Decisão judicial prevê um terço de aumento para professores da USP

Cerca de três mil professores da USP, na ativa e aposentados, aguardam a Reitoria cumprir decisão da Justiça que os beneficia com aumento de 32,96% e um “bônus” de cerca de 35 mil reais. O valor corresponde à desvalorização dos salários ocorrida em 1987 e ao montante que deixou de ser pago nesse ano, quando a USP concedeu reajustes menores do que a inflação e descumpriu a lei do gatilho salarial.

O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu em 2001 que a USP deve recompor as perdas, após esgotados os recursos, mas o pagamento ainda não foi iniciado. Indefinições sobre a lista de professores com direito à recomposição e o que deve ser efetivamente pago empurraram para frente uma dívida que já tem 22 anos.

A Reitoria e a Associação dos Docentes da USP (Adusp) chegaram a um acordo sobre a lista em janeiro deste ano. No mês seguinte, a associação protocolou na 4ª Vara da Fazenda Pública um pedido para que o juiz determine o cumprimento imediato da decisão.

Kerr prevê que docentes também receberão 35 mil reais (foto: Daniel Garcia/Adusp)
Kerr prevê que docentes também receberão 35 mil reais (foto: Daniel Garcia/Adusp)

Segundo o professor Américo Kerr, representante da Adusp na comissão que acompanha o processo, a Reitoria diz que pagará a diferença devida durante o ano de 1987, o que em valores atuais signifi ca uma quantia de aproximadamente R$ 35 mil para um professor doutor. O custo total destes pagamentos, na estimativa de Kerr, gira em torno de R$ 120 milhões.

A Reitoria resiste em incorporar a defasagem de 32,96% aos atuais salários dos professores, segundo Kerr. A sentença, assinada pelo juiz Luciano Fernandes Galhanone, condena a USP a pagar o devido “com a incorporação das diferenças para reflexo nos vencimentos posteriores”. A Adusp pressiona pela efetivação do reajuste, que elevaria a remuneração de um professor doutor em regime de dedicação integral de R$ 6.325,31 para R$ 8.410,13.

Mas o ponto da sentença que deverá enfrentar maiores obstáculos é o pagamento da dívida acumulada no período entre 1988 e hoje. “O primeiro passo é recompor a defasagem daqui para frente, depois vemos o que fazer com os atrasados”, sinaliza Kerr.

Não há estimativa precisa sobre o tamanho dessa dívida. Kerr diz que a Reitoria chegou a divulgar um valor de aproximadamente R$ 20 bilhões, a partir de um cálculo definido pelo professor como “fictício”. Segundo ele, a Reitoria utilizou como referência o valor do salário de um professor titular aposentado, com qüinqüênios, sextas partes e diversas gratifi cações incluídas, “apesar de não chegar a setenta o número de docentes com esse padrão de remuneração na USP”.

Valores diversos

Um grupo de professores do campus de São Carlos já recebeu a indenização pelas perdas do gatilho. Eles entraram na Justiça em 1988, dois anos antes da ação da Adusp, e receberam os valores no início de 2006. As quantias são inferiores à previsão da Adusp para os 3.183 docentes que fi guram na lista de beneficiados, e não houve reajuste de salários.

O professor Pedro (nome fictício), que preferiu não se identifi car, diz que o grupo decidiu entrar na Justiça pois a Adusp não tocou no assunto naquela época e demorou para mover sua ação. “Imaginávamos que o resultado de todas [as ações] seria o mesmo”, diz.

Ele recebeu R$ 8 mil de indenização e afi rma que a Reitoria errou no cálculo, pois professores no mesmo nível da carreira chegaram a receber o dobro. Um professor que estava no último nível, segundo Pedro, recebeu R$ 84 mil. “A Adusp já reclamou varias vezes que houve erro de contas, e sei que a Reitoria errou na minha também. Mas meu pedido de revisão não foi aceito”, relata.

Pedro diz que haverá um mal-estar na academia se professores do mesmo nível e dedicação passarem a ganhar salários 30% diferentes. Ele sugere reverter o impacto do reajuste no orçamento em benefício de todos, mesmo que o aumento tenha uma porcentagem inferior.

O Jornal do Campus tentou ouvir a Reitoria durante cinco dias e, mesmo após enviar pedidos de informação por escrito, não obteve retorno.

O que é Gatilho Salarial?

O gatilho salarial foi um mecanismo criado na época de hiperinflação para os funcionários públicos fedetais e seguido pelo governo do Estado. Para evitar que o salário perdesse poder de compra, cada vez que a inflação chegasse a 20% um reajuste idêntico deveria ser aplicado. Na segunda metade de 1987 houve um jogo de empurra entre o governo Orestes Quércia e a USP sobre quem pagaria o gatilho.

Os reajustes vieram com atraso e em valores inferiores ao devido, impondo ao salário dos professores uma perda de um terço de seu valor.