Violência na USP é a maior dos últimos 5 anos

Campus da Cidade Universitária teve 163 ocorrências de furtos, roubos e sequestros registradas de janeiro a outubro de 2023

Por Marília Monitchele e Thais Morimoto

Guardas Universitários da USP monitorando câmeras de segurança do campus por painel de controle [Foto: Nathalie Rodrigues/JC]

Foram 163 ocorrências de furtos, roubos e sequestros registradas de janeiro a outubro de 2023 no Campus do Butantã, de acordo com a Superintendência de Prevenção e Proteção Universitária (SPPU) da USP. O número supera a quantidade de ocorrências desse tipo nos últimos cinco anos, quando comparado aos mesmos períodos. “O aumento sempre preocupa”, afirma o professor e superintendente da SPPU, José Antonio Visintin. 

O estudante de Letras-Francês e estagiário da USP Pedro Seno quase teve sua bicicleta furtada em novembro de 2023 em frente ao prédio da Diretoria e da Administração da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH). “Colocava a bicicleta presa no poste em frente à sala onde trabalho, para conseguir ver durante o dia pela janela. Mas, teve um dia que fui almoçar e, na volta, percebi que o cadeado estava todo destruído”, conta o estudante. A bicicleta só não foi levada porque não conseguiram abrir o mecanismo de proteção. 

Casos como esse não são isolados. Visintin afirma que, na avaliação da SPPU, o aumento na quantidade de ocorrências foi resultado de furtos de bicicletas e de notebooks, mas que também é necessário tomar cuidado com os celulares. O órgão e a Polícia Comunitária afirmam estar trabalhando para diminuir ocorrências como essas, mas ressaltam a dificuldade em identificar os criminosos. 

A SPPU está organizando um sistema de divulgação para que a comunidade uspiana adote medidas como prestar atenção nos celulares, não deixar à vista pertences no interior de veículos – principal forma pela qual os notebooks são furtados atualmente – e instalar o aplicativo Campus USP.

O aplicativo permite registrar ocorrências que aconteceram dentro de algum campus da Universidade, fazer uma chamada de emergência para a Guarda Universitária e indicar situação de alerta. “No trajeto dentro da USP, você aciona o sistema e, se vir qualquer coisa suspeita, chacoalha o seu celular e automaticamente dispara dentro da Guarda Universitária, que, por GPS, vai ao seu encontro”, explica o professor. Ele recomenda o seu uso em períodos noturnos e sempre que o membro da comunidade uspiana se sentir ameaçado.

Polícia e câmeras

Entre 2016 e 2021, houve uma queda anual no número de ocorrências de roubos, furtos e sequestros na Cidade Universitária. Com a pandemia de covid-19, 2020 e 2021 foram anos com menor circulação de pessoas. Nos demais anos, segundo Visintin, a queda foi motivada principalmente pela presença da Polícia Militar no campus, que é composta, em sua maioria, por policiais comunitários. 

A Polícia Comunitária foi implantada em 2016 no campus e teve atuação conjunta da Comissão de Direitos Humanos da USP e do Departamento de Direitos Humanos da Polícia Militar. A maior parte do efetivo são policiais que fizeram graduação ou cursos universitários. 

Outro fator que colaborou para a queda de ocorrências no Campus do Butantã foi a implantação do sistema de monitoramento por câmeras, que começou em 2015. De acordo com Visintin, atualmente cerca de 80 a 85% do campus é coberto por câmeras.

Beatriz Hanser sente que não teve o suporte necessário após sofrer um furto. No segundo semestre de 2022, ao sair de uma aula no período noturno, a estudante de Relações Públicas encontrou seu carro com um dos vidros estilhaçados e sem a sua mochila do notebook. “Levei um susto, entrei em choque e chorei muito”, fala sobre o ocorrido. 

Beatriz notou que havia uma guarita de segurança sem ninguém e uma câmera próxima ao local de onde seu veículo estava estacionado, perto do prédio Central da Escola de Comunicações e Artes (ECA). Ela também sentiu que a Guarda Universitária fez “pouco caso” com sua situação e, por isso, a estudante não buscou mais auxílio. “Sabia que não ia dar em nada”, afirma. A SPPU defende que a informação é importante e que todas as ocorrências devem ser registradas para melhorar as condições estatísticas. Mas não fornecer as imagens das câmeras para o indivíduo, apenas para as autoridades competentes. Visintin também explica que a vigilância terceirizada é muito cara – segundo ele, um vigia USP custa cerca de 240 mil reais por ano, mas que geralmente toda unidade possui seguranças com vigias que fazem rondas. 

Além da Guarda Universitária, Beatriz e seus amigos procuraram a Polícia Comunitária, mas saíram frustrados. “Eles disseram que são os próprios alunos que furtam e que eles não podiam fazer nada, porque os alunos não gostam da polícia. Então, se o campus estava perigoso, era nossa culpa, porque eles não podiam encostar nos alunos”, afirma a estudante. Visintin também vê resistência em abordagens: “Quando a Polícia Comunitária suspeita de alguma coisa e aborda a pessoa, todo mundo faz escândalo”.

Segurança ou restrição? 

Além das câmeras e da polícia comunitária, outra medida de segurança adotada na USP são as grades e as catracas nos institutos. Para entrar em diversos prédios, é necessário se identificar, como na Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) e no Instituto de Ciências Biomédicas (ICB).

“O objetivo das catracas é controlar o acesso. Antes, os prédios ficavam muito vulneráveis e tivemos muitos problemas de indivíduos entrarem sem ser anunciados, inclusive com pequenos furtos”, afirma a assistente administrativa do ICB Ana Isabel Ferraz sobre as catracas em todos os prédios da unidade.

Para Visintin, esse controle de entradas é essencial na Universidade. “A USP é uma instituição pública de ensino, pesquisa e extensão. Aconteceu no passado: o professor está dando aula à noite e de repente entra bandido armado e rouba todo mundo na sala de aula. Como é que você estuda? Como é que você dá aula? Como é que você trabalha? Não tem condição. A USP é pública, mas tem um fim”, conclui. 

Ele também afirma que quase não há mais ocorrências na FEA desde que as catracas começaram a funcionar e defende que a implantação de um sistema eficiente de controle de entradas pode reduzir custos. 

Mas o ponto é controverso. A Faculdade de Direito, por exemplo, que fica no Centro de São Paulo, não possui catracas. A prefeita do campus da capital Raquel Rolnik é contra as catracas. “Entendo e respeito as demandas por segurança que temos na Universidade, entendo as unidades que têm colocado catracas. Mas eu acho que é possível progressivamente conquistar um espaço público aberto e seguro para todos e todas. Muro é a melhor forma que você tem de não resolver um conflito”, afirmou em entrevista para a edição passada do JC.