Projeto independente avalia impactos ambientais após tragédia de Mariana

Biólogo formado na USP inicia mobilização voluntária de cientistas para pesquisas na região

A tragédia em Mariana foi um dos maiores desastres ambientais do Brasil, e o maior acidente em barragens da história mundial. O ocorrido ainda é cercado de inúmeras dúvidas, que vão desde a toxicidade dos rejeitos até a estimativa de quanto tempo a região vai levar para se recuperar. A Vale admitiu a presença de metais pesados em alguns pontos do Rio Doce, mas por outro lado nega que os 50 milhões de metros cúbicos de lama que desceram a partir do rompimento da barragem sejam tóxicos. No entanto, alguns cientistas, pesquisando de maneira autônoma, têm encontrado outros resultados, que apontam uma realidade muito mais destrutiva do que a versão apresentada pela mineradora Samarco.

Um exemplo de movimento independente que está estudando a tragédia em Mariana é o Grupo Independente para Avaliação do Impacto Ambiental (GIAIA) – Samarco/Rio Doce. O projeto tem como objetivo reunir cientistas de maneira voluntária, das mais diversas áreas do conhecimento, para que possam fazer uma análise colaborativa do impacto ambiental resultante do rompimento da barragem.

A iniciativa partiu do biólogo Dante Pavan, especialista em répteis e anfíbios formado pelo Instituto de Biociências (IB) da USP, juntamente com outros cientistas da Universidade. Ele conta que postou a ideia em sua linha do tempo no Facebook, e rapidamente formaram um grupo com mais pessoas interessadas. ”No domingo à noite, dia 8 de novembro, já estávamos fazendo o projeto de financiamento. Vim para Vitória (ES) com meu carro, de madrugada, para chegar o mais rápido possível, antes da lama alcançar em algumas áreas afetadas”, comenta.  

O projeto de financiamento foi por meio de crowdfunding no site Kickante. A meta do grupo era atingir 50 mil reais, mas a iniciativa já conta com mais de 85 mil arrecadado. A ideia cresceu rapidamente, e dezenas de outros profissionais se juntaram, de forma voluntária, para ajudar no projeto. O dinheiro ainda não foi sacado, mas GIAIA pretende usá-lo para o financiamento das pesquisas, com prestação de contas para o público de cada verba gasta e também disponibilizando os relatórios obtidos em domínio público.

Organizando o trabalho

A iniciativa está no começo e ainda se estrutura quanto às diretrizes e métodos de trabalho a serem seguidos. “Os cientistas ainda estão chegando e propondo grupos de trabalho. Aí eles começam a se organizar dentro do grupo, e cada um apresenta uma proposta. Ela é  publicada, para depois ser aprovada”, comenta Dante Pavan. “Estamos tentando organizar mecanismos de aprovação e regras do grupo. Tudo está sendo feito ao mesmo tempo”.

O biólogo é o cientista há mais tempo em campo, pois foi o primeiro a chegar nas regiões mais afetadas. Ele está coletando amostras, para fazer um apanhado geral de todo o percurso da lama e ver como as condições naturais mudam ao longo do rio, e como a lama está afetando diferentemente esses lugares distintos. Ele está fazendo isso para que os grupos possam trabalhar com o impacto de maneira mais realista, tendo uma visão mais geral do que aconteceu para depois conseguir desmembrar em mais detalhamentos.“É um processo interessante e democrático, mas também demorado”, comenta Dante. Se tivesse um chefe, que decidisse tudo, seria mais fácil. A ideia, contudo, é um pouco essa: cada um poder incluir a sua perspectiva e seu tema de pesquisa”.

Resultados

O GIAIA ainda não tem planos para fazer uma primeira entrega dos resultados obtidos. A ideia é liberar os dados ao público  à medida que fiquem prontos, mas isso ainda está em fase de planejamento. Também planeja-se fazer uma síntese de todo o material levantado, esforçando-se para unir uma área do conhecimento a outra, interdisciplinarmente, e talvez até realizar um simpósio.  

Além do dinheiro já arrecadado, o grupo também pretende buscar outras formas de financiamento e arrecadação de dinheiro, pois todos que estão trabalhando na região estão lá voluntariamente.  Mas isso é um projeto futuro. No momento, os idealizadores estão estudando a melhor forma de aplicar a verba já arrecada. É um processo lento e complicado, pois o grupo é descentralizado, sem uma chefia que possa decidir o destino e aplicação do dinheiro.

“Acho que nenhum outro impacto no Brasil, em termos de extensão e impacto geográfico, é maior que esse. A  única  coisa mais extensa do que isso é a devastação da Mata Atlântica como um todo, e isso já ocorre há 400 anos. A mineração em Mariana não tem tem nem um século de exploração. Essa escala é assustadora. A vista do mar aqui em Espírito Santo parece que você está num oceano extraterrestre. Você não vê nada azul. Está tudo vermelho de lama até o horizonte”, comenta Dante.

Como colaborar

Conheça mais sobre o grupo de cientistas independentes que está atuando na avaliação do impacto ambiental no Rio Doce, e saiba como ajudá-los em:
http://giaia.eco.br/

Mas informações para contribuir com crowdfunding no link:
http://www.kickante.com.br/campanhas/relatorio-independente-de-impacto-causado-pelo-rompimento-das-barragens-de-fundao-e

Por Thiago Castro