Wadi costuma treinar três vezes por semana no Cepeusp, sempre sozinho, “por estar fora de forma”, justifica. Na última segunda, dia 12 de agosto, o estudante intercambista, vindo de Cabo Verde, treinava na quadra 1 quando se envolveu em uma briga com o time de basquete da Escola Politécnica. A disputa chegou à agressão física e o estudante deu entrada no Hospital Universitário na noite do incidente. Segundo ele, a confusão iniciou-se no momento em que um atleta da Poli chutou sua bola para fora do campo, desencadeando sua reação.
Os amigos de Wadi destacam a não intervenção da Guarda do Cepe, que viu todo o ocorrido e não agiu para separar a briga. O fato contrasta com a atitude vista na semana seguinte, quando cerca de 25 alunos negros da universidade se reuniram para um ato em protesto ao ocorrido. “O interessante é que nesse dia que nós fomos fazer o ato, em menos de cinco minutos apareceu a guarda [terceirizada] do Cepe e em 20 minutos chegou a guarda da Cidade Universitária. No momento da agressão, dois seguranças observaram a cena e não fizeram nada, e no nosso ato pacífico eles foram tentar nos tirar da quadra”, argumenta Tiago Ferreira, aluno de Geografia, amigo de Wadi.
Para Dennis Oliveira, integrante do Núcleo de Estudos Interdisciplinares do Negro Brasileiro (Neinb), professor da ECA e uma das primeiras pessoas a comentar o caso, o erro está presente tanto no Cepe quanto no time de basquete. E ressalta, “o preconceito não deve ser direcionado à Poli, mas o comportamento desses alunos é completamente inadequado e não deveria passar despercebido”.
Tanto a direção da Escola Politécnica quanto a Associação Atlética Acadêmica Politécnica (AAAP) declararam que buscam por medidas cabíveis internamente. Entretanto, o representante Guilherme Perrucci afirma em entrevista que a instituição “não soltará pedidos de desculpa”.
Racismo ou não?
O relato oficial da AAAP dá conta de que a discussão transcorreu de forma educada e os jogadores iniciaram o treino ainda com a presença do intercambista na quadra. Wadi sugeriu que o local fosse compartilhado pelo grupo e por ele, mas os alunos não entraram em acordo.
O espaço estava reservado para o time de basquete da Poli. O Cepeusp preferiu não se posicionar quanto ao caso. Através de seu diretor técnico, José Carlos Simon Farah, informou que aguarda o Boletim e relato dos seguranças que estavam no local na noite do acontecimento. Farah descarta também a possibilidade de um ato movido por racismo, encarando como uma confusão pela disputa de quadras. Já os amigos de Wadi consideram a agressão direcionada e racista. “Isso aconteceu porque ele é negro. Eles expulsaram o Wadi da quadra”, afirma Levi Domingos, estudante de Geografia.
A atlética e a direção da Escola Politécnica negam qualquer relação de racismo no caso. “A gente pediu pra ele sair como pediria para qualquer aluno que estivesse lá. Ele disse que foi com falta de educação e nós dizemos que foi de modo educado, são duas versões. A dele e a da Atlética”, defende Guilherme Perrucci, da AAAP.
Amigos de Wadi apontam um racismo institucional presente tanto na seguraça do Cepe quanto na Guarda Universitária. Entretanto, é inegável o fato de que se tratou de uma agressão de vários atletas do time contra apenas um estudante, um ato grave por si só. “A gente espera que a Universidade dê o exemplo”, comenta Dennis Oliveira.
Em nota, o diretor da Poli e o representante da Atlética asseguram que irão investigar o caso e buscar providências internas para os acusados.
“O caso é específico porque se trata de um intercambista, um estudante que a USP se responsabilizou em acolher e abrigar como um cidadão brasileiro”, defende Guilherme dos Santos, aluno de Geografia e amigo do agredido.
A universidade está colhendo informações sobre o caso, mas não tomou nenhuma providência até então. Em assembleia ocorrida na Escola Politécnica, no dia 20, para discutir os desdobramentos da agressão, os participantes decidiram pela criação de uma moção de repúdio à violência e ao racismo. Além disso, entre as resoluções, estava a exigência de uma retratação formal do time de basquete da Poli.
“É importante deixar claro que essa conduta não representa os estudantes da Escola Politécnica. Temos que ter cuidado com generalizações”, reforçou Rafael Auad presidente do Grêmio Politécnico.