Aumento da passagem de ônibus em São Paulo desenterra projeto de Tarifa Zero

Lembrando plano de 1990, especialistas afirmam que se o transporte fosse inteiramente subsidiado, a economia da cidade seria aquecida

O aumento da tarifa de ônibus de 2,70 para 3,00 – 11% – em São Paulo, desde o dia 5 de janeiro, gerou insatisfação entre paulistanos. Jovens da cidade reivindicam pela redução imediata da tarifa com manifestações que tiveram inicio no dia 17 de janeiro. A exigência perpassa questões como o maior subsídio às empresas de ônibus e a possibilidade de Tarifa Zero. “Se o transporte fosse inteiramente subsidiado, o sistema econômico da cidade não entraria em colapso”, diz Klara Kaiser, professora de Planejamento da FAU-USP.

Estudantes da FFLCH param ônibus para negociar passe livre até local de manifestação (foto: Mariana Queen)
Estudantes da FFLCH param ônibus para negociar passe livre até local de manifestação (foto: Mariana Queen)

Tarifa Zero

A proposta da chamada Tarifa Zero ocorreu em 1990, durante a gestão de Luiza Erundina (1989-1992) na prefeitura de São Paulo. “A ideia era fazer no transporte o mesmo que se faz com outros serviços: pagar indiretamente e não no momento em que se usa”, conta Lúcio Gregori, ex-secretário de transporte da gestão Erundina e idealizador da medida. Uma reforma tributária e um Fundo Municipal de Transporte seriam os pilares responsáveis por garantir o financiamento das viagens gratuitas. Segundo Gregori, a prefeitura não tinha verba para subsidiar totalmente o transporte na cidade. “Isso justificava a necessidade da criação do Fundo, que seria alimentado por taxas cobradas de empresas em geral”, explica. Na época, a Câmara votou contra o projeto.

Lembrando da ideia dos anos 90, Klara Kaiser afirma que o total subsídio da tarifa movimentaria outros setores da economia na cidade. “O fato da população viajar mais (para trabalho, lazer, estudo) significaria um aumento para a economia”. Seguindo o raciocínio, a antiga prefeita da cidade, Marta Suplicy, diz que a atual gestão precisa atrair mais usuários para o transporte coletivo da cidade. “Só isso garantirá uma maior arrecadação sem a necessidade de reajustes exorbitantes”, afirma.

Expectativas

Apesar das expectativas com relação à Tarifa Zero, especialistas ressalvam que o subsídio não é tudo. Para eles, de graça ou não, nenhuma oferta de ônibus evitaria o colapso do sistema de transporte público, caso não ocorra o aumento maciço de investimentos para trens e metrôs – os chamados transportes de massa. Tácito da Silveira, mestre em Planejamento pela FAU e professor de Planejamento Urbano da Unip, afirma que São Paulo tem hoje a rede de metrô que era prevista para 1986. Segundo o professor, a integração entre ônibus e metrôs pode ser vista como parte de um subsídio positivo. “Mas, mesmo assim, superlotou o sistema de transporte subterrâneo. É preciso considerar que novas propostas vistas como melhorias, por vezes, geram sufocos”, completa.

Subsídio, reajuste e renda

Atualmente, com o aumento da tarifa, a prefeitura prevê um subsídio mensal de R$ 743 milhões para as empresas de ônibus. São R$ 83 milhões a mais do que o valor de 2010 (660 milhões). As estimativas se baseiam nos dados da planilha orçamentária da prefeitura. Entretanto, vereadores do PT na Câmara Municipal alegaram contradições nesses valores. A análise da planilha orçamentária de 2011 elaborada por eles mostra que, considerando os números da prefeitura, o valor do subsídio mensal seria, na realidade, R$ 410 milhões – R$ 333 a menos do que o orçado. Para os que reclamam, o subsídio maior do que o necessário afirma a exorbitância do valor das passagens. Outro contraste analisado na planilha é o valor do diesel em 2011: R$1,85, segundo a prefeitura, frente a R$ 1,70 pelo que informa a Petrobrás. “A estimativa é de que se na planilha da prefeitura o litro diesel custasse R$ 1,70, ao invés de R$1,85, a tarifa de ônibus estaria R$ 0,10 centavos mais barata do que o preço do reajuste”, afirma o vereador do PT, Antônio Donato.

Hoje, o gasto com transporte de um paulistano que faz duas viagens de ônibus por dia na cidade, desconsiderando os estudantes, é de R$ 180 mensais – equivalente a 21% da maior faixa do salário mínimo do estado de São Paulo (R$ 640).