Menos democracia na redação

Uma coisa é cuidar de uma samambaia na sala de casa. Outra, diferente, é cuidar de um jardim, ou plantar uma horta. Olhar o conjunto das coisas é importante e pouca gente sabe fazer. No jornalismo, harmonizar as diferentes seções noticiosas, as fotos, títulos, legendas, corpo do diário é uma função fundamental. O responsável por essa parte do trabalho é quem dá personalidade editorial ao que, de outra forma, seria apenas uma coleção de textos produzidos por autores diferentes.

O processo de editar um jornal não pode ser democrático. Como envolve tomada de decisão – muitas vezes num ambiente de muita eletricidade, com pressão de horário, opiniões divergentes, pessoas faladoras e de caráter forte, em ambientes ruidosos e de muito stress -, o editor, ou os editores de uma publicação, precisam ter um enorme poder de discernimento e nenhum pudor em exercer autoridade – tanto melhor se com graça, polidez e educação, embora nem sempre isso aconteça, para alegria dos psicólogos de
São Paulo.

Como uma máquina azeitada, o jornal precisa de alguém na engrenagem que seja o responsável por, no deadline, decidir. E, claro, arcar para todos os custos de suas decisões. A capacidade de acertar nas escolhas e aguentar a bronca é em grande medida o que faz de um editor um bom editor. Como seria de se esperar num órgão laboratorial, ainda falta esse espírito ao JC. Falta a figura capaz de transformar um grupo de textos num jornal coeso. Falta a mão de um editor. Do contrário, como explicar que a manchete da última edição “Como vota a universidade” tenha rendido um simples gráfico na página 6, sob o título “Haddad lidera”? Ora, o jornal precisa dizer como vota a universidade, e não forjar um título  com esse nome, sem dizer como, afinal, vota a universidade. E se a resposta confirma a tendência verificada em toda São Paulo, de que Haddad lidera mesmo, porque essa informação haveria de ser manchete da edição? E supondo que o editor banque essa decisão, porque não existe uma matéria a respeito, no lugar de um gráfico de 1/6 de página?

Um pequeno conselho editorial também não teria deixado passar a capa comemorativa da edição número 400. Como leitor, demorei 10 minutos para entender que não estava recebendo o jornal errado.

Nota positiva para a ousadia da página 2. Funcionou.

João Paulo Charleaux é jornalista e coordenador de comunicação da Conectas Direitos Humanos e do curso de jornalismo em situações de conflito armado e outras situações de violência. Escreve sobre cultura e direito internacional em veículos como Folha de S. Paulo e Última Instância, além de colaborar com a rádio França Internacional, a revistaCarta Capital, o jornal Le Monde Diplomatique, a rádio Popular de Milão, a rádio Interworld (Panos London), a Rádio Netherland e a Agência Poonal de Berlim.