidade fez parte de tantos momentos importantes da sua família: “Meu primeiro dia de aula na faculdade foi, exatamente, o dia em que Tânia nasceu, 3 de março de 1970”. Além dessa ligação de Tânia com a USP, Sandra complementa ao contar como ela veio ao mundo: “Eles engravidaram depois que ele se formou, na festa de formatura”. A USP, portanto, esteve presente desde o início da construção da família Lobo. 

Mas eles não são os únicos com essas raízes familiares na Universidade de São Paulo. Rafael Ribeiro, estudante de Ciências Sociais na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH-USP), passou a infância com a mãe, professora de Ciências Sociais, e o pai, professor aposentado de Filosofia, trabalhando na instituição. “Minha mãe me levava para a USP antes de eu ir para a escola. Então, eu cresci no prédio da FFLCH”, conta Rafael. 

O estudante ainda relata que pessoas da universidade o reconheciam como o filho dos professores do departamento. “Fiz iniciação científica e meu orientador, sabendo que eu era filho de uma professora do departamento, não me orientou muito. Tive mais orientação da minha mãe e não fazia muita besteira para não envolver o nome dela”, comenta. O estudante também conta que os pais tiveram papel indireto na escolha do curso. “Queria ter feito história, mas acho que fiz Ciências Sociais porque era o que eu conhecia”. Mas a influência deve parar por aí: Rafael não gostaria de seguir a mesma carreira dos pais, também professores da USP. 

Pedro Dallari é diretor do Instituto de Relações Internacionais (IRI-USP), filho de um antigo diretor da Faculdade de Direito, o jurista Dalmo Dallari, e irmão da professora da instituição, Maria Paula Dallari. Dallari ainda diz que a escolha de seguir pelo meio acadêmico, assim como seu pai, veio de uma vontade sua de querer ser professor. 

“O fato de vários membros da minha família terem relação com a Universidade de São Paulo não significa que a gente não tem relação com outras instituições, inclusive acadêmicas. Então, a gente tem muita ligação e respeito com a USP, mas isso não revela nenhum tipo de viés exclusivista”, conta o diretor. 

A abertura para a inclusão social vem de exemplos como Isabel Briskievicz e Maria Vitória de Souza. Elas foram as primeiras das suas respectivas famílias a entrarem na USP. Isabel conta que seu pai já tinha feito faculdade privada e que a incentivava a entrar, mas a mãe, embora tenha ficado orgulhosa, não sabia nem o curso que ela ia prestar. Assim como a estudante, Maria também recebeu o incentivo da mãe, mas a iniciativa partiu totalmente dela. “Eu tive o apoio da minha família, mas, até então, era algo distante, não era uma oportunidade palpável”. A estudante de engenharia elétrica ainda conta que, nas suas primeiras semanas de aula, ela chorava muito, porque pensava que não devia estar ali. 

Um futuro formado pela USP

Embora quase todos os entrevistados não quisessem nenhuma outra faculdade além da USP, em sua maioria, aqueles que tinham parentes dentro da instituição não sentiram uma pressão familiar em relação ao vestibular. Tânia conta que “não quis passar para os filhos como uma obrigação entrar na USP, mas como uma coisa natural que se tivesse que ser, seria”. Inclusive, para Diego, filho de Tânia, a ideia da Universidade de São Paulo já aparecia antes mesmo dele entrar na faculdade: “Quando eu criei o meu Orkut, tinha que colocar a escolaridade. Coloquei a USP, sem curso nenhum, só USP, porque ia ser”. Já no caso da Maria Vitória, a estudante relata que carregava mais uma pressão “de encontrar na universidade uma ascensão social e financeira para manter a família em uma condição saudável”. 

Para os pioneiros, em geral, o começo foi mais difícil, no caso da família Lobo, o patriarca Gilberto só entrou na faculdade com 28 anos, casado e já com dois filhos. Já as filhas e netos começaram a graduação logo depois do Ensino Médio. Gilberto conta que, na época de sua entrada, seu pai ficou muito orgulhoso: “Foi uma emoção grande, porque, para ingressar na São Francisco, eles diziam que era só filho de rico, que a gente não teria nenhuma chance”. Hoje, quase toda a família Lobo tem um diploma da Universidade de São Paulo.