Para professor da Poli, a situação da Cantareira é mais grave do que anunciada

O Sistema Cantareira apresentou, no mês de abril de 2014, vazão equivalente a 31% de sua capacidade, sendo que, no ano anterior, o valor, na mesma época era de 71%. O mês de maio já indica uma média menor ainda. São 16% comparados com 58% de 2013, segundo dados do Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE). A baixa pode ser justificada pela ausência de chuvas no verão. Janeiro deste ano foi o mês mais quente e seco dos últimos 71, desde que iniciaram as medições no Mirante Santana (SP), segundo dados do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia).

Segundo o professor Augusto Pereira Filho do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP, para novembro e dezembro, havia um prognóstico de que as chuvas seriam em quantidade normal no Sudeste. Entretanto, no último mês de 2013, as precipitações provenientes da Amazônia se concentraram entre o Rio de Janeiro e o Espírito Santo, causando um déficit em São Paulo. Além disso, o sistema de pressão do Alto do Atlântico Sul ficou maior e mais intenso, o que estendeu a seca do Nordeste para o Sudeste e Sul, justamente no período que deveria ser de chuvas. Houve, segundo a fonte, uma redução de 50% das chuvas previstas para a região.

Por outro lado, nos últimos três anos, os invernos têm sido mais secos e mais frios. Com o verão super quente, os reservatórios evaporaram com mais intensidade e, somado ao aumento do consumo, resultou na crise atual. Para Augusto Pereira, a situação não está relacionada com o Aquecimento Global.

Escassez já atinge áreas da Região Metropolitana de SP. Segundo Rubem La Laina Porto não era possível prever a crise (Foto: Fernanda Drumond)

Em início de outubro, o Sistema estava com 40% de sua capacidade, situação considerada normal segundo os estudos de avaliação de risco. De acordo com o professor e Engenheiro Hidráulico Rubem La Laina Porto, da Escola Politécnica (Poli) da USP, em seis meses, o déficit da atual seca, em relação às vazões medias afluentes ao Sistema Cantareira, foi de 400 milhões de metros cúbicos, o que corresponde a cerca de 40% da capacidade do sistema. “O estágio dos nossos conhecimentos de hidrometeorologia não permitem fazer previsões com garantias razoáveis para tal horizonte de tempo (6 meses)”.

O Sistema Cantareira compreende os reservatórios Jaguari/ Jacareí, Cachoeira, Atibainha e Paiva Castro e é considerado o maior sistema de tratamento de água da América Latina. Funciona desde 1982 e,nesse ano, apresentou os menores índices desde sua inauguração. O volume útil atingiu 8,5% de sua capacidade total, o que equivale a 83,73hm³ (medição feita em 13 de maio). Em 31 de março, o complexo apresentava volume de 131,61hm³, 13,4%, é visível, portanto, uma queda de quase 5% do volume útil em apenas treze dias.

A vazão afluente atual aos reservatórios de Jaguari-Jacareí, Cachoeira e Atibainha (Sistema Equivalente – SE) corresponde a 1,47 m³/s, o que equivale a 4% da média histórica do mês e a 8% da mínima histórica. Enquanto isto, o volume útil dos reservatórios que compõe o SE possui 79,77 hm³, o que equivale a 8,2% do volume útil total..

Para Rubem Porto, a situação é mais grave do que o anunciado, porém, não existiam razões para a Sabesp iniciar o programa com 2 ou 3 meses de antecedência, quando o SC estava próximo da situação normal. Mesmo assim, se isso acontecesse, estaríamos hoje com cerca de 3% a 4% de armazenamento a mais do que temos hoje. “Um pouco melhor, é verdade, mas a situação seria crítica da mesma forma”.

Para salvar a Cantareira

O engenheiro afirma que o sistema se recuperará. Entretanto, o tempo depende da gestão da demanda, ou seja, redução de consumo. Esse aspecto envolve aspectos administrativos, políticos, culturais e tecnológicos. Em razão destes pontos, os programas de gestão de demanda somente podem ser concretizados a médio e longo prazos. Medidas severas de redução de consumo devem prosseguir durante o ano de 2015 e provavelmente de 2016.

Todavia, é impossível prever o comportamento dos rios que abastecem o sistema nos próximos anos. Contudo, duas medidas importantes estão sendo tomadas pelo governo: importação de água da bacia do Rio Paraíba do Sul para reforçar a Cantareira e a construção de duas barragens na bacia do Rio Piracicaba para atender as necessidades desta região e economizar água desses reservatórios. A conclusão destas obras estão previstas para 2016 e 2018 respectivamente.

O desvio de água de outras bacias é uma alternativa viável e inevitável. A Região Metropolitana de São Paulo situa-se em área de cabeceiras dos rios onde as bacias hidrográficas são pequenas e insuficientes para atender as demandas. Grande parte das águas da região estão poluídas, em tal nível que inviabiliza o tratamento para fins de abastecimento. O Plano Diretor de Aproveitamento de Recursos Hídricos da Macrometropole Paulista (2014) relaciona 8 arranjos alternativos para abastecimento da região e todos eles incluem reversões de outras bacias.

Rubem Porto conclui afirmando que a crise já está instalada e é preciso tomar medidas de emergência para administrá-la. “No momento o que nos resta é prorrogar a vida do Sistema Cantareira até a próxima estação chuvosa, que se inicia normalmente em outubro/novembro. As medidas citadas são usuais e fazem parte do cardápio de todos os países do mundo, para enfrentar situações semelhantes”.

Evolução do volume no Sistema Cantareira. (Infográfico: Daniel Morbi)