Festas universitárias migram para o online e promovem integração na pandemia

Os eventos possibilitam novas amizades, mas depois de tanto tempo de quarentena, perdem força devido ao cansaço das telas

 

 

por Edson Junior

Arte: Natália Milena/Foto: Pexel

 

As festas universitárias compõem um dos aspectos mais marcantes da vida universitária fora da sala de aula. Para muitos estudantes, é comum haver a lembrança de alguma festa durante o período da universidade que nunca será esquecida. Com a crise decorrente do coronavírus, assim como as aulas, a integração dos alunos por meio de festas migrou para o meio virtual, através de plataformas digitais. 

Pode ser difícil imaginar como fazer uma festa por meio de telas de computador. Porém, entidades de diferentes institutos da USP conseguiram se adaptar. Muitas festas acontecem no formato de uma reunião virtual, em que todos abrem suas câmeras e conversam, às vezes bebem e até jogam games virtuais. 

Contudo, esse não é o único formato possível: também há algumas com mais recursos. Esse foi o caso da “Abril Pros Bixos”, festa anual realizada pela Atlética da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, a Ecatlética, em abril de 2021.

Mariana Guelfi, estudante de Publicidade e Propaganda e diretora geral de eventos da entidade, conta ao JC que, na ocasião, ela se encontrou presencialmente com as duas DJs que tocaram na festa, seguindo os protocolos de distanciamento. Dessa forma, com as três em um mesmo local, adaptaram a transmissão do evento para uma live. 

Os espectadores podiam ver o vídeo ao vivo em que as DJs tocavam e interagiam por meio de uma aba de conversa em texto da plataforma, a Twitch. Entre as músicas, havia pausas em que eram realizadas dinâmicas para os participantes, como sorteios. 

Foi uma ocasião especial para Mariana, pois também era o dia de seu aniversário. Ela detalha que, em determinado momento, a DJ que estava tocando parou para dar parabéns a ela, e muitas pessoas começaram a fazer o mesmo no chat do evento. “Muita gente que mandou parabéns eu nem conhecia ou só conhecia digitalmente. Eu senti um amor muito grande ali, foi como se eu estivesse em um ‘rolê’ e todo mundo começasse a gritar parabéns. Para um aniversário na pandemia, foi incrível”, afirma.

Capa utilizada para divulgação da “Abril Pros Bixos 2021”. Foto: Ecatlética

 

O formato mais simples também funciona bem, a exemplo das festas realizadas pela Atlética da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP, a IX de Setembro. Júlia Queiroz, presidente da entidade, diz que a maioria dos eventos realizados durante a pandemia foram por meio de reuniões online na plataforma Zoom.

Ela explica que, como a faculdade não tem um número muito grande de alunos, é fácil juntar os estudantes numa sala virtual para conversarem. Uma das diferenças desse tipo de formato para o de uma live é que as pessoas podem se ver e conversar, enquanto que, na live com DJ, a interação é limitada às mensagens  de texto. Porém, Júlia conta que  eventos grandes são mais difíceis de se fazer em uma sala de reunião virtual, pois são  muitas pessoas para conversar ao mesmo tempo.

“A gente fez a maioria das festas no Zoom, com apresentação, integração, slides engraçados, foto engraçada da galera…Eu gosto das integrações da Veterinária porque a gente é como uma família”, conta a estudante sobre sua entidade.

E para quem entrou na universidade durante a pandemia?

Para Júlia, um dos momentos mais marcantes aconteceu no “Happy Hour de Melhores do Ano de 2020”, confraternização de fim de ano de sua entidade. Lá, foram feitas premiações para os estudante mais presentes nas atividades da atlética no ano, incluindo prêmios aos calouros mais notórios de 2020.

 Júlia conta que muitos calouros que ingressaram no ano passado, os quais passaram quase todo o primeiro ano de faculdade em ensino remoto, a agradeceram pela organização do evento e gostaram muito da experiência. Ela diz que a vencedora do prêmio de “Bixete do Ano”, dado à caloura que mais se destacou na entidade em 2020, chegou a chorar de emoção durante a festa. 

“Eu fico muito feliz de ter feito algo para eles [calouros] e poder levar um pouco dessa sensação de pertencimento da faculdade, dessa sensação de família, de estar em casa”, afirma Júlia.

Momento em que foi dado o prêmio de “Bixete do Ano”. Reprodução: Júlia Queiroz

 

O sentimento  de levar aos calouros uma experiência que não tiveram presencialmente é o que motiva Caíque Fernandes a realizar esse tipo de evento. Ele é estudante de Química e vice-presidente da Associação Atlética Acadêmica Ana Rosa Kucinski da Silva (AAAARK), do Instituto de Química (IQ) da USP. 

“O que mais me motiva durante a época de pandemia é ver os calouros animados, é ver a vontade do pessoal de sempre querer participar dos eventos. Isso me traz lembranças de 2019, que acho que foi o melhor ano da minha vida. Foi quando eu entrei na USP e pude vivenciar as festas”, aponta Caíque ao JC. Ele também explica que sempre pensa em novos formatos para trazer a melhor experiência aos ingressantes, como, por exemplo, o uso de apresentações em slides sobre como é uma festa universitária presencial.

Thaís Borges é estudante da Faculdade de Saúde Pública (FSP) e ingressou no curso de Nutrição em 2021. Ela está participando de festas e gosta: “Meu ano de vestibular foi muito difícil por ser somado ao isolamento, então essas integrações, mesmo de longe, estão me fazendo muito bem”. Ela diz que, como entrou recentemente na faculdade, aproveita as experiências virtuais de forma mais intensa, uma vez que ainda não viveu isso presencialmente.

Contudo, há uma dificuldade pontuada por Mariana Guelfi, da Ecatlética. Ela explica que é mais difícil fazer uma comunicação online para levar a informação da festa aos calouros que em um evento físico. 

Na festa “Abril Pros Bixos”, por exemplo, mesmo com um bom engajamento dos calouros, Mariana diz que havia um impasse ao chamá-los para o evento: “A gente nunca viu esses calouros e só conversamos por WhatsApp. É muito difícil realmente convencer a pessoa a ir no ‘rolê’, se abrir e conversar”.

Uma forma de manter o contato vs O cansaço das telas

Para os veteranos, as festas online vêm sendo, desde o início da pandemia, um espaço para matar a saudade dos amigos e dos momentos presenciais. Lohana Thereza ingressou em 2018 no curso de Relações Públicas da ECA. Ela participou, durante boa parte de 2020, de confraternizações semanais da Comissão Organizadora do BIFE, um evento esportivo e festivo realizado por diversos institutos da USP.

Foram momentos de muita integração entre todos os participantes, por meio de reuniões virtuais e jogos online. Ela conta que surgiram três namoros entre pessoas que se conheceram melhor nessas festas, incluindo o atual relacionamento dela. 

Porém, depois que a quarentena perdurou por mais tempo do que muitos esperavam, “ocorreu o cansaço das telas. Chega uma hora que você enjoa de tudo e todos, que fica repetitivo e parece que só é a mesma festa todos os dias desde março, então esse ‘rolê’ foi sumindo e hoje nem acontece  mais”, pontua Lohana.

Uma das festas semanais que Lohana participava. Reprodução: Lohana Thereza

 

Para Mariana Guelfi, a integração promovida pelas festas online traz uma mistura de sentimentos. “Ao mesmo tempo que é legal manter contato com amigos e pessoas que a gente via todos os dias, é um momento meio nostálgico e frustrante por pensar ‘a gente poderia estar em uma festa presencial agora’”, afirma. 

Ela também passa atualmente pelo cansaço após tanto tempo de pandemia e, consequentemente, do uso de telas para as atividades diárias. Mas ela acredita que tentou ao máximo trazer diferentes modelos de eventos no ambiente virtual, e recebeu retornos positivos do público.

 Desde o início, o que a mantém motivada é a sensação de passar para as pessoas a experiência de uma atlética, de que “a sensação de estar numa graduação é muito maior do que só assistir aulas”. E, certamente, as festas universitárias, em qualquer formato, promovem a integração e confraternização para além das aulas.