Dados da PM sobre queda na criminalidade são inconclusivos

De acordo com um pronunciamento do governador Geraldo Alckmin e com base em dados da Polícia Militar, o Estado de S. Paulo e o portal R7 noticiaram, no final de outubro, que os crimes dentro da USP teriam caído em até 92% com a entrada efetiva da Polícia Militar no Campus, logo após a morte do estudante Felipe Paiva na FEA, em maio. No entanto, a constatação causou dúvidas em parte da comunidade acadêmica acerca da efetividade da ação da PM em tão curto espaço de tempo.

A estatística foi feita pela PM e leva em conta os 80 dias anteriores à morte de Felipe e os 80 dias posteriores (descontando julho), já que a presença da polícia aumentou logo após o latrocínio do estudante. A pesquisa se baseia em dados levantados a partir de Boletins de Ocorrência (B.O.s) registrados em delegacias próximas à USP que tem a Cidade Universitária como local do crime. Dentre as categorias de infrações e crimes, no entanto, apenas duas atingiram diminuição de 90% ou mais dentro do período citado: o furto de automóveis (que caiu de 20 para dois) e o roubo de automóveis (de 13 casos, caiu para um).

A professora do de Estatística do IME, Gisela Tunes, ao analisar os dados, disse que é precipitado afirmar que a queda deve-se à presença da PM no Campus, sem análise concomitante das oscilações das infrações em anos anteriores. “Em geral, quanto mais detalhado mês a mês, e ano a ano, melhor seriam as conclusões. Caiu a criminalidade? Caiu, é um fato. Mas por que, isso não dá para afirmar. Quanto mais dados, mais detalhamento, melhor. A PM deveria fornecer as estatísticas do mesmo período [de 1º de março a 20 de setembro, excetuando-se julho] dos anos anteriores”.

Outros dados

A Guarda Universitária (G.U.), responsável pela segurança do Campus, também possui suas próprias estatísticas, independente da PM. Os números da G.U. estão disponíveis no site da instituição e são “baseados em ocorrências produzidas a partir de chamados e atendimentos da COC (Central de Ocorrências do Campus)”, diz Ronaldo Pena, diretor de Operações e Vigilância da Prefeitura. As categorias de crimes adotadas pela Guarda para classificação das ocorrências não são as mesmas das usadas pela PM, o que impede uma comparação equivalente de dados.

As estatísticas liberadas pela G.U. vão de 2007 a 2011, considerando os meses de janeiro a setembro. A evolução dos crimes durante os meses de anos anteriores, desde 2007, reflete uma tendência de estabilidade ou equilíbrio dos números (houve, por exemplo, sete tentativas de roubo em 2007, e em 2011, o número é de seis). O Capitão Massera, da Polícia Militar, explica essa tendência: “Por que os casos de furto não caíram? Porque eles acontecem geralmente dentro das faculdades, dos estabelecimentos, centros acadêmicos […]. Nesse caso, a polícia não tem como impedir. Ela não entra nas unidades, faz a segurança pública, externa”, afirma.

Ao mesmo tempo, há crimes que diminuíram de incidência com o tempo, como o furto de automóveis, que em 2007 ficou em 83 ocorrências e no atual ano caiu para 26. O furto simples, por outro lado, aumentou ano a ano: foi de 22 casos em 2007 para 39 em 2011.

Dados de infrações na Cidade Universitária (arte: Bruno Federowski)
A professora Gisela comenta que as infrações, segundo dados da G.U., oscilam ao longo do ano, o que pode indicar certa sazonalidade em relação à criminalidade na USP. “Podemos observar essas variações. Nota-se sim uma queda mais acentuada em 2011, mas não é possível concluir se isso se deve à entrada da PM ou não. Pode ter sido a PM, a mídia, uma série de fatores”, diz. “Essa queda de agora pode estar relacionada à questão da PM, porém seria interessante analisar daqui a um tempo, a longo prazo, para ser mais coerente”, ressalta.

Apesar de reconhecer a necessidade de comparação com anos anteriores, o capitão Massera faz uma ressalva: “Talvez não possamos adotar como referencial os anos anteriores com esse período atual, mesmo tendo certeza de que reduziu bastante, porque 2011 foi um ano atípico em seu início. Os crimes explodiram, foi algo muito preocupante, que culminou com a morte do Felipe. O ideal seria comparar também o começo desse ano com os inícios dos anos anteriores”, disse.

Segundo o capitão, a polícia, no entanto, admite que vários crimes respeitam uma certa sazonalidade. “É um fenômeno difícil de avaliar, mas polícia tem esse cuidado, de reconhecer a sazonalidade e analisar quando há discrepância, como no início deste ano. Isso indica que você tem que tomar uma providência diferente, que foi o que foi feito. Mas esse trabalho é feito mensalmente, são as reuniões de análise crítica, com base nessas estatísticas. Dessas reuniões, sai o roteiro de radiopatrulha. Esse monitoramento é feio de maneira constante”, afirma.

A Polícia Militar se comprometeu a fornecer ao JC os dados dos anos anteriores para comparação. Em breve, a matéria completa aqui no site.