Pedestres são foco de nova campanha da CET

Órgão aumenta fiscalização sobre a lei que protege pedestres, colocando em xeque a cultura do desrespeito às normas de trânsito

Quem anda pelas ruas de São Paulo logo nota a presença de agentes de trânsito nos principais cruzamentos da cidade. Eles fazem parte do Programa de Proteção ao Pedestre, inaugurado em maio pela Prefeitura, com o objetivo de reduzir em 50% o número de atropelamentos e as mortes de pedestres até 2012.

Por enquanto, o programa está restrito à Zona Máxima de Proteção ao Pedestre (ZMPP), entre o centro expandido da capital, a Av. Paulista e os arredores de dez estações de metrô e dois dos principais corredores de ônibus. Desde o início do programa, a ZMPP conta com orientadores – vestidos de amarelo e empunhando bandeiras – para auxiliar a travessia de pedestres.

No último dia 8 de agosto, a campanha entrou em nova etapa, com 154 marronzinhos e 36 policiais da CPTran (Comando de Policiamento de Trânsito), treinados pela CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) para multar quem desrespeitar a lei. Fiscais da SPTrans também estão no programa para registrar infrações de motoristas de ônibus.

Lei antiga, punição nova

Os artigos que asseguram a proteção ao pedestre estão no Código de Trânsito Brasileiro desde 1997. Há alguns anos, cidades como Brasília e Porto Alegre organizaram campanhas semelhantes à de São Paulo, que melhoraram o comportamento das pessoas no trânsito. Porém, na maior capital brasileira, a “vista grossa” das autoridades tornou comum o desrespeito à faixa, tanto por parte dos motoristas como dos pedestres.

É um quadro que pode mudar: segundo a CET, mais de cinco mil multas foram aplicadas desde o início do aperto da fiscalização. Dependendo da infração, o motorista pode pagar R$ 191,53 e perder sete pontos na carteira. Por enquanto, o medo de ser multado parece ser o motivo da atenção redobrada dos condutores. “A nossa presença aqui já melhora os motoristas. Como estamos aqui, eles respeitam”, diz Marcelo Rodrigues*, fiscal na região da Av. Paulista.

Os motoristas concordam que a presença dos agentes de trânsito intimida. “Quando a gente vê marronzinho, logo para”, conta Diego Mendes*, que trabalha em um prédio no cruzamento da Paulista com a Av. Brigadeiro Luís Antônio, local onde atropelamentos são frequentes. “E se um pedestre fizer sinal com a mão, vou achar que ele está dando tchau”, ironiza sobre a recomendação da CET para pedestres que queiram atravessar.

Para Silvio Macedo, professor da FAU-USP, o aumento na quantidade de multas pode ser uma forma de começar a educar a população, mas não é suficiente. “É um processo contínuo, de mostrar quais são os direitos e os deveres dos motoristas e dos pedestres. Não adianta fazer a campanha e, seis meses depois, parar de multar. É uma questão de procedimento, ética e controle social”, afirma.

Apesar de intensificada, a fiscalização ainda não é ideal. Os marronzinhos da CET não estão presentes nos pontos da ZMPP o tempo todo. Na região do metrô Vila Madalena, por exemplo, “aparecem às vezes”, afirma Luiz Andrade*, agente que orienta a travessia dos pedestres, mas não é autorizado a multar. Indagado sobre o número de carros que ignora o sinal dos agentes, Luiz calcula: “Só hoje, uns 50”.

Pedestres também erram

Mesmo com o grande número de motoristas que ainda desrespeitam a sinalização para travessia, a maioria dos fiscais acredita que quem está a pé é mais irresponsável. “Eles atravessam distraídos, no sinal vermelho, no celular, lendo”, comenta Fernando Oliveira*, fiscal da SPTrans.

A Campanha em Números (infográfico: Ana Carolina Marques)
A Campanha em Números (infográfico: Ana Carolina Marques)

Como não foi regulamentada, poucas pessoas conhecem a lei do Código de Trânsito Brasileiro que prevê multas aos pedestres que cometem infrações, como desobedecer os semáforos fechados ou atravessar fora da faixa. “O pedestre também tem que respeitar o tempo dele. A multa se mostra lógica [para os motoristas], mas também tem que haver uma campanha para o pedestre se conscientizar”, diz Macedo.

Dos 300 cruzamentos que compreendem a ZMPP, 115 possuem tempo específico para os pedestres. Mas alguns transeuntes não esperam o sinal abrir para passar – e muitos se arriscam fora da faixa. “Na pressa, as pessoas atravessam em qualquer lugar”, diz Daiana Lopes*, que anda com frequência pela Av. Paulista. A pedestre afirma que faz sinal com a mão quando quer atravessar – e é uma das poucas. Segundo a CET, apenas 0,3% dos pedestres usa o gesto, que não é obrigatório, mas recomendado.

Representantes do Movimento Pedestre Primeiro foram procurados pelo JC para comentar o assunto, mas não responderam até o fechamento desta edição.

Questão cultural

Motoristas e pedestres ainda estranham o respeito à travessia, o que mostra que a campanha não é apenas uma questão de multas e reforço na sinalização. O professor Silvio Macedo acredita que também há um aspecto cultural que interfere no comportamento dos cidadãos. “As pessoas não estão acostumadas ao respeito público”, analisa. Mesmo assim, Macedo acredita na eficácia da campanha. “Pode disciplinar o uso da rua, alterar o comportamento e ampliar a cidadania”.

Leia a entrevista com a professora de sociologia Fraya Frehse, que comenta o comportamento de motoristas e pedestres no trânsito.

*Os nomes utilizados são fictícios para preservar a identidade das fontes que não quiseram se identificar.