As incertezas e a superfície

Proposta de reforma do ensino médio, desempenho no Enem, cortes, incerteza. Para usar um jargão em desuso, nunca antes na história recente foi tão importante radiografar e pensar a escola e a universidade que queremos e tememos perder. Alvo de polêmica, a MP do Novo Ensino Médio suscita debates e preocupações, e o Jornal do Campus deu a sua contribuição ao ouvir especialistas e mostrar a complexidade do tema.

Mas, em vez de mergulhar a fundo, limita-se a molhar os pés na superfície. A reportagem principal poderia ser desdobrada em pelo menos duas entrevistas em forma de pingue-pongue para que ficassem mais claras as posições de cada um. Isso ajudaria a entender, por exemplo, o que exatamente Elizabeth Balbachevsky quer dizer com frases do tipo “sociologia e artes têm condições de lutar por seu público”.

O texto, em vez disso, chega recheado de jargões como “cura” e “tiro pela culatra” que mais enfeitam do que esclarecem. Perde, assim, a chance de colocar em perspectiva o desempenho das escolas públicas no Enem, divulgadas pelo MEC com alarde, sem levar em conta as notas dos institutos federais, como que para reforçar a sensação de “falência” do ensino público. A jogada política, se há, passou em branco.

Na fala de Renato Janine Ribeiro, faltou contextualizar a referência ao Escola Sem Partido. Faltou também a avaliação de professores de sociologia e filosofia sobre a perspectiva de se distanciarem do ensino médio, a exemplo da reportagem sobre educação física – em página distante da principal.

A pauta com a opinião de estudantes sobre o que falta na graduação é pertinente, mas falha ao não deixar claro o universo avaliado. Eram diversos quanto? Quais eram as perguntas? Qual o período?

Sobre a parceria da USP com a McKinsey & Company, a notícia chega num tom que parece natural que o governador se reúna com empresas privadas em audiência para definir o “futuro” da universidade. Para quem a consultoria trabalha? Há estimativa de custo? Qual o papel da Comunitas? São perguntas que ficaram no ar, mas, com um pouco de fôlego, ainda podem e devem ser investigadas a fundo.

*Matheus Pichonelli mantém uma coluna de cultura e comportamento na CartaCapital e escreve sobre política no Yahoo Brasil