Do TCC à colação de grau, alunos relatam os desafios e as experiências de encerrar seu ciclo na USP através das telas.
por Luana Benedito e Matheus Alves
A falta de um marco simbólico ao concluir a graduação é uma das queixas dos alunos. Foto: niekverlaan/Pixabay
Depois que a covid-19 explodiu no Brasil, a USP fechou suas portas e as atividades acadêmicas passaram a acontecer de forma remota. Aulas, grupos de estudos, trabalhos de entidades e interações sociais entre os alunos tiveram que se adaptar ao mundo das telas.
Com a situação sanitária incerta do país, parece impossível prever a volta das atividades presenciais, e muitos alunos se perguntam se algum dia voltarão a pisar nos campi da USP antes da conclusão de seus cursos. Quantas pessoas terão que se formar de forma remota até que seja seguro retomar as idas à Universidade? Como fica a colação de grau? Como se sentem esses alunos?
Em busca de respostas sobre como foi o processo de conclusão de curso por meio do ensino remoto e como estão acontecendo as cerimônias de colação de grau pelas unidades da USP, o JC entrevistou alguns discentes que se formaram no atípico ano de 2020 — pioneiros das conclusões de curso online.
Faltou algo que marcasse
Victor Félix, de 22 anos, acredita que a pandemia o ajudou bastante a se formar em Estatística pelo ICMC da USP de São Carlos. O modelo EAD além de o permitir assistir as gravações de aulas a qualquer momento, também permitiria reproduzi-las em maior velocidade: “Estudava no noturno, sempre chegava na aula muito cansado, então nesse período de quarentena, sempre tentava assistir pelo período da manhã. Nesse sentido, acho que ficou até mais fácil.” O modelo remoto também o permitiu retornar para o conforto da casa dos pais, que considera ter ajudado bastante.
Além de tudo, os professores diminuíram consideravelmente a cobrança, em relação às atividades semanais, provas, participação, e prazos. Entretanto, ele vê a “ajuda” apenas no objetivo de se formar rapidamente, pois acredita que, do ponto de vista educacional, o modelo EAD tenha sido significativamente pior.
Em março de 2021, Victor colou grau remotamente. Seus pais poderiam assistir à transmissão e no final poderiam aparecer na câmera do formando. Houve juramento, premiações e discursos dos paraninfos. Mesmo assim, ele achou a colação um tanto maçante, principalmente pelo fato de não ter ficado muito apegado à faculdade. Contudo, muitos de seus colegas que tiveram uma experiência universitária mais marcante, ficaram decepcionados por não ser presencial.
A presença durante a colação de grau remota era obrigatória, mas não houve entrega do diploma, pois nem ao menos foram produzidos. Foi apenas disponibilizada a possibilidade de emitir um certificado de conclusão.
Estava ansioso por finalmente concluir o curso, sentiu que faltou algo que marcasse simbolicamente a conclusão do curso: “Não tive muito um marco assim… Foi mais dormir e no outro dia estava trabalhando de novo.”
Incerteza à frente
Isabella, formada em Medicina pela FMUSP, também teve que encerrar seus anos de faculdade em meio à pandemia. Ela já participou da colação de grau, e, segundo ela, a cerimônia foi presencial mesmo em meio à pandemia, com transmissão online para familiares e amigos.
Mesmo com a oportunidade de passar por esse rito no mundo real, fora das telas, ela lamenta a impossibilidade de dividir a experiência de forma presencial com seus entes queridos. “Foi triste não poder estar junto com as pessoas para celebrar um momento que deveria ser tão marcante”, diz ela.
Ela conta que ainda tem planos de comemorar sua formatura de forma presencial, acompanhada de pessoas queridas, mas se queixa das incertezas: “as coisas estão sendo adiadas cada vez mais, sem planos muito claros”.
“Não havia alternativa senão esperar”
Carolina Olivi Barbeiro, de 25 anos, acabou se formando no seu curso de Ciências Biomédicas apenas em março deste ano. Esperava se formar em dezembro do ano passado, mas infelizmente a pandemia acabou atrapalhando sua conclusão de TCC.
Nesse curso, TCC e estágio obrigatório são uma só coisa e precisam envolver o laboratório de pesquisa, ou seja, é necessário que seja presencial: “Como a pandemia impossibilitou a ida dos alunos de Graduação ao laboratório eu não pude finalizar meus experimentos no tempo esperado e não havia alternativa senão esperar a liberação dos alunos da graduação para frequentar os laboratórios de pesquisa.”
Entretanto, Carolina gostou bastante do fato da colação de grau ser remota, pois, de acordo com ela, “teve todas as formalidades de uma colação normal, com juramento e discursos”. Além disso, ela preferia de forma remota, tanto por precisar do diploma o mais rápido possível, como pela praticidade e brevidade, como ela explica: “eu gosto de aproveitar esses momentos com a minha família próxima, e isso possibilitou que a colação fosse mais prática e sobrasse mais tempo para a comemoração em família.”
A espera pelo presencial
Pedro Henrique Corraini, de 24 anos, é um dos que já completaram todos os requisitos para a conclusão do curso de Relações Públicas da ECA, seis anos após entrar na faculdade, mas optou por não colar grau ainda.
Ao comentar sobre os motivos que levaram a essa decisão, ele explica: “é mais pelo sentido simbólico de você colar grau.”
“É um negócio com toda a sua família te olhando, você todo arrumado, vai pegar o diploma… eu queria ter essa experiência, tanto pela minha família quanto para compartilhar com meus amigos também”, comenta, e acrescenta que não foi uma decisão individual. Depois de conversar com seus colegas de turma, percebeu que a maioria também preferiria esperar a oportunidade de participar de uma cerimônia presencial.
Embora tenha enfrentado o processo de conclusão de curso de forma online e tenha que lidar com a espera de uma colação de grau presencial, Corraini conta que não está tão frustrado assim com a situação, uma vez que já participou de sua festa de formatura.
“Acabei fazendo a festa sem estar formado, em 2019”, com a turma com a qual entrou na Universidade, comenta. Segundo eIe, isso colaborou para seu processo de encerramento de ciclo, e “a colação acaba sendo um detalhe”.
Comentando sobre o impacto de enfrentar o processo de conclusão de curso de forma on-line, Corraini diz que o fato de ele já ter vivido experiências no Campus e consolidado amizades torna a situação mais tolerável.
“Acho que quem mais sente isso é quem está entrando. Os primeiros anos são os anos em que você conhece tudo, muda toda a sua realidade, e a galera não está tendo contato com isso. Querendo ou não, eu já tive meus dias de festa”, afirma.
“Mais simbólico do que prático”
Mas não é todo mundo que lamenta a falta de uma cerimônia presencial de colação de grau. Alex*, de 25 anos, formou-se em licenciatura em Ciências Biológicas em 2020 e chama a atenção para pessoas que podem ter que se sujeitar a várias dificuldades para participar de um evento do tipo.
Ele próprio tem dor crônica — que pode dificultar sua locomoção — e Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), o que significa que lugares muito barulhentos, como um auditório cheio de formandos, professores e parentes, podem trazer muito desconforto.
“Esse tipo de cerimônia (presencial) é muito excludente para pessoas com deficiência ou pessoas autistas, penso eu. Não entendo por que submeter todos a esse processo, que é mais simbólico do que prático”, opina.
Além disso, ele relembra uma informação importante: existem pessoas que não gostam de ritos de passagem ou não enxergam neles qualquer importância. “Recebi, por e-mail, a informação de que preciso participar de uma colação virtual para ter meu diploma expedido” conta. “Fico pensando no quanto isso é uma tremenda perda de tempo.”
*Nome fictício pois a pessoa preferiu não se identificar.