Já imaginou um curso para debatedores? Ele existe

Grupo USP Debate promove discussões organizadas, bem informadas e, acima de tudo, civilizadas

Grupo levou troféu em sua primeira competição nacional. (foto:  André Martins). 

Por Thais Navarro

Idealizado e concretizado após as históricas manifestações de 2013, o projeto USP Debate percebeu a necessidade da construção e da promoção de debates saudáveis, tolerantes, democráticos e embasados.

“Nosso propósito é aumentar a tolerância na argumentação — sobretudo na área da política, que abrange vários temas dentro da universidade”, diz Pedro Henrique, um dos fundadores.

O grupo tem 23 membros que se dedicam a três atividades principais: projetos de extensão, debates abertos e competições. Esta última atividade é a mais recente e veio com tudo: o grupo participou, entre os dias 7 e 9 de setembro, do Campeonato Brasileiro de Debates e, com uma das cinco duplas inscritas, conseguiu o primeiro lugar entre os estreantes.

O campeonato do qual o USP Debate participou é o maior do mundo em língua portuguesa. O evento ocorre anualmente desde 2013 e tem sedes itinerantes. Neste ano, ocorreu em Brasília. Participaram 18 universidades.

Campeonatos de debates são comuns ao redor do mundo (veja mais no box), mas, no Brasil, o movimento é incipiente, mas cresce ano após ano. O grupo da USP teve apoio financeiro da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) para a viagem.

Dupla vencedora

No campeonato, foram postos em debate nove temas, e apenas seis eram de conhecimento prévio dos participantes: start-ups, política no esporte, paralisação dos caminhoneiros, relações multilaterais em política externa, proclamação da República, agrotóxicos, tecnologia e infância, carreira e opções de vida, além da cidade de Brasília.

A dupla vencedora do prêmio revelação é composta pela estudante de ciências sociais Luiza Stolf e por Matheus Franciscão, aluno de economia. “Quis ser debatedora principalmente para sair da minha zona de conforto e melhorar minha habilidade de falar em público”, diz Luiza.

O tema que fez com que a dupla levasse o prêmio foi a paralisação dos caminhoneiros, no qual fizeram oposição a ela nesse modelo de competição, o posicionamento de cada dupla é sorteado na hora, independente das convicções pessoais dos participantes.

Para Matheus, “nossa participação foi muito boa, principalmente por ser a primeira vez que nossa Universidade participou do campeonato. Todas as duplas representaram com orgulho a USP e nos deram grandes esperanças para outras competições”.

Como iniciativa de extensão, O USP Debate vai a escolas públicas e particulares, organizações não-governamentais, centros culturais e cursinhos populares. Em julho, debateram as relações entre futebol e alienação na FFLCH. “É muito gratificante ver o retorno. Oferecemos oficinas de argumentação e as pessoas se encorajam a falar em público”, diz Yasmin Fauze, coordenadora da área de competições e estudante de Letras.

Debates são vitais

Não é incomum que estudantes se sintam acuados ao expressarem suas visões políticas e ideológicas no ambiente universitário por duvidarem se ele é, de fato, plural e tolerante.

Em entrevista ao Jornal do Campus, Yasmin Fauze discorre sobre a problemática. “Acredito que a maioria das pessoas de fato têm muita vontade de debater e de colocar as opiniões com respeito, tolerância e diversidade de ideias.”, diz. “Mas, na minha visão, ainda não existe a cultura do debate com o exercício da empatia e da cidadania democrática”.

Pensar em como promover discussões mais saudáveis é, portanto, essencial. Yasmin defende o grupo como uma proposta rumo a esse objetivo: “No modelo de debate que adotamos, cada um tem espaço de fala e todos têm que ficar em silêncio. Isso é incrível e raro. Essa cultura do diálogo e da tolerância não existe dentro de alguns setores da Universidade. Acredito que alguns princípios têm que ser reciclados, sobretudo o do saber ouvir ao outro.”

Todos podem participar

A terceira área de atividades do grupo é a de debates abertos tanto à comunidade uspiana quanto à externa. São realizados encontros quinzenais às quintas feiras no favo 13B, próximo ao Cinusp e ao Bandejão Central da Cidade Universitária. Para cada encontro, é selecionado um tema em alta no cenário nacional ou na universidade, podendo ser escolhidos pela gestão do grupo ou por sugestão dos participantes.

Alguns temas debatidos foram voto obrigatório, amor e ciúmes, ciência e religião, questão habitacional e espetacularização da morte. “Recompensa muito quando conseguimos tocar pessoas com isso e influenciar positivamente o ambiente universitário — e o ambiente de debates abertos é muito importante para isso”, diz Alice Bertoni, coordenadora da área de extensão e estudante de Relações Internacionais.