Nem Temer, nem Dilma: o brasileiro continua dividido

Com a proximidade da conclusão do Impeachment , cresce insatisfação com o governo federal
Dados divergentes divulgados pela Folha de S. Paulo interferiram na interpretação do público. Arte: Giovanna Wolf.
Dados divergentes divulgados pela Folha de S. Paulo interferiram na interpretação do público. Arte: Giovanna Wolf.

Desde maio desse ano, o Brasil é governado pelo presidente interino, Michel Temer (PMDB), devido ao processo de Impeachment contra a presidente eleita Dilma Rousseff. Porém, por mais que o impedimento tenha sido pedido por milhões de brasileiros nas ruas, liderando as pesquisas de opinião, e tenha sido votado por deputados eleitos democraticamente, o resultado desse processo não parece agradar a maioria.

A última pesquisa de um dos principais órgãos de pesquisa do país, o Datafolha, indicou que apenas 14% da população avalia positivamente o governo de Temer, aproximadamente a mesma quantidade de pessoas que aprovava o governo de Dilma um mês antes de seu afastamento. Ainda assim, 58% das pessoas apoiam o afastamento definitivo da presidente eleita.

O descontentamento com o presidente interino pode-se perceber pelas manifestações nos ginásios esportivos durante os jogos das olimpíadas do Rio de Janeiro. Durante o seu discurso de abertura, Michel Temer foi vaiado pelo público e fez uma fala rápida e curta com apenas 10 segundos de duração. Além disso, torcedores com cartazes “Fora Temer” foram vistos em diversas arenas e ganharam repercusão após serem reprimidos pelas forças de segurança dos jogos. Alguns manifestantes foram expulsos e outros convidados a cessar suas manifestações. A repressão teve fim com a liminar do um juíz federal, João Augusto Carneiro, por defesa da liberdade de expressão e manifestação. O Comitê Olímpico Internacional alegou que proibiu protestos políticos conforme a lei nº 13.284 que coíbe manifestações de cunho ofensivo ou preconceituoso nos jogos olímpicos, e deve recorrer na justiça.

A professora Maria Hermínia Tavares Fonseca, professora do Instituto de Relações Internacionais e do Departamento de Ciências Políticas da USP, especializada em opinião pública e política brasileira, explica as manifestações e a desaprovação do governo Temer. “O país está dividido com relação ao impeachment. Os dados da própria pesquisa [Datafolha] mostram que 49% acreditam que o impeachment é legal e 37% pensam que se está cometendo uma ilegalidade. Apenas uma minoria tem confiança e apoia o governo interino. Nestas condições, protestos são mais do que esperados. Aliás, eles se tornaram lugar comum desde antes da Copa do Mundo, quando a presidente Dilma recebeu vaias bem mais estrondosas do que as de Temer.”

Novas eleições?

Uma alternativa possível para a desaprovação do governo interino e para o anseio pelo afastamento de Dilma Rousseff parece ser a convocação por novas eleições. Segundo o Datafolha de julho, 62% das pessoas defendem essa possibilidade.

Esse resultado, contudo, foi omitido na divulgação da pesquisa pela Folha de S.Paulo. A manchete e o texto indicavam somente 3% de apoiadores de novas eleições, referindo-se às porcentagens de uma pergunta da mesma pesquisa que não previa “novas eleições” como opção para resposta imediata. Após releitura dos dados, o veículo se corrigiu, alegando ter feito leitura equivocada das respostas na pesquisa.

Em abril, o apoio a novas eleições já se mostrava presente, quando 58% das pessoas desejavam o impeachment de Dilma e de Temer, e, caso isso ocorresse, 79% seriam favoráveis à convocação de novas eleições.

Ao Jornal do Campus, o estudante paulistano de 18 anos Rafael Siqueira Alves se manifestou favorável a uma nova eleição presidencial como a melhor solução para o país, mesmo classificando o impeachment como um golpe. “Não acredito que Michel Temer manterá um governo benéfico para os brasileiros (afinal, ninguém votou nele por suas ideias ou propostas), porém Dilma terá ainda mais dificuldade para governar se voltar, por conta da pressão popular e desgaste de sua imagem pública, ela já não possui a mesma influência política para negociar com o congresso”. Opinião parecida tem o carioca Lucas Mandarino, de 24 anos, estudante de administração, que acredita no impeachment como recurso legal contra Dilma, mas também apoia eleições gerais. Ele justifica sua opinião pois considera ruins as opções de sucessão à presidência caso ocorra o impeachment. Para ele, “a linha sucessória de Dilma é um desastre. Temer, Renan, e até pouco tempo atrás, Cunha dispensam comentários em relação a sua idoneidade. E sobre quem se alia a eles também não podemos dizer melhores coisas”.

Mesmo com grande apelo do público, a convocação de novas eleições não está na previsão dos especialistas. A profa. Maria Hermínia diz que “a opção por novas eleições não está de fato posta, a não ser como hipótese. Para que ela ocorresse, Dilma e Temer teriam que renunciar, caso o impeachment fracasse – o que é pouco provável, ou Temer teria que renunciar ou ser submetido a impeachment, o que parece ainda menos provável.”

Impeachment é definitivo?

Na última semana, o processo de impeachment contra a presidente eleita avançou mais uma etapa. O Senado aprovou, por 59 votos a 21, que Dilma Rousseff seja levada a julgamento na casa, como apontado pela Comissão Especial do Impeachment em maio desse ano, após ser aprovado na Câmara em abril por 367 votos contra 137.  

Dilma é acusada de pedaladas fiscais e de fazer decretos orçamentários ilegais em seu mandato, mas sua governabilidade já estava baixa antes dessas denúncias e do início do processo de Impeachment. Com inflação alta, recessão e denúncias de corrupção, seu governo encontrava-se com apenas 13% de aprovação em abril deste ano.

O julgamento final do impeachment da presidente eleita tem previsão para o fim desse mês. Segundo o Datafolha, 71% das pessoas acreditam que a presidente eleita será afastada definitivamente. Os votos do Congresso apontam na mesma direção.

Informações do Datafolha apontam que não há consenso da população em relação ao Impeachment. Arte: Giovanna Wolf
Informações do Datafolha apontam que não há consenso da população em relação ao Impeachment. Arte: Giovanna Wolf

Contudo, não se pode dizer que há consenso. A pesquisa aponta que 35% das pessoas consideram ilegal o processo de impeachment, não se sentindo representadas pelo afastamento da presidente nem pelo governo de Michel Temer. Diversos grupos em redes sociais endossam essa ideia. Intitulados “Não reconheço Temer como meu presidente”, “Contra o Golpe”, “Volta Dilma” entre outros, são polos de concentração de opiniões pela permanência de Dilma Rousseff e pela resistência ao Impeachment. Por outro lado, os 58% que aprovam o impeachment também tem seus grupos, como “Fora Dilma”, “Impeachment Já” e “Tchau Querida”.

Sobre isso, Maria Hermínia considera que “não há consenso sobre o impeachment ou sobre o governo Temer, embora, há muito tempo, pesquisas sérias, inclusive feitas pela Folha de S. Paulo, viessem mostrando que o apoio ao impeachment era grande e crescia. Mas, neste momento, há pouco consenso na sociedade. Talvez, o maior consenso seja sobre a necessidade de encontrar formas de superar a crise econômica, que é profunda, e segurar a inflação.”