Três discos solo gravados, especialista em semiótica da canção, professor da Faculdade de Letras da USP e ex-membro do grupo Rumo – ele é Luiz Tatit. Num bate-bapo descontraído, um dos mais importantes cancionistas da música brasileira fala do passado e do presente e se diz triste com o fato da Universidade ignorar a canção popular
Época de faculdade
Entrei na faculdade de Música (ECA) em 1971. Nunca tinha pensado em carreira artística, mas sempre gostei de lidar com música. Na ECA, sofri um impacto ao saber que o que eu produzia até então não era música. Dois anos depois, por causa da Literatura, fui cursar Letras (FFLCH). Achava que ao estudar música e literatura entenderia a melodia e a letra da canção. Doce ilusão! Na ECA, aprendi o que era música para distingui-la de canção. Também descobri que não queria fazer música erudita. Já na FFLCH, pude ver que letra de canção não tem nada a ver com poesia.
Grupo Rumo
Em 1974, o Rumo começou oficialmente e fez seu primeiro show. Era formado por pessoas que queriam lidar com a canção e que, ao mesmo tempo, não tinham formação musical. O nosso interesse era fazer uma “intervenção” na música popular, trazer uma nova maneira de compor, um novo tipo de estilo dentro da linguagem da canção e, sobretudo, estudá-la.
Dissidência
Na ECA, os primeiros maestros responsáveis pelo curso de Música, Olivier Toni e Willy Corrêa de Oliveira, eram muito competentes, mas rigorosamente conservadores. Para eles, música era uma tradição européia e a canção era como uma brincadeira de criança. Eles queriam criar uma geração de músicos eruditos no país, contudo, isso não aconteceu. Os mais importantes que saíram de lá foram os dissidentes, pessoas que se indispuseram e resolveram fazer outra coisa justamente para confrontar aquela postura fechada. É o meu caso, do Arrigo [Barnabé] e de muita gente que passou por lá.
Música hoje
Atualmente, não é difícil fazer música. O difícil agora é a concorrência. Há a vantagem dos patrocínios que, na minha época, não havia. Eu sei que os patrocinadores fazem isso para terem os seus descontos, mas essa é uma dinâmica capitalista interessante. A impressão que se tem de que a música de hoje é ruim é falsa. O que temos são algumas músicas eleitas para tocar na televisão. Normalmente, eles ficam com a Ivete Sangalo. Aliás, eu a acho brilhante no que faz, é uma artista monumental para coisas de grande porte. É o inverso do João Gilberto. Você tem que colar o ouvido no alto falante para entender o que ele fez. É como um outdoor: visto de perto, percebem-se imperfeições e não se consegue enxergar a figura; visto de longe, às vezes, é bonito e super expressivo. Esse tipo de música [da Ivete Sangalo], se você ouvir de longe, funciona muito bem.
Canção
O meu lance sempre foi a canção. A canção tocada em rádio, a canção para consumo. Hoje em dia, eu consigo unir o estudo à produção musical e componho muito mais do que antigamente. No entanto, o estudo da canção no Brasil ainda não tem uma bibliografia farta para compor um currículo. É quase um contra-senso o Brasil não ter uma cadeira de canção. É ignorar o que há de melhor. Infelizmente, com relação ao estudo da música popular, a USP não conseguiu nem chegar no jazz, imagine na canção. É triste.
Ontem | Hoje |
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Eu era: um menino Eu sonhava: pouco Eu dizia: muita coisa Eu escutava: Jorge Ben Jor Eu assistia: ao programa Fino da Bossa Eu queria: produzir alguma coisa Eu temia: que não desse nada certo Eu adorava: futebol Eu sabia: que eu não sabia Eu ria: dos acadêmicos Eu esperava: mais difusão dos trabalhos Eu me orgulhava: de ter uma idéia própria Eu tinha: medo de muita coisa Eu ia: viajar Eu usava: pochete Eu lia: coisas de natureza muito diversa |
Eu sou: gente grande Eu sonho: muito Eu digo: pouca coisa Eu escuto: Jorge Ben Jor Eu assisto: a shows em teatros de São Paulo Eu quero: produzir mais um pouco Eu temo: que as coisas sejam interrompidas Eu adoro: canções Eu sei: que eu não sei Eu rio: não rio mais Eu espero: que ainda haja difusão Eu me orgulho: de vê-la funcionando própria Eu tenho: medo de muita coisa Eu vou: ficar por aqui Eu uso: pochete Eu leio: coisas bem mais restritas |