Estudos sobre a febre amarela ajudarão a monitorar doença

Segundo alertas da Organização Mundial da Saúde, a doença pode retornar em breve, sobretudo em São Paulo; 46% da população do Sudeste não está imunizada

Por Júlia Mayumi

Entre 2016 e 2017, mais de 700 casos de febre amarela foram confirmados no Brasil, com 261 óbitos, segundo o Ministério da Saúde. O surto foi objeto de dois artigos produzidos por pesquisadores do Instituto de Medicina Tropical da USP e do Instituto Adolfo Lutz, publicados nas revistas científicas Scientific Reports e Science. Entre as conclusões importantes, a de que o vírus é rural, mas pode se desenvolver na cidade.

 

A professora Ester Sabino, um dos autores dos estudos, explica que o primeiro deles, de proposta descritiva, documentou a carga viral de cada animal infectado com a doença. A febre amarela do tipo silvestre é transmitida por um mosquito através de macacos, sendo que a infecção difere entre as espécies – o sagui, por exemplo, recebe o vírus de forma muito mais branda do que o bugio, que tem taxas de mortalidade mais altas.

 

O estudo possibilitou o desenho de uma árvore filogenética que mostrou a similaridade entre os vírus, deixando claro que o surto começou de um único animal, disseminando-se para todos os outros. Por ser um vírus silvestre, ele normalmente fica na mata; porém, a degradação de um meio ambiente estável pode trazê-lo para a cidade. Sabino explica que todas as pessoas infectadas com a doença tiveram contato com o vírus em regiões de floresta ou próximas a grandes áreas verdes.

 

O segundo artigo mapeou os casos de febre amarela por todo o Brasil e linkou as amostras, confirmando que todas elas estavam conectadas e que, portanto, vieram de um mesmo animal. “Se fosse uma febre amarela urbana, as amostras dos humanos estariam ligadas a outros humanos, o que não aconteceu”, explica Sabino.

 

Prevenção e combate

Alec Lacerda é estudante de Saúde Pública na FSP-USP e a febre amarela é o tema de sua Iniciação Científica. Ele explica que, para qualquer doença, a Vigilância Epidemiológica trabalha com dados coletados pelas notificações emitidas pelo município. Todavia, estudos descritivos como o da professora Ester são fundamentais para o desenvolvimento de técnicas de monitoramento das doenças. “Se você conseguir identificar a febre amarela antes de chegar nos macacos, a doença não chegará aos humanos”.

 

Lacerda aponta que a vacinação é o único meio de evitar a febre amarela. “Ela não tem nenhum tratamento específico antes de acontecer no seu corpo. Você consegue controlar o vetor para evitar reintrodução da forma urbana”. A febre amarela urbana é considerada erradicada no Brasil desde 1942, 35 anos após ser combatida no Rio de Janeiro pelo polêmico médico sanitarista Oswaldo Cruz há mais de um século.

 

A terceira onda do surto

A febre amarela pode voltar aos noticiários em breve. A Organização Mundial da Saúde (OMS) emitiu, em fevereiro deste ano, um alerta para um possível retorno da doença, já que, entre dezembro de 2018 e janeiro de 2019, pelo menos 36 casos foram notificados – 32 deles no Estado de São Paulo. Por isso, novas campanhas de vacinação têm sido feitas; segundo o jornal O Globo, 36,9 milhões de moradores da região Sudeste não estão imunizados, o que representa 46% da população total. Lacerda explica que, quanto mais baixa a cobertura vacinal, mais rapidamente o vírus se alastra.