Guarda Universitária: uma única mulher

(Foto: Ana Luísa Abdalla)

O trabalho na guarda é de família. Assim como sua mãe trabalhou em 1988, Heidi Oliveira, 31 anos, trabalha desde 2012 na Guarda Univesitária da USP e é, atualmente, a única mulher do corpo operacional do grupo – mais mulheres trabalham em outros setores. Em conversa com o Jornal do Campus, contou sobre o funcionamento da Guarda e sobre como é ser a única integrante do sexo feminino depois de muitos anos sem nenhuma representante.

A mãe de Heidi, Silmara Santos, trabalhou na mesma função que compete à filha atualmente. Quando entrou, além de um grupo formado por homens, havia ainda uma equipe exclusivamente feminina, com cerca de 20 pessoas, chefiadas também por uma mulher. Essa foi, porém, a primeira e última formação separada por sexo. Logo após, em 1992, a Guarda passou a ser composta somente por uma equipe mista, e chefiada por um homem. “Usaram como pretexto que  uma mulher não seria uma boa líder”, conta Heidi. A medida acabou por desmotivar o grupo feminino da guarda, que se dispersou, com “muitas pedindo transferência”.

Com isso, a presença de mulheres no corpo operacional da Guarda foi ficando cada vez menor até sumir de vez. Heidi é a primeira mulher a fazer parte da guarda desde a turma de sua mãe.

Porém, mesmo com essa situação, Silmara não cedeu e, não somente continuou seu trabalho, como, em 2002, participou da formação da primeira equipe de ronda utilizando bicicletas. Ainda hoje trabalha no departamento de segurança da Universidade, sendo parte da superintendência administrativa. O projeto de uso das bicicletas funcionou bem e, após ter sido paralisado por alguns anos, retornou há cerca de dois meses. Atualmente, é como Heidi faz sua ronda, junto com seu parceiro Andrei Delgado.

POR DENTRO DA GUARDA

Ser a única integrante do sexo feminino no grupo pesa no dia a dia. Quando perguntada se sente a discriminação dentro do próprio grupo, desabafou: “Sinto muita! Desde o jeito que me olham, a falta de atenção no que eu falo, as piadinhas…”. Situações que ocorrem com parte do grupo.

Contudo, mesmo com as piadinhas constantes e de ouvir “tinha que ser mulher” com frequência, Heidi conta que o que mais a incomoda é “quando eu falo algo, alguns nem prestam atenção. Agora se um dos rapazes fala a mesma coisa, concordam e aceitam”. Como a grande maioria do departamento de segurança da Universidade é composto por homens, as reclamações de Heidi não ganham muita força.

Apesar de sentir na pele a diferença de tratamento por seu gênero dentro do grupo, houve algum avanço estrutural em relação ao concurso que a levou a fazer parte da Guarda. Antes, os critérios para entrar eram prova escrita, teste de volante, avaliação física e um período de experiência. Durante esse processo, Heidi conta que a preferência era sempre por homens, e havia um “boicote velado das participantes mulheres”. No entanto, desde o último exame, que foi o que Heidi prestou em 2009, o concurso mudou. Agora ele ocorre por meio da Fuvest e ainda conta com uma prova escrita, avaliação física e de direção, mas não mais existe o boicote. Dessa forma, Heidi conseguiu passar e compor a equipe a partir de 2012.

Como cresceu na Universidade devido à ocupação de sua mãe, conta que não sente o peso do trabalho como algo ruim. E, se por um lado a situação que encontra dentro do corpo da Guarda é muito difícil, “por vezes me olham como se eu não fosse nada”, em suas rondas de bicicleta com seu parceiro, Heidi afirma que na comunidade USP não é assim. “É até ao contrário, preferem me perguntar ou pedir informações do que ao Andrei”.

UM ACENO DE MUDANÇA

Em abril desse ano, houve uma importante mudança no departamento de segurança da USP no que se diz respeito a presença de mulheres, pois passou a ser chefiado pela antropóloga e professora da FFLCH Ana Lúcia Pastore. “Me senti bem recebida, mas existe um certo desconforto por ser um espaço muito masculino”, conta. A professora ressalta também a busca por um diálogo cada vez maior a respeito da segurança da Universidade, de forma a ouvir o que os guardas tem a dizer, algo que não acontecia antes, quando o coronel Luiz de Castro Júnior, da gestão Rodas, era chefe da organização. Ana Lúcia reforça ainda: “É importante encontrar um equilíbrio de gênero dentro de uma área majoritariamente de homens”.

NOTA: No total, são quatro mulheres agentes de vigilancia no Campus Butantã, sendo apenas Heidi trabalhando nas ruas. Na parte administrativa, trabalham Silmara e Socorro. Louracy trabalha na central de rádio, além da secretária Gislaine.

por ANA LUISA ABDALLA