O prédio ocupado pelo MSTC (Movimento Sem-Teto do Centro de São Paulo), na Avenida Prestes Maia, 991, ganhou recentemente ordem judicial de reintegração de posse. Caso a desocupação ocorra, 368 famílias serão despejadas. Desde dezembro de 2010, dois meses após a ocupação, alunos de Artes Cênicas da USP, membros do “Coletivo de Galochas”, atuam no local através de intervenções artísticas.
As principais ações do grupo são ensaios semanais nos corredores, atividades artísticas com crianças, a criação de um Centro Cultural no subsolo do imóvel e luta conjunta pela manutenção das famílias no local.
Depois de montarem uma peça baseada no texto teatral Roberto Zucco, de Bernard-Marie Koltès, exibida por quatro meses na Praça do Relógio, em 2010, os integrantes do Coletivo decidiram ir em busca de novos locais para fazer teatro. “Procuramos um lugar onde a discussão do espaço fosse uma necessidade”, conta Rafael Presto, um dos membros do grupo.
Negando qualquer caráter assistencialista, Nina Hotimsky, também integrante do “Coletivo de Galochas”, deixa claro: “A gente não vai fingir que mora lá. Temos uma proposta artística”. A ideia dos estudantes é utilizar a arte para fazer com que os atuais moradores adquiram ainda mais cultura e apreço pelo espaço. Como os ocupantes, os alunos defendem que o local se transforme em uma moradia popular.
Ivonete de Araújo, coordenadora do MSTC, afirma que os estudantes têm auxiliado bastante na continuidade do movimento. Segundo ela, um documento, elaborado pelo Coletivo de Galochas, explicando as atividades culturais promovidas no imóvel foi anexado ao processo, mas “não foi dada atenção a ele”. Mas vamos continuar pressionado. Vamos procurar o Ministério Público e a Defensoria Pública”, diz a coordenadora.
Piratas
Para os primeiros ensaios na Praça do Relógio em época de chuva e, consequentemente, de muita lama nos locais não asfaltados, só com galochas. Daí o nome do grupo. “Mas Coletivo de Galochas também pode ser porque a galocha serve para se pisar em todo tipo de lugar, em qualquer espaço”, diz Presto.
Entre os projetos do Coletivo para a manutenção cultural na ocupação da Avenida Prestes Maia, está prevista a estreia de uma peça no espaço, em outubro deste ano. Ainda sem nome, a obra já tem tema: piratas. Segundo os artistas, o mote da obra acaba fazendo uma ponte entre a marginalização dos piratas e a dos envolvidos na ocupação.
Antes da estreia, os alunos pretendem apresentar pequenas cenas do espetáculo ao público em geral. Essa é uma das ações que iniciarão as atividades relacionadas ao Centro Cultural, idealizado pelos estudantes.
Implicações
Há mais de 27 anos, o proprietário do imóvel ocupado na Avenida Prestes Maia, Jorge Nacle Hamuche, dono da Axel Empreendimentos Imobiliários, não paga os impostos do local. A dívida soma atualmente R$ 4.950.412,00. Em 2002, o prédio já havia sido ocupado e estava abandonado há mais de 10 anos. Uma ordem judicial de 2007 despejou os então ocupantes, 438 famílias. O não pagamento dos impostos e o abandono do imóvel seguiram.
Apesar do histórico, nas últimas semanas, uma ordem judicial determinou novamente a reintegração de posse ao proprietário. “Estamos aguardando o oficial de justiça chegar com a liminar”, diz Roberto Carlos Rocha, coordenador da ocupação.
Até o fechamento desta edição, o Jornal da Campus não conseguiu entrar em contato com a Axel Empreendimentos Imobiliários. De 11 números telefônicos da empresa disponibilizados na internet, cinco não existem, cinco não atendem ou estão constantemente ocupados, e um corresponde, na realidade, a um telefone residencial. O JC também não conseguiu estabelecer contato com Valter da Silva, advogado de defesa do MSTC.