E quem limpa a sua sujeira?

por Lorraine Moreira

E então você chegou até aqui. Morando com seus pais ou enviando mensagem sobre vazamento para o dono do seu apartamento, que não é seu; amando um homem, uma mulher ou os dois; odiando a graduação ou tendo a certeza de que fez a melhor escolha que poderia. De todas essas minúcias que aparecem dia após dia, no entanto, eu aposto que você se esqueceu de um bocado de coisa. 

Não falo sobre provas, trabalhos e seminários. Falo sobre você ter nascido em um mundo pronto – eu sei que muita coisa aconteceu d.V (depois de Você), mas já existia muita coisa aqui. O planeta tinha leite materno, linguagens, roupas, cobertores, chocolates, famílias, amigos, ambientalistas, surfistas… tinha até pessoas. Já parou para pensar que existiam pessoas antes de você? 

Antes de me alongar nesse papo que vai se desenrolar em uma lição gratiluz, deixo uma afirmação: é tudo sobre gente. Ou você teria chegado aqui sem as sucessivas renúncias dos seus pais? Sem aquele professor que te incentivou a ir atrás do seu sonho? São cenários hipotéticos, talvez você nem tenha vivido isso. O lance é que a gente só parte de onde a gente parte, porque teve uma galera antes que fez a gente poder estar alí. E não tirei isso das vozes da minha cabeça: um velho gênio, conhecido como Albert Einstein, graças a invenção da linguagem, do papel e da escrita, falou sobre isso quando escreveu manuscritos para teorizar a felicidade.

Não faço este texto por achar que o discurso do amor ao próximo é mais bonito do que o amor próprio – apesar de acreditar na afirmação. Faço porque todos os dias você encontra uma sala de aula limpa, depois de um porteiro abrir a porta da faculdade, e você vai até o bandejão para comer a comida servida por um merendeiro. A USP funciona graças aos funcionários. E por falar nisso, em 2018, havia 6 mil terceirizados, quase 43% dos empregados pela universidade, segundo levantamento do Sintusp. 

Apesar da grande representatividade numérica, o descaso por parte dos alunos e da própria faculdade são recorrentes. Exemplo disso foi quando uma controladora de acesso ficou em pé no circular, mesmo grávida, de acordo com matéria para o JC feita por Ana Carolina Cipriano, Caio Mattos e Sabrina Brito. Outro problema é que essa modalidade de contratação diminui a proteção ao trabalhador, pois as responsabilidades trabalhistas, prioritariamente, são da companhia contratante para com a contratada. É nesse contexto que os trabalhadores ficam sem garantias de pagamentos de férias ou horas extras quando as atividades são encerradas. 

“Mas isso nem deve acontecer na USP”, você deve estar pensando. A memória é falha, pois em 2016, terceirizadas da Higilimp protestaram pelos salários em atraso em frente à reitoria da USP, depois da empresa fechar. Agora, que você sabe da sua dependência pelo serviço prestado por essas pessoas e da situação em que estão, vai dar bom dia para elas?