USP aposta em atividades culturais e em aulas de idiomas para ampliar o contato com outros países sem envolver mobilidade acadêmica
Por Melannie Silva e Ricardo Thomé
O ensino superior brasileiro ainda engatinha em termos de internacionalização. De acordo com o MEC, os estrangeiros representam 0,2% do total de matriculados nas universidades, índice muito abaixo de países como o Reino Unido, onde estudantes de outras nações compõem algo em torno de 20% do alunado, conforme relatório da UUKi (Universities UK international). A USP é o principal destino de quem escolhe o Brasil: são 1.397 alunos de fora do país (2% do total) e 2.991 estudantes no exterior (5% do total), segundo a Aucani (Agência USP de Cooperação Acadêmica Nacional e Internacional). A Universidade tem 1.042 acordos vigentes com instituições estrangeiras.
A internacionalização é um dos lemas da universidade e tem sido uma das principais pautas da atual gestão. Mas como ela tem funcionado na prática?
A integração no campus
São três linhas principais: foco nos intercâmbios Sul-Sul; acolhimento aos estrangeiros por meio do programa iFriends e estratégias de internacionalização que não envolvam, necessariamente, a mobilidade acadêmica. A Aucani oferece atividades que vão desde cursos de idiomas, passando por programas de acolhimento até atividades culturais.
“No Centro Intercultural Internacional (CII) temos aulas de yoga, dança coreana, caligrafia israelita, rodas de conversa em inglês, abertas a toda a comunidade USP” explica Marly Babinski, professora do Instituto de Geociências e Diretora Adjunta da Área de Relações Acadêmicas Nacionais. “Temos a ideia de internacionalização como a experiência do intercâmbio, mas todas essas atividades são importantes para se aprofundar em outros idiomas e culturas”, complementa Paulo Braz, professor da Faculdade de Odontologia e Diretor Adjunto da Área de Mobilidade Acadêmica.
O que é o USP iFriends?
Outra iniciativa é o USP iFriends, programa voluntário criado pela Aucani em 2011 que tem como objetivo promover a integração entre os estudantes estrangeiros e os locais. A inscrição ocorre pelo sistema Júpiter e permite que os intercambistas e os uspianos acrescentem algumas características de sua personalidade, além de dados pessoais e disponibilidades de ajuda.
Para muitos, o iFriends foi essencial para o primeiro contato com a universidade. Denis Alfonte, estudante peruano de engenharia química, relata a importância do apoio: “Ano passado, estive na Colômbia, também fazendo intercâmbio, á não tem esse programa, nem o iPoli (Escritório Politécnico Internacional). O mais difícil de ir para um lugar novo é onde se vai passar os primeiros dias e ter segurança, então é muito importante ter uma conexão”.
Apesar de útil, o iFriends não resolve todos os problemas de quem vem para o Brasil pela primeira vez. “É difícil saber a distância, como buscar um quarto ou saber onde é seguro”, comenta Helen Gremlitza, que veio da Alemanha já sabendo falar o português e estuda ciências culturais e políticas. “Isso é algo que pode ser evitado facilmente através de uma rede de contatos que os intercambistas possam contactar”, sugere.
Nesse sentido, Denis aponta que o iPoli teve um impacto positivo na sua chegada. Ele não falava português e foi na organização que foi apresentado à cidade, à Universidade e a outros intercambistas, além de ter recebido auxílio para ir atrás de moradia. “As pessoas que me deram informações a respeito disso foram do iPoli, falando sobre segurança e localização nas proximidades da USP”.
Helen relata a importância da experiência na USP em termos de imersão acadêmica e cultural, destacando o quão significativo foi, para ela, poder aprender sobre “temas que o Norte Global ainda não tratou ou não entendeu” e que, por muitas vezes, o diálogo [entre brasileiros e estrangeiros] falha por conta disso.
Cooperação sul-sul
A “Cooperação Sul-Sul” é uma ideia de cooperação mútua iniciada após a guerra fria que ajudaria os países latino-americanos, africanos e asiáticos a superarem o estágio de “subdesenvolvimento” tecnológico. Dentro da universidade, isso consiste em priorizar o intercâmbio de ideias e de pessoas entre os países do chamado “Sul Global”.
Uma das formas de incentivo tem sido a oferta de editais de bolsa exclusivos para esses destinos. O Professor Braz reforça que as boas posições da USP nos rankings internacionais têm aumentado o interesse desses países em fechar convênios. Denis confirma esta realidade e diz que sua motivação para vir era entenderpor que a USP estava no topo do ranking: “Terminei entendendo o porquê. O Brasil está muito acima [do Peru e da Colômbia], especialmente na área de pesquisa dentro da universidade, tem muito apoio”.
A maior parte dos intercambistas que vem até a USP vem de países sul americanos, mas o inverso ainda não é uma realidade. “Temos que deslocar o sol da Europa. Tanto por uma questão geográfica, nós temos problemas parecidos e podemos achar soluções parecidas, mas também pelo financeiro. O valor da bolsa que cobre apenas parte dos gastos de um intercâmbio para Europa, custeia a vivência em um país latino”, explica Braz.