Afinal, quem é o “especialista”?

Quem se qualifica como entrevistado? E como apresentar um entrevistado ao leitor?

A reportagem “Governo Macri modifica Lei de Meios”, da edição 454 do JC, deixa no ar essas duas perguntas. O texto, um confuso corolário sobre a lei de mídia argentina, traz como entrevistados Eugenio Bucci e Pablo Giuliano.

Bucci é um especialista conhecido de quem segue noticiário de mídia, mas é simplório identificar apenas como professor da ECA alguém de currículo longo que por anos dirigiu a Radiobras/EBC, empresa pública de comunicação –aliás, a melhor justificativa para ouvi-lo sobre esse tema.

E Giuliano? A reportagem o cita apenas como “jornalista argentino e correspondente”. De qual veículo? Desde quando ele está fora da Argentina? O que o qualifica para falar do assunto?

É crucial situar o leitor. Afinal, podemos estar ouvindo um observador neutro, mas podemos também estar dando espaço a uma parte interessada, com envolvimento pessoal ou discurso proselitista, arriscando ludibriar o leitor.

No caso de Giuliano, foi preciso buscar sua página em uma rede profissional para saber que o jornalismo não é mais sua principal atividade; que ele vive no Brasil desde 2004 (não acompanhou as gestões de Néstor Kirchner, iniciada em 2003, Cristina ou Macri); que trabalhou para a Ansa e a Efe, agências estrangeiras, não argentinas. Vale ouvi-lo? Sim se fosse um estudioso do tema, mas isso o texto não informa.

É comum chegarem às Redações releases com opiniões de “especialistas” genéricos sobre temas quentes, mesmo que de área diversa. Antes de ouvir alguém, é preciso pensar se a pessoa pode aprofundar o assunto. Se a resposta for sim, é preciso apresentá-la corretamente ao leitor.

Luciana Coelho, 37 anos, é editora de “Mundo” da Folha de S.Paulo e ex-correspondente nos EUA e Europa.