Repercussão de gripe suína é criticada

Para especialista impacto da gripe suína deve ser muito menor do que o previsto inicialmente, apesar de vírus merecer maior atenção

A gripe suína possui uma taxa de mortalidade baixa e não deve causar muitos óbitos no seu atual estágio. É essa a opinião de especialistas no estudo de vírus, que criticam o modo com o tema foi debatido e levado para a população.

“O impacto desse vírus foi inflacionado pela imprensa” atesta Paolo Marinho de Andrade Zanotto, professor do Instituto de Ciência Biomédicas (ICB) que pesquisa a evolução de vírus. “A imprensa escolhe o que dá ênfase e cria ondas de quase histeria com interesse claro em vender jornal”, aponta, defendendo que no início do surto da gripe suína não havia informação suficiente para atestar sua força.

A situação melhorou conforme foi possível analisar o vírus e estabelecer sua taxa de mortalidade, prossegue Zanotto. Inicialmente 149 mortes no México foram ligadas à doença, mas só cerca de 5% acabaram confirmadas, enquanto nos Estados Unidos a letalidade ficou baixa. Para ele, a gripe suína “não é muito mais problemática do que várias das doenças que estão circulando normalmente”. Males como febre hemorrágica e vírus respiratório matam muito mais por ano e não são tão debatidos, explica o professor.

Pesquisador do ICB e autor do blog Rainha Vermelha, Atila Iamarino, apresenta ainda outro problema. Pessoas sem sintomas da doença têm usado antivirais como forma de prevenção. Além de não evitar o contágio, isso facilita o aparecimento de um vírus resistente à medicação, tornando os remédios menos eficientes quando necessário.

Iamarino também defende que a doença não é tão grave quanto aparentava. Cita estudos que estimam que a gripe esteja entre os humanos desde setembro do ano passado, mas isso não foi notado até recentemente, “sinal de que ela causa uma gripe normal em quem pega”, defende.

“Aparentemente a gripe suína não é pior do que uma gripe normal”, concorda Carlos Hotta, biólogo e pesquisador do Instituto de Química da USP, autor do blog de ciência “Brontossauros no meu jardim”. Embora ressalte que pela definição da Organização Mundial de Saúde a gripe já possa ser considerada uma pandemia, isso “não quer dizer nada sobre quantas pessoas vão morrer”, apenas que ela está espalhada no globo.

Tania do Socorro Souza Chaves, médica do Centro de Imunização do Hospital das Clínicas, aponta que o principal problema da gripe é seu potencial de disseminação, pois nenhuma pessoa tem imunidade contra ela. Outra questão “é que não sabemos quanto ela vai se sustentar com esse caráter mais brando”. Hoje é mortal apenas para as pessoas com saúde já comprometida, como diabéticos, idosos e bebês.

Hotta ressalta ainda que diversas pandemias começaram com um surto no início da primavera do hemisfério norte, enfraqueceram em seguida e voltaram com força no outono, fenômeno que poderia ocorrer com a gripe suína, mas ressalta que é difícil saber quais mutações vão ocorrer. “É sempre difícil prever para onde vai um vírus, pois assim como pode ficar mais forte, pode ficar mais fraco”.

Já Zanotto defende que a ênfase não seja dada apenas na gripe suína, pois o processo poderia acontecer com outros tipos da doença. “Ela (gripe suina) é muito menos problemática que a gripe aviária”, exemplifica. Essa última apresenta uma alta taxa de mortalidade, que pode chegar a 60%, mas sua transmissão entre uma pessoa e outra é mais difícil, o que dificulta a disseminação.

O aparecimento de uma doença em humanos com origem em porcos é debatido em artigos acadêmicos desde 2005 pela revista “Science”. A gripe suína confirma a hipótese, já que “a combinação de genes é inédita”, ressalta Iamarino.

Ele ressalta estudos que estão sendo feitos por um grupo liderado por pesquisadores da Universidade de Oxford, na Inglaterra. A partir da análise do perfil dos genes, concluiu-se que a gripe surgiu a partir da mistura de outros três vírus de gripe comuns nos porcos. Um destes vírus, por sua vez, já é uma mistura entre vírus comuns em aves e outro normalmente encontrado em pessoas, mas já consolidado entre os suínos há 20 anos.

A mistura entre vírus só é possível devido a um mecanismo chamado rearranjo, que mistura segmentos dos genes. Ele é favorecido pelo modo de criação dos porcos, com alta quantidade de animais em um pequeno espaço, o que facilita o rearranjo. Más condições higiênicas ajudam ainda mais que novos vírus surjam. Por isso a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, na sigla em inglês) vêm investigando fazendas mexicanas de criação nas quais podem ter surgido a doença.

Imagem de microscopia eletrônica mostra momento em que vírus influenza comum sai de célula infectada (foto: Reprodução)
Imagem de microscopia eletrônica mostra momento em que vírus influenza comum sai de célula infectada (foto: Reprodução)