Para psicóloga, vacinação não estimula sexo

Pais temem que discussão sobre sexualidade gerada pela vacina incentive o início prematuro da vida sexual de jovens
Campanha pode ampliar debate sobre sexualidade em escolas. Foto: Luiza Fernandes

A crença em um possível incentivo à iniciação sexual precoce das meninas pertencentes à faixa etária que será vacinada pelo governo é uma das razões pela qual grupos de pais ou responsáveis se recusam a levá-las a um posto de vacinação, ou permitir que a dose seja dada na escola. Alguns alegam que questões religiosas, como a obrigatoriedade da castidade, por exemplo, não são compatíveis com a necessidade de se vacinar contra um vírus sexualmente transmissível, que é associado, por esses grupos, a comportamentos promíscuos.
Algumas campanhas na internet ganharam evidência ao expor um lado negativo dessa iniciativa, além de trazerem diversos pontos de vista conflitantes, que vão desde a parte médica, enquanto uma eventual ineficácia da vacina e as reações adversas até a questão psicológica: a entrada da jovem em um debate prematuro a respeito de sua sexualidade e a descoberta do próprio corpo.

Sexo e adolescência

Para a psicóloga e professora do Instituto de Psicologia da USP, Miriam Debieux Rosa, a adolescência é um processo que corresponde à construção e à organização psíquica do jovem, que está em busca de uma particularidade que seja independente da sua família. “A adolescência é a transformação dessa criança em um adulto, é uma passagem em que o indivíduo tem que se realocar na sociedade, de maneira a se transformar em um cidadão responsável, que faça as suas próprias escolhas”, explica.
A questão inicia-se na puberdade, contudo, essa não é a única condição para que comece a se enxergar como um ser sexuado, até porque, como lembra a psicóloga, a adolescente pode possuir um corpo adulto e não ter amadurecido psicologicamente ainda. O jovem revisa a imagem que ele tem da família para poder construir um ponto de vista próprio sobre diversos fatores, além de outros pontos, como a religião e as próprias inibições. Não é uma questão de idade. “Isso não é um processo só interno, mas sim, é possível a partir de laços com os outros, como namorados, paqueras, e os familiares”.
Portanto, como aponta Miriam, o temor de que a vacina possa incentivar uma iniciação sexual precoce não tem sustentação, porque a questão da sexualidade está presente em todas as instâncias, desde na escola, nas mídias, propagandas, fato que demonstra que não se pode estar alheio a isso. Desse modo, a vacinação vai derivar uma grande responsabilidade, permitindo a abertura de um tema de conversa, de forma muito cuidadosa e importante com as meninas. “É preciso confiar que os seus filhos possam fazer escolhas, pensando sempre que as relações sexuais fazem parte do desenvolvimento de uma pessoa, de sua vida”.