Atletas e motoristas disputam as ruas da USP

Prefeitura do Campus restringe localização das assessorias esportivas à Avenida da Raia, mas segue sem solucionar questões de segurança do trânsito

Em comunicado oficial divulgado no dia 9 de março, a Prefeitura do Campus anunciou que as assessorias esportivas presentes na USP poderiam acomodar-se apenas ao longo da Av. Prof. Mello Moraes, também conhecida como Avenida da Raia.

Assinada pelo prefeito José Sidnei Colombo Martini e de caráter imediato, a medida se dá, segundo a nota, “em virtude de mutirões de manutenção e varrição nas ruas, avenidas e bolsões de estacionamento da Cidade Universitária”. Ela ressalta ainda que a norma é provisória, com validade “até a publicação de novas regras de uso do Campus para a prática esportiva”, prometidas para estarem prontas até o fim do semestre.

A nova norma surpreendeu as assessorias, responsáveis por orientar centenas de atletas. “Eu mesmo não sabia do comunicado”, diz Ricardo Arap, da Race Consultoria Esportiva, que há 14 anos atende seus alunos na Raia. “Talvez por eu já estar na avenida eu não tenha sido avisado”, cogitou o professor. Até o fechamento desta edição, a Prefeitura não respondeu aos telefonemas e emails do JC, que solicitavam informações sobre a eficácia da regra e as consequências do seu descumprimento.

Focando apenas na localização das assessorias, o novo código deixa de
lado a segurança dos corredores e ciclistas, por lazer ou transporte, que trafegam todos os dias pelo campus. Dentre os esportistas, a maior parte vê na USP um cenário ideal para a prática esportiva por sua variedade topográfica e paisagem agradável. “O trânsito aqui é bem tranqüilo”, adiciona Midori Takehara, há seis meses pedalando na Universidade.

Foto: Luiza Guerra
Corredores se arriscam e prejudicam motoristas

A relação entre os esportistas e motoristas de ônibus, carros e motos, com quem dividem as ruas do campus, não é, no entanto, das mais harmoniosas. Condutores reclamam que os atletas ocupam a rua e dificultam o fluxo dos automóveis. “No fim de semana não é tão ruim, mas durante a semana eles prejudicam o trânsito”, se queixa Paulo Pereira, cobrador de ônibus. “O Campus não é um parque”, declara, ressaltando que ciclistas e corredores comumente abusam do status preferencial para tomar espaço exagerado na via.

A situação fica ainda mais evidente com a desordem que se instaura quando carros e ônibus andam em um sentido, corredores vêm no oposto, e os ciclistas dividem -se entre os dois, algo que pode ser observado diariamente. “Isso aqui é uma bagunça. Os corredores andam pelos dois lados da rua e o motorista fica sem saber o que fazer”, objeta Pereira.

No caso da bicicleta, parece haver unanimidade: “Ela é um veículo como qualquer outro, tem que estar sujeita às leis de trânsito”, garante Wilse Francisco, assessor esportivo e há nove anos atendendo na USP.

De acordo com o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), que classifica as
bicicletas como “veículos de propulsão humana”, o correto é que os ciclistas andem no sentido da via, e, salvo exceções, permaneçam à direita. “Andar na contramão é não apenas completamente errado, mas extremamente perigoso”, salienta Francisco, destacando que a origem do risco vêm das altas velocidades em direções opostas.

É assim, andando pela direita, e “lento como uma tartaruga”, que o professor da FAU Alexandre Delijaicov vem para o campus todos os dias sobre as duas rodas. Apesar de nunca ter se envolvido em acidentes sérios, Delijaicov ressalta que alguns lugares da Universidade são perigosíssimos. Para o professor, as rotatórias figuram no topo da lista. Sobretudo próximo à Portaria 1, o obstáculo confunde os ciclistas e aumenta a chance de colisão com veículos que o deixam ou acessam.

Luiz Zancaner, que pedala na USP há 3 anos, concorda com o professor, e adiciona: “As pessoas têm que aprender que a bicicleta não pode competir com o carro”. Para Zancaner, a popularização das bikes vem gerando um perigoso enfrentamento entre seus condutores e os motoristas, que muitas vezes, apesar de errados, não cedem. “O carro é como uma armadura”, afirma o docente, veemente defensor das bicis.

Entre os corredores, a situação também é complicada. O lugar mais
adequado para a caminhada e corrida em uma via com trânsito de automóveis é a calçada, mas por muitas vezes apresentar irregularidades e buracos, a maior parte dos praticantes adota a rua como pista. Vários seguem pela contramão do leito carroçável, alegando ser mais seguro. Para os corredores Paulo Aligieri e Silvio Severini, andar no sentido oposto permite detectar possíveis ameaças. “Se eu vir qualquer ameaça, é só desviar”, explica Severini.

Apesar da incômoda partilha das ruas, eles não planejam parar. Para Zancaner e Aligieri, além da falta de outros espaços para a prática, os parques da região ficam cheios demais, o que, apesar dos riscos, continua os levando à USP. “Andar na rua é perigoso, mas infelizmente nos faltam opções”, afirma Zancaner.