Jovens que viveram como universitários no exterior dizem compreender melhor sua cultura. Trocar a faculdade no Brasil por uma conveniada em outro país durante alguns semestres não é apenas uma oportunidade de aprender outra língua e ampliar os estudos. Quem já viveu essa experiência aponta o contato com estudantes de vários países e a convivência com uma infra-estrutura urbana e social diferentes da brasileira como os fatores mais enriquecedores de um Intercâmbio.
Ronaldo Bitello, aluno de engenharia civil da Escola Politécnica (Poli), conta que morou em Lyon, na França, durante um ano e meio. “Lá conheci marroquinos, russos, italianos, chineses… e você percebe que um estrangeiro pode ser tão aberto quanto um brasileiro e um brasileiro pode ser tão fechado quanto um francês. São as pessoas que contam, não apenas a cultura”. Para a maioria dos jovens que fazem Intercâmbio, essa percepção dos indivíduos e da influência da nacionalidade sobre eles ajuda a criar uma imagem mais nítida de si mesmo. “Você passa a se conhecer melhor, e a ser um representante da sua cultura”, explica Ronaldo.
De fato, a maior parte dos brasileiros que retornam após um longo período de intercâmbio trazem para casa uma visão muito mais apaixonada do país. “Passamos a ouvir mais música brasileira, a comer mais feijoada e a querer conhecer todas as regiões do Brasil!”, lembra Rodrigo Camilo, aluno de engenharia elétrica da USP que passou dois anos e meio em Lyon. Mas não é apenas a curiosidade que se desperta. Encarar uma viagem internacional também ajuda a ver o Brasil com olhos mais realistas. Patrícia Orlando, também estudante da Poli, logo percebeu essa diferença: “Eu pensava na França como um país desenvolvido, sem desigualdades, utópico. E não é nada disso. O Brasil não é pior em nada, são apenas países diferentes”.
Preconceitos
Quem deixa o Brasil para morar na França logo imagina uma Torre Eiffel iluminada e pessoas bem-vestidas andando elegantemente pelas ruas – mas que não tomam banho. Quem vai à Austrália, pensa imediatamente nos surfistas e nos adoráveis cangurus. São muitos os estereótipos, e todo povo conhece seus clichês. Mas basta pisar fora do avião para perceber que nenhum país é tão homogêneo assim.
De acordo com Rodrigo, a idéia de França difundida no Brasil se resume a Paris. “Não imaginamos os outros países sendo tão multiculturais como o nosso, mas muitos deles o são! O norte da França não se assemelha em nada ao sul, e assim por diante”. Quem se limita a pensar no estereótipo francês ainda perde uma riqueza que vai muito além do comportamento cultural: a organização do espaço público. De acordo com os estudantes de engenharia que passaram por lá, a infra-estrutura urbana francesa tem muito a ensinar a cidades como São Paulo. “O pedestre tem mais espaço, o metrô tem uma cobertura excelente e as bicicletas fazem parte do cotidiano, o que reduz bastante a quantidade de carros em circulação”, comenta Ronaldo.
Mas os brasileiros não são os únicos a terem uma visão caricata dos outros países: Fátima Arroyo, espanhola que passou os últimos dois anos e meio na França e agora completa seus estudos na Poli, diz que as únicas imagens que tinha do país eram de dança, música, festa e muita desigualdade social. “Agora, vejo que o povo é muito receptivo e que os estrangeiros não ficam tão segregados como na Europa. Além disso, não tenho tanto medo de andar nas ruas quanto pensei que teria”. O medo a que Fátima se refere é conseqüência da fraca propaganda que o Brasil faz de si mesmo no exterior. Cyndie Carreiras, francesa filha de pais portugueses, conta que o filme Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, foi muito assistido na Europa e é uma das únicas referências que ela teve do país antes de conhecer São Paulo.
Anaïs Labigne, também francesa, estudou durante um semestre na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) e retornou ao seu país de origem. Decidiu cursar, enquanto estava aqui, aulas de capoeira, para ter contato com um esporte típico do Brasil. Assim como Fátima, ela elogia a receptividade dos brasileiros, e acredita que os franceses poderiam aprender a ser mais curiosos diante dos outros. Porém, enfatiza que a segurança e a educação são melhor resolvidos no seu país, e a mobilidade social é uma realidade muito mais tangível.
A experiência de estar do outro lado faz com que se repensem muitas noções já enraizadas, como a de identidade, nacionalidade, espaço e etnia. Quem escolhe conhecer um novo país, percebe que as semelhanças espantam tanto quanto as diferenças, e se vê freqüentemente questionando o valor que se dá às distâncias geográficas. No final das contas, dúvidas como essa fazem valer o alto preço que tem uma viagem de Intercâmbio, pois são lições que sala de aula nenhuma poderá ensinar.